Por Sávia Barreto
Primeiro a vida humana, depois a economia. Esse foi o tom do governador do Piauí, Wellington Dias (PT), em resposta à recomendação do presidente Jair Bolsonaro, em pronunciamento feito em cadeia nacional na noite de terça-feira, 24, de afrouxar a quarentena em todo o país. “Sei que as pessoas nesse momento terão prejuízos de bem materiais, nos negócios, na renda, mas tem algo em primeiro lugar agora, é a vida humana”, respondeu Wellington Dias. Com falas em referência à família e à religiosidade, o governador manteve a postura serena que consagrou sua carreira política sem, contudo, deixar de ser firme na decisão de manter os decretos que determinam fechamento do comércio, fábricas e escolas – exceto serviços essenciais, cancelamento de eventos e recomendação à população de distanciamento social enquanto a Saúde Pública é reforçada no combate ao coronavírus..
Em vídeo lançado nas redes sociais, o governador fala diretamente ao presidente Jair Bolsonaro, que durante pronunciamento em cadeia nacional voltou a se referir ao coronavírus como "gripezinha", afirmou que o isolamento é exagero, criticou os gestores que optaram por fechar escolas e colocou a culpa na imprensa pelo que chamou de histeria.
ESTRATÉGIA DE EXEMPLIFICAR COM A PRÓPRIA FAMÍLIA
Como todo mundo tem família, Dias utilizou a estratégia discursiva de colocar-se como exemplo para justificar por que o piauiense não deveria ceder à indicação de Bolsonaro para afrouxar as regras da quarentena no Piauí. Dessa forma, o governador oferece ao eleitor mais resistente os argumentos pessoais que faltavam para que mantenha-se em casa, independente de apoiar ou não Bolsonaro.
CITOU OS NETOS PARA FALAR DAS CRIANÇAS COMO GRUPO VULNERÁVEL
“Assisti ao pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro. Presidente, esses dias eu tive a felicidade, juntamente com a Rejane (Dias, deputada e primeira-dama), de receber dois netos, um casal de gêmeos, Arthur e Ester, e eu não colocaria uma pessoa com essa gripezinha que o senhor fala para cuidar dos meus dois netos, pelo menos conscientemente. Eu recomendaria que essa pessoa ficasse no isolamento social, recomendado pela Ciência”, disse Wellington.
Ou seja, o governador abordou um dos grupos vulneráveis, as crianças, para mostrar que qualquer um que tenha filhos, netos ou sobrinhos em casa estará colocando a vida deles em risco se não seguir o que a classe médica gabaritada no mundo todo tem indicado enquanto não há vacina ou cura ao vírus: isolamento e permanência em casa.
“HISTÓRICO DE ATLETA” NÃO É GARANTIA
Bolsonaro também disse no pronunciamento que por ter "histórico de atleta", "nada sentiria" se contraísse o novo coronavírus ou teria uma “gripezinha ou resfriadinho”. Wellington rebateu o argumento, mais uma vez utilizando a própria história pessoal como exemplo. Médicos afirmam que é impossível prever como seria o quadro de uma infecção em qualquer pessoa, ainda mais uma nova, como a Covid-19, independente do histórico de atividades físicas praticadas anteriormente. A doença também assemelha-se mais a uma pneumonia forte do que a uma gripe nos casos mais graves.
“Da mesma forma eu não faria isso com meus filhos a Daniele, a Iasmin, o Jairo, o Vinícius – que são atletas – aliás, eu e minha esposa também praticamos esportes, mas não gostaria de ser contagiado com o coronavírus. Eu não sei como meu organismo reagiria, eu vejo o que acontece com pessoas de outros países, no meu estado, pessoas que ficam três, quatro semanas em uma UTI”, ponderou Wellington Dias. Mais um argumento que Wellington oferece ao piauiense: mesmo que você pratique esportes, seu organismo pode reagir de modo adverso a um vírus que tem causado estragos em pessoas plenamente saudáveis.
ELOGIO A MANDETTA
Wellington Dias também deixou claro a aprovação pelas ações do ministro da Saúde, Henrique Mandetta. O ministro recomenda cumprimento do distanciamento social nesse momento de curva ascendente dos casos notificados de contaminados pelo vírus no país. Ele tem sido elogiado por governadores e políticos, mas sofrido pressões internas por discordar do discurso padrão no Palácio do Planalto.
“Tive que tomar medidas duras, seguindo orientação do ministro Mandetta, do seu governo, para garantir vagas na UTI para quem precisar. Senhor presidente, não se faz isso por causa de uma gripezinha. Eu seria egoísta se pensasse só na minha família, eu quero pensar no outro, nas 3 milhões e 200 mil pessoas que represento no estado do Piauí”, destacou o governador.
FÉ EM DEUS, FÉ NA CIÊNCIA
“Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, a frase emblemática de campanha de Bolsonaro demonstra a união entre fé pessoal e política no núcleo bolsonarista. No entanto, Wellington, que é religioso e cuja esposa é evangélica, traz o raciocínio de que a fé em Deus não é empecilho nenhum para acreditar e cumprir o que os cientistas apontam como o mais correto para preservar a Saúde.Ele diz que é pela "graça de Deus" que a Ciência conhece mais sobre o coronavírus e, por isso mesmo, deve-se obedecer ao que os cientistas indicam.
“Quero acreditar em Deus, sei que é pela graça de Deus que temos uma situação que a Ciência conhece sobre o coronavírus e quero seguir a Ciência e cumprir todo o regramento. Sei que as pessoas nesse momento terão prejuízos de bem materiais, nos negócios, na renda, mas tem algo em primeiro lugar agora, é a vida humana. No Piauí, a vida humana tem valor e vamos fazer isolamento social onde for necessário. Vamos seguir com a Ciência, com Deus no coração e vamos vencer o coronavírus”, finalizou Wellington.