Em 2019, havia cerca de 275 milhões de mulheres com doenças cardiovasculares (DCVs) no mundo. Naquele ano, 47% das mortes por DCVs foram causadas pela doença isquêmica do coração, enquanto 36% foram atribuídas a derrames. E, embora a prevalência de DCVs em mulheres esteja diminuindo a nível global (4,3% desde 1990), alguns dos países mais populosos têm registrado um aumento. Esse é o caso da China (10%), da Indonésia (7%) e da Índia (3%).
As doenças cardiovasculares também carregam o título de principal causa da mortalidade feminina no mundo, sendo responsáveis por 35% dos óbitos a cada ano. Mesmo assim, elas permanecem subestudadas, sub-reconhecidas, subdiagnosticadas e subtratadas, como afirma a professora Roxana Mehran, do Centro Médico de Monte Sinai, nos Estados Unidos.
Mehran faz parte de uma equipe de 17 especialistas de 11 países que desenvolveu o primeiro relatório global sobre DCVs em mulheres. “Melhorias permanentes no atendimento às mulheres exigem esforços coordenados e parcerias envolvendo formuladores de políticas, médicos, pesquisadores e a sociedade como um todo”, diz a pesquisadora.
Publicado na revista científica The Lancet neste domingo (16), o documento apresenta uma série de recomendações para conter a incidência desse tipo de doença, lembrando que tais esforços contemplam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU — entre os quais está a meta de reduzir em um terço as mortes prematuras por doenças não transmissíveis até 2030.
As pesquisadoras destacam que um ponto a ser trabalhado são os fatores de risco. Para além da hipertensão, do alto índice de massa corporal e alto colesterol LDL, é importante reconhecer outros elementos que afetam as mulheres. A menopausa prematura e distúrbios relacionados à gravidez, por exemplo, precisam ser priorizados na elaboração de estratégias de tratamento e prevenção.
O estudo mostra também que as mulheres são mais propensas do que os homens a sofrerem com disparidades de saúde devido a fatores culturais, políticos e socioeconômicos. Assim, o desemprego e outros aspectos sociais, principalmente aqueles ligados a ansiedade e depressão, devem ser levados em consideração.
“Algumas normas sociais ou religiosas, como restrições à participação em atividades esportivas e físicas, podem contribuir para doenças cardiovasculares em mulheres, o que destaca a necessidade urgente de iniciativas culturalmente adequadas a diferentes regiões e populações”, observa Bairey Merz, do Centro Médico Cedars-Sinai.
Por isso, entre as recomendações que constam no documento estão a atenção à saúde mental das pacientes, o apoio às populações de baixa renda em países desenvolvidos e emergentes e a adaptação de abordagens conforme as características de cada comunidade.
As especialistas destacam ainda a importância de monitorar grupos que não são considerados de alto risco, como mulheres mais jovens — entre as quais as taxas de ataque cardíaco e tabagismo estão crescendo.
“O nosso relatório é tanto um ponto de partida quanto um apelo à ação para mobilizar profissionais de saúde, legisladores e as próprias mulheres para trabalhar em direção a um futuro mais saudável”, afirma Liesl Zuhlke, da Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul.