Faz hoje 50 anos da criação, em 10 de Novembro de 1971, do grupo musical “Secos & Molhados”, a irreverente banda brasileira da década de 1970, que lançou ao Brasil o talentoso vocalista e dançarino Ney Matogrosso. A formação clássica consistia de João Ricardo (vocais, violão e harmônica), Ney Matogrosso (vocais) e Gérson Conrad (vocais e violão).
João havia criado o nome da banda sozinho em 1970 até juntar-se com as diferentes formações nos anos seguintes e prosseguir igualmente sozinho com o álbum Memória Velha (2000).
No começo, as apresentações ousadas, acrescidas de um figurino e uma maquiagem extravagantes, fizeram a banda ganhar imensa notoriedade e reconhecimento, sobretudo por canções como "O Vira", "Sangue Latino", "Assim Assado", "Rosa de Hiroshima", que misturam danças e canções do folclore português como o “vira “, com críticas à Ditadura Militar e investia na poesia de Cassiano Ricardo, Vinicius de Moraes, Oswald de Andrade, Fernando Pessoa, e João Apolinário, pai de João Ricardo, com um rock pesado inédito no país, o que a fez se tornar um dos maiores fenômenos musicais do Brasil da época e um dos mais aclamados pela crítica nos dias de hoje.
Seu álbum de estréia, Secos e Molhados I (1973), foi possível graças às tais performances que despertaram interesse nas gravadoras, e projetou o grupo no cenário nacional, vendendo mais de um milhão de cópias no país. Desentendimentos financeiros fizeram essa formação se desintegrar em 1974, ano do Secos & Molhados II, embora João Ricardo tenha prosseguido com a marca em Secos & Molhados III (1978), Secos e Molhados IV (1980), A Volta do Gato Preto (1988), Teatro? (1999) e Memória Velha (2000), enquanto Gérson continuou a tocar sozinho. Do grupo, Ney Matogrosso é o mais bem-sucedido em sua carreira solo, e continua ativo desde Água do Céu - Pássaro (1975).
Os Secos & Molhados estão inscritos em uma categoria privilegiada entre as bandas e músicos que levaram o Brasil da bossa nova à Tropicália e então para o rock brasileiro, um estilo que só floresceu expressivamente nos anos 80. Seus dois álbuns de estréia incorporaram elementos novos à MPB, que vai desde a poesia e o glam rock ao rock progressivo, servindo como fundamental referência para uma geração de bandas underground que não aceitavam a MPB como expressão. O grupo continua a ganhar atenção das novas gerações: em 2007, a Rolling Stone Brasil posicionou o primeiro LP em quinto lugar na sua lista dos 100 maiores discos da música brasileira e em 2008 a Los 250: Essential Albums of All Time Latin Alternative - Rock Iberoamericano o colocou na 97ª posição.
Nos últimos anos a incrível banda iniciou um processo natural de decadência. Por mais que João Ricardo tenha levado adiante o grupo em muitas tantas tentativas, a magia nunca mais se impôs como nestes dois primeiros álbuns. Ney Matogrosso inicia, então, carreira solo de êxito que dura até hoje. Gerson Conrad vive vida pacata de arquiteto e gravou coisas boas sem sucesso comercial. João Ricardo mantém a mágoa dos parceiros e não fala com ambos desde então, recusando-se a qualquer espécie de diálogo ou reaproximação.
Em 2019, o jornalista Miguel de Almeida lança Primavera nos Dentes – A História dos Secos & Molhados (Editora Três Estrelas). Sobre o fim do grupo, esta biografia dá voz às duas versões, na qual Gerson e Ney mantém a história do “roubo” e João diz que tudo não passou de um “mal-entendido”. O diretor Otávio Juliano lançou o documentário Secos & Molhados (2021) no qual apresenta a voz e a versão de João Ricardo sobre a história toda. Também este ano, saiu Ney Matogrosso – a Biografia, por Julio Maria (Companhia das Letras).
Há ainda dezenas de documentários em programas de tevê e internet contando a incrível história deste fenômeno.