O calendário brasileiro celebra hoje o nascimento de um dos seus filhos mais ilustres, um cristão autêntico, que levou a vida dedicada aos direitos e ao bem-estar dos mais pobres e teve uma atuação política guerreira durante o período militar que governou o Brasil de 1964 a 1985, defendendo presos políticos, lutando pelos estudantes e contrapondo-se à violência que se estabeleceu à época.
Trata-se de Dom Hélder Câmara, arcebispo de Recife e Olinda. Nasceu em 07 de fevereiro de 1909, em Fortaleza, no Ceará, há exatos 110 anos.
Ainda jovem, aos 14 anos, entrou no Seminário da Prainha de São José, em Fortaleza, para cursar filosofia e teologia.
Sua notória batalha em favor dos pobres, sempre denunciando injustiças e criticando a ganância e insensibilidade de setores mais ricos indiferentes às tragédias populares, levou muitas vezes Dom Hélder a ser apontado como “comunista” por autoridades e conservadores. Daí, ter-se celebrizado um de seus mais conhecidos desabafos:
“Se der pão aos pobres, todos me chama de santo. Se mostrar porque os pobres não têm pão, me chamam de comunista e subversivo.”
Para Dom Hélder, “o verdadeiro cristianismo rejeita a ideia de que uns nascem pobres e outros ricos, e que os pobres devem atribuir a sua pobreza à vontade de Deus. Isso não é certo. É preciso entender que a fome dos outros condena a civilização dos que não têm fome.”
Com 22 anos de idade, Dom Hélder se ordena sacerdote. Na sequência, passou a exercer o cargo de diretor do Departamento de Educação do Estado do Ceará. Realizou a função por 5 anos, até ser transferido para o Rio de Janeiro.
Foi no Rio de Janeiro que desenvolveu algumas de suas principais obras sociais. Fundou a Cruzada São Sebastião, que era destinada a atender favelados, e também o Banco da Providência, que ajudava famílias pobres. Dom Hélder colaborou com revistas católicas, além de exercer funções na Secretaria de Educação do Rio de Janeiro e no Conselho Nacional de Educação.
Recebeu um convite para ser assessor do arcebispo do Rio de Janeiro em 1946. Foi o responsável pela fundação do Conselho Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que o elegeu Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro.
Em 1964, pouco antes do golpe militar, Dom Hélder foi nomeado arcebispo de Olinda e Recife. Após escrever um manifesto de apoio à ação católica operária em Recife, foi acusado de demagogia e comunismo, sendo proibido de se manifestar publicamente.
Ficou conhecido por ter se tornado um líder contra o autoritarismo e os abusos aos direitos humanos, frequentemente praticados pelos militares. Além disso, atuou em movimentos estudantis, operários, ligas comunitárias contra a fome e a miséria. Foi um defensor da justiça e da cidadania.
Mas a repressão estava cada vez mais dura. O assessor de Dom Hélder, o padre Antônio Henrique, foi preso, torturado e morto. Além disso, outros vinte colaboradores de sua arquidiocese são presos e torturados. Em 1970, fez um pronunciamento em Paris, denunciando a prática de tortura a presos políticos no Brasil, aproveitando-se da importância crescente que passava a ter. Dois anos depois, foi indicado para o Prêmio Nobel da Paz. O governo militar não perdoa: divulga um dossiê acusando, mais uma vez, Dom Hélder de ser comunista.
A partir de 1978, com uma lenta e gradual abertura política, Dom Hélder se dedica mais ainda a aplicar a sua teologia da libertação.
Aposentou-se em 1985, deixando mais de 500 comunidades eclesiais de base organizadas, com operários, trabalhadores rurais e retirantes em busca de melhores condições de trabalho e de vida.
Sempre atuante, Dom Hélder participou da campanha pelas "Diretas Já". E realizou debates e palestras de conscientização para a cidadania em todo o país. Além disso, deixou registrado o seu pensamento em diversos livros, que foram traduzidos para diferentes línguas.
Dom Hélder faleceu em 1999, vítima de uma parada cardíaca.