Você já ouviu falar do ácido úrico? Todo organismo produz essa substância. Apesar de fazer parte do corpo humano, uma concentração alta pode trazer sérias consequências. Muitas pessoas pensam que as consequências de níveis altos de ácido úrico no sangue se restringem a descamações na pele e na planta dos pés. Isso é apenas uma crença popular. Na verdade, quando não tratadas adequadamente, altas taxas desse ácido podem gerar doenças como gota e, até mesmo, cálculos renais.
O composto se acumula nas articulações em forma de cristais e gera dores excruciantes, em geral acompanhadas de inchaço e vermelhidão. São crises que vêm e voltam por anos a fio. Só que não é só desse jeito, tão escancarado, que as taxas elevadas de ácido úrico no sangue destrambelham a saúde. A ciência hoje sabe que essa situação pode lesar a parede dos vasos sanguíneos, incentivar um processo inflamatório crônico e prejudicar outros órgãos. Estudos apontam, inclusive, uma relação com maior risco de morte por panes cardíacas e vasculares.
O pé atrás com a repercussão mais sistêmica da substância não é de hoje. “Normalmente, temos muito cuidado ao atribuir um papel causal a um elemento numa doença. O colesterol é uma exceção, e das mais conhecidas, mas o ácido úrico tem sido investigado há anos e seus efeitos ainda são negligenciados”, contextualiza a bioquímica Flávia Carla Meotti, professora da Universidade de São Paulo (USP), que estuda o composto em seu laboratório.
Além dos problemas mais sintomáticos nas juntas e nos rins, a condição pode machucar os vasos sanguíneos — algo bem mais silencioso. “O ácido úrico em excesso lesa o endotélio, a membrana que reveste o interior das artérias, desencadeando uma inflamação e facilitando o surgimento de placas nas artérias e a hipertensão”, detalha o cardiologista Renato Alves, diretor da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp).
Causa ou consequência?
Há um tempo que o ácido úrico não é ligado apenas à gota. É ponto pacífico que níveis elevados estão associados a maior risco cardiovascular. “O paciente hipertenso, por exemplo, em geral lida com a questão do excesso de peso e já pode ter sua função renal afetada. Tudo isso leva a pessoa não só a eliminar menos ácido úrico como a produzir mais”, explica o cardiologista Luiz Bortolotto, diretor da Unidade de Hipertensão do Instituto do Coração (InCor), em São Paulo. O perigo é subestimar o composto nesse enredo. Uma revisão de estudos publicada em 2019 concluiu que, mesmo separando outras variáveis e fatores de risco, o ácido úrico alto sozinho estaria associado a uma maior mortalidade por doenças cardiovasculares.
Como controlar o ácido úrico
De qualquer forma, um bom conselho é ficar de olho no ácido úrico, sem se esquecer da conjuntura toda, e, se for o caso, partir para estratégias capazes de baixá-lo. Isso começa por mudanças na alimentação e no estilo de vida e pode ser reforçado com medicamentos específicos prescritos pelo médico. Controlar o ácido úrico, deixando-o em níveis mais baixos do que é considerado adequado hoje em dia, seria o caminho para escapar de uma miríade de doenças.