Cientistas encontram anticorpo que bloqueia o novo coronavírus

A equipe ressalta que muito trabalho ainda é necessário para avaliar se esse anticorpo pode proteger ou reduzir a gravidade da Covid-19 em humanos.

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Pesquisadores da Universidade de Utrecht, do Erasmus Medical Center e do Harbor BioMed identificaram um anticorpo totalmente humano que impede o novo coronavírus Sars-CoV-2 de infectar células em culturas cultivadas. A descoberta foi publicada na Nature Communications nesta segunda-feira (4) e pode ajudar no desenvolvimento de tratamentos para a Covid-19.

Segundo os pesquisadores, o estudo focou em anticorpos conhecidos por combaterem o Sars-CoV, causador da Sars, que surgiu na China em 2002. Eles identificaram que um desses anticorpos também é capaz de neutralizar a infecção por Sars-CoV-2, causador da Covid-19, em culturas celulares.

"Esse anticorpo neutralizante tem potencial para alterar o curso da infecção no hospedeiro infectado, apoiar a eliminação do vírus ou proteger um indivíduo não infectado que é exposto ao vírus", afirmou Berend-Jan Bosch, líder da pesquisa, em comunicado.

Bosch observou que o anticorpo se liga a uma propriedade existente tanto no Sars-CoV quanto no Sars-CoV-2, o que explica sua capacidade de neutralizar os dois microrganismos. "Esse recurso de neutralização cruzada do anticorpo é muito interessante e sugere que ele pode ter potencial na mitigação de doenças causadas por coronavírus — potencialmente emergentes no futuro", disse Bosch.

A equipe ressalta que muito trabalho ainda é necessário para avaliar se esse anticorpo pode proteger ou reduzir a gravidade da Covid-19 em humanos. Ainda assim, os pesquisadores esperam desenvolver o anticorpo e, se possível, viabilizar um tratamento para a infecção causada pelo novo coronavírus. "Acreditamos que nossa tecnologia pode contribuir para atender a essa necessidade de saúde pública mais urgente e estamos buscando várias outras vias de pesquisa", comentou Jingsong Wang, um dos especialistas.

Anticorpos não é imunidade

A maioria das pessoas que não trabalha com biologia tem uma visão bastante simplificada de como funciona a resposta imune do corpo humano, da qual os anticorpos fazem parte. No cenário atual, essa compreensão parcial pode gerar tanto preocupação excessiva quanto esperança falsa. Então, vamos olhar a questão mais de perto. Quando o corpo é invadido por um vírus, temos três tipos de resposta: inata, adaptativa celular e adaptativa de anticorpos. Com informações do O Globo


A resposta inata é a primeira. São células mais genéricas, que vão tentar eliminar o corpo estranho, meio de qualquer jeito. A resposta adaptativa é mais específica, e pode ser celular ou de anticorpos. Os anticorpos, quando tudo corre bem, neutralizam o vírus, além de soar um alerta. Mas, quando o vírus já está dentro da célula, os anticorpos não o percebem. Dentro da célula, os vírus fabricam cópias de si mesmos.

Com a resposta imune celular, a célula contaminada avisa o resto do organismo do problema: denuncia a si mesma, e é eliminada.

Anticorpos são moléculas que se ligam a proteínas que o vírus exibe em seu invólucro. Chamamos de neutralizantes aqueles que, ao fazer isso, dificultam ou impedem a reprodução viral. Mas nem todos são assim: pode haver anticorpos não neutralizantes, que se encaixam no vírus, mas não conseguem detê-lo (e, às vezes, até o ajudam).

No caso do Sars-CoV-2, ainda não temos uma ideia clara da ação dos anticorpos. Recentemente, um estudo na revista “Nature Medicine” indicou que 100% dos pacientes avaliados produziram anticorpos contra a Covid-19. Muita gente comemorou o resultado, e interpretou isso como sinal de imunidade. É até bastante provável — e desejável — que seja isso mesmo. Mas o fato é que ainda não sabemos se todos esses anticorpos serão úteis, e quanto tempo duram.

Levando em conta que o Sars-CoV-2 é bem parecido com o vírus da Sars de 2002, podemos esperar que, contra ele, também produziremos um anticorpo neutralizante que impede que o vírus entre na célula. O anticorpo também chama células do sistema imune que vão ajudar no combate.

Em geral, exames de sangue medem dois tipos de anticorpo, IgM e IgG. Estudos em Sars relacionaram produção precoce de anticorpos à severidade da doença. Ter anticorpos não basta. Precisamos saber se são protetores, e quanto tempo duram. Também precisamos descobrir a relação entre tipos e quantidades, e como se relacionam à gravidade da doença: é possível que anticorpos em excesso, ou na hora errada, piorem o quadro. Tendo essa compreensão, poderemos desenvolver anticorpos monoclonais, que serão neutralizantes e clones, ou seja, todos iguais. Há grupos trabalhando nessa estratégia.

Também sempre testamos se os anticorpos gerados na vacinação são neutralizantes. Às vezes, não são. Uma vacina para Sars falhou em produzir anticorpos neutralizantes em animais idosos.

O sistema imune humano é feito de erros e acidentes selecionados pela natureza. No geral, anticorpos salvam vidas, mas nem sempre: não são “projetados” para isso ou aquilo. A cada nova doença, precisamos da ciência para entender o que, exatamente, andam aprontando.

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