José Osmando

Coluna do jornalista José Osmando - Brasil em Pauta

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Não basta só um dia para refletir sobre a exploração e o desprezo aos negros

Pela primeira vez na história esse Dia da Consciência Negra é feriado, nacionalmente, em todos os Estados

Pela primeira vez na história esse Dia da Consciência Negra é reservado, nacionalmente, em todos os Estados, como lembrança e como ponto de reflexão sobre os negros nos cenários históricos de nossa fundação como Nação, e sobre a realidade a que esses povos afro-decendentes são tratados no dia a dia da nossa vida cotidiana. 

Foi graças à visão do Presidente Lula que o Brasil adotou, pela Lei 14.759/23, sancionada no ano passado, essa data - antes lembrada em alguns Estados -, agora como sendo feriado nacional.  

É evidente  que não basta apenas um dia, por maior significado que contenha, para passarmos a limpo toda a sujeira, toda a desgraça, descaso e desumanidade que o Brasil oficial praticou contra as populações negras, tornadas escravas, submetidas a trabalho forçado e não remunerado, durante mais  de 380 anos, sob os auspícios dos mandatários portugueses, com a finalidade de edificar um capitalismo excludente, volumoso nas mãos de uns poucos que se apoderaram das terras e fizeram, a custa de muito sangue, suro e lágrimas, essa tão decantada  'riqueza' nacional. 

Mas parar um dia para levar cada um a um exercício honesto de reflexão, na esperança de que se possa um dia tomar consciência dessa vergonhosa história que ainda não acabou, parece, de algum modo,  ser um alento. 

É impossível tocarmos a vida de mandeira tranquila, sossegada e não envergonhada, enquanto não reconhecermos que o domínio escravista em nosso país, que durou 388 anos, modelou uma economia injusta e cruel, que resulta numa desigualdade brutal está marcada, como DNA,  na vida dos negros, mesmo que já sejam decorridos 136 anos da proclamada "libertação dos escravos", fato que se deu em 13 de maio de 1888.

Os fatos de hoje demonstram que esse reconhecimento, essa conscientização e a necessária mudança de atitude em relação aos negros, não parecem ser tarefa fácil de acolhimento. 

Uma pesquisa de opinião pública realizada pelo instituto Datafolha, publicada hoje, mostra que 45% dos brasileiros dizem que  o racismo contra negros aumentou nos últimos anos, superando os 35% que tinham essa visão em pesquisas anteriores. 

A pesquisa questiona qual o tamanho da população que discrimina negros pela cor da pele e revela que 59% do universo nacional  é racista. Essa percepção de que a discriminação racial aumentou nos últimos anos é uma sinalização de que os negros continuam sendo considerados raça inferior, e esconde qualquer possibilidade de reconhecimento às injustiças que sofreram no passado e permanecem  sofrendo no presente.

Isso é deplorável, seriamente preocupante, pois abandonar-se a busca da verdade no  enfrentamento a narrativas precoceitusosas, é um notório entrave à derrubada de uma história de dominação e exclusão. Quando não se quer enxergar a centralidade da escravidão na formação econômica, política e cultural do Brasil, perpetuam-se as desigualdades  fortalecem-se e se naturalizam, de maneira avalisada pela própria população, as práticas perversas dos exploradores.

Um mínimo esforço de lógica poderia nos fazer entender que esse espírito escravista- que no passado, durante séculos,  utilizou-se do trabalho escravo, forçado e não recumerado, para a extração de outro e pedras preciosas, plantio e corte da cana-de-açúcar, criação de gado, plantação e colheita do café, fazendo a riqueza de algumas centenas de privilegiados-, hoje se faz presente no modelo econômico atual e persistente, concentrador de fortunas, que se manifesta diariamente por meio da simbólica Faria Lima, o marco da dinheirama que manda no Banco Central e que impõe à  e aos empresários honestos taxas de juros absurdas que inviabilizam negócios e impedem empregos e renda para o trabalhadore o direito às famílias de consumo digno. 

O simbolismo desse Dia Nacional da Consciência Negra impõe que busquemos, como sociedade, uma mínimo de decência e dignidade na tarefa de reconhecer um passado vergonhoso, desaprovar um modelo econômico presente, injusto, perverso e excludente, sacudindo essa "amnésia" institucional que se arrasta ao longo dos tempos. É o mínimo que se deve fazer em memória de Zumbi dos Palmares e Dandara, símbolos maiores de heróica resistência.

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