Concluído o segundo turno das eleições municipais brasileiras, aparecem três certezas. A primeira, é a de que a direita orgânica, pragmática, teve mais poder de convencimento do que a esquerda e o extremismo de direita, daí ter levado vantagem no volume de prefeitos eleitos, fortalecendo o poder do centrão e realçando de modo expressivo a figura de Gilberto Kassab.
A segunda comprovação é a de que Bolsonaro e seu estilo de fazer política sofreram contundente desaprovação popular, pois na quase totalidade das cidades em que botou a cara, seus candidatos perderam a eleição. Basta ver Fortaleza, Belo Horizonte, Niterói, Santos, Belém, Goiânia (onde o governador Caiado, seu ex-aliado, saiu fortalecido), João Pessoa, Palmas e Manaus. Perdeu em 8 das 11 cidades onde fez campanha, o que é muito para quem deixou a Presidência há pouco e tenta reverter a sua inelegibilidade.
A terceira conclusão é a de que esta foi a eleição em que ocorreu um maior derrame de dinheiro público da história, despejado pelo Congresso Nacional através das suas emendas parlamentares, notadamente as emendas PIX, uma imoralidade que deu sustentação a uma taxa escandalosa de reeleição de 93,7% entre os 112 municípios que mais receberam essas emendas durante a campanha.
Foram mais de R$ 7 bilhões jogados nas eleições, sem qualquer transparência, na maioria dos casos ignorando-se o destinatário e o parlamentar que ordenou a transferência, e sem nenhuma indicação acerca do projeto a ser beneficiado. Conclusão: uma eleição com visíveis sinais de que foi comprada com nosso dinheiro.
Ressalte-se aqui, o inegável pragmatismo de Kassab, que se coloca na cena política brasileira como um eficiente negociador, sempre fugindo de confrontos, não sendo adepto de baixarias e linguagem chula como alguns pretensos líderes do Centrão têm feito questão de exercitar.
Representando um Estado de enorme peso econômico e político, ele termina a eleição maior do que o próprio Tarcísio de Freitas, o governador, que na reta final do certame decidiu rasgar a máscara de pacificador, de moderado, de certinho, ao protagonizar uma episódio desprezível, como foi a irresponsável inverdade por ele plantada na TV, ao vivo, de que o PCC recomendara votos em Boulos, o candidato adversário do prefeito Ricardo Nunes.
Tarcísio, que a mídia tradicional brasileira vendia como um moderado de direita, na intenção de diferenciá-lo do extremismo de Bolsonaro e seus adeptos, saiu muito menor nesse final de segundo turno, ao praticar um ato irresponsável, leviano e mentiroso, pois não há um só indicativo, em nenhum aparelho de segurança e inteligência policial que aponte qualquer ligação de Guilherme Boulos com alguma facção criminosa. Mas Tarcísio, com as urnas abertas, em pleno exercício do voto pela população, fez questão de espalhar essa mentira, no intuito de prejudicar o candidato do PSOL e ajudar, criminosamente, o seu candidato.
A segunda lição que vem desse segundo turno, é a de que o eleitor despachou os extremistas e reprovou a atuação do ex-presidente da República e seus familiares que, abandonando o pleito em São Paulo, onde o ator político principal, mesmo com a baixaria de ontem, foi Tarcísio, e não ele.
Bolsonaro, filhos e esposa mergulharam de cabeça em eleições de outas capitais e cidades, como Goiânia, Fortaleza, Manaus, Niterói, Santos, Palmas, Belo Horizonte e João Pessoa, até mesmo confrontando aliados (como é o caso de Caiado, em Goiânia) e literalmente quebraram a cara, pois bolsonaristas ferrenhos, extremistas de direita, que disputavam a eleição e contavam com seu empenho pessoal, foram derrotados.
O resultado desse segundo turno não é de uma derrota desprezível. As urnas mostram que foi um revés contundente. Das nove capitais em que disputou segundo turno, perdeu em 7, elegendo apenas Abílio Brunini, em Cuiabá, sustentado pelo agronegócio, e em Aracaju, onde se elegeu a evangélica radical Emília Correa.
Se esses resultados fortalecem TarcíSio de Freitas e dão grande liderança a Kassab, trazem a Bolsonaro uma desagradável notícia. Agora, com sua notável perda de liderança, será para ele muito mais difícil a tentativa de reverter, dentro do Congresso, a sua inelegibilidade, atualmente sua única aposta para manter-se vivo para 2026.