Alexandre, o Grande, se tornou rei da Macedônia quando tinha apenas 20 anos. E em pouco mais de uma década, derrotou os persas e construiu um império que se estendia da Grécia até a Índia. Ele era tão poderoso e carismático que chegou a ser considerado um semideus. E sua misteriosa morte em plena juventude, há mais de 2,3 mil anos, ainda desperta debates científicos apaixonados.
A causa da morte do grande conquistador, que foi discípulo de Aristóteles, morto aos 32 anos em circunstâncias que ainda são motivo de especulação, geram teorias recentes que ele teria sido vítima de envenenamento ou até mesmo de malária.
Mas a cientista Katherine Hall, da Nova Zelândia, afirma ter encontrado a resposta, que poderia explicar a tese de por que o corpo do rei só teria começado a se decompor seis dias após a sua morte.
Malária ou envenenamento?
Alexandre, o Grande, morreu no dia 10 ou 13 de junho (não há consenso sobre a data precisa) do ano 323 a.C., quando estava no palácio de Nabucodonosor II, na Babilônia. Um mês antes de completar 33 anos. O que se sabe é que Alexandre participou de um banquete no dia 3 de junho e, segundo relatos da época, morreu 10 dias depois.
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O historiador britânico Andrew Chugg apresentou em 2005 a tese de que Alexandre havia morrido de malária. Segundo ele, o rei tinha navegado duas semanas antes de morrer por águas pantanosas nos arredores da Babilônia, onde poderia ter sido infectado.
Chugg se baseou nas Efemérides, diário atribuído a Diogneto de Eritreia, que acompanhou o governante em suas conquistas para mapear os novos territórios. Outra hipótese debatida é a do toxicologista neozelandês Leo Schep.
Em 2014, Schep publicou um estudo na revista científica Clinical Toxicology, afirmando que Alexandre tinha sido envenenado com a planta Veratrum album, também conhecida como heléboro branco.
Os gregos usavam a planta para induzir o vômito, mas em doses mais altas ela pode causar envenenamento, com sintomas que incluem dor e fraqueza muscular severa.
Paralisia progressiva
Mas Katherine Hall, professora da Faculdade de Medicina na Universidade de Otago, na Nova Zelândia, não concorda com as teorias de que Alexandre foi vítima de malária, tampouco de envenenamento. "Em particular, em referência ao estudo de Schep, o longo período em que (Alexandre) ficou doente até morrer não parece se encaixar com um possível envenenamento", disse Hall à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC.
"Em geral, os envenenamentos na Antiguidade eram rápidos, com substâncias altamente letais que agiam rapidamente. Do contrário, a vítima poderia sobreviver tempo suficiente para acusar o autor (do envenenamento). Para Hall, os sintomas sugerem que Alexandre foi vítima da síndrome de Guillain-Barré, doença autoimune que ataca parte do sistema nervoso.
Segundo ela, o conquistador provavelmente desenvolveu a síndrome após contrair uma infecção por Campylobacter, bactéria que pode ser encontrada "na carne de frango mal cozida ou no leite não pasteurizado".
A cientista neozelandesa afirma que Alexandre sofreu de um subtipo da síndrome de Guillain-Barré conhecido como neuropatia axonal motora aguda, que provoca paralisia.
"A síndrome de Gullain-Barré é uma reação autoimune na qual o próprio sistema imunológico do paciente fica confuso devido a um organismo infeccioso e começa a atacar os nervos", explica Hall à BBC News Mundo.
"Alexandre sofreu uma paralisia ascendente, dos dedos dos pés para cima, mas manteve a mente lúcida, dando ordens a seus generais até o fim."
"É uma combinação incomum de sintomas e, de acordo com minha experiência em cuidados intensivos com casos semelhantes, a melhor explicação é a síndrome de Guillain-Barré", acrescenta.
'Falso diagnóstico da morte'
E como explicar os relatos de que o corpo do governante só começou a se decompor seis dias após sua morte?
"Esse fato demonstrava, de acordo com os gregos antigos, que Alexandre era um deus, mas este artigo oferece uma resposta real e confiável", declara Hall, fazendo referência ao seu estudo publicado na revista científica The Ancient History Bulletin.
"Na Grécia Antiga, não se compreendia bem o significado do pulso e se determinava que uma pessoa estava morta pela falta de respiração e possivelmente por seus olhos."
Como a paralisia causada pela síndrome é progressiva, Alexandre poder ter chegado a um estado em que sua respiração era tão superficial que não era aparente a olho nu, esclarece Hall.
"Uma quantidade muito pequena de oxigênio é absorvida pelo corpo sem necessidade de respirar, devido à diferença na concentração de oxigênio nos pulmões e no sangue", completa.
"Normalmente, isso não é suficiente para manter alguém vivo, mas Alexandre precisava de cada vez menos oxigênio devido à ausência de movimentos e digestão."
Em outras palavras, o corpo do governante com suas pupilas fixas não se decompôs durante seis dias simplesmente porque, de acordo com Hall, ele ainda não estava morto.
"Eu queria estimular um novo debate e possivelmente reescrever os livros de história, sustentando que a morte de Alexandre ocorreu, na verdade, seis dias depois do que se pensava", diz a médica.
"O falecimento dele pode ser o caso mais famoso de pseudo thanatos (falso diagnóstico de morte) já registrado", acrescenta.
Outros mistérios
"O diagnóstico de Guillain-Barré como causa da morte explica muitos elementos díspares de maneira coerente", diz Hall. Mas a pesquisadora sabe que o artigo dela não vai encerrar o debate sobre a morte do antigo rei da Macedônia. "Toda teoria sobre a morte de Alexandre tem seus defensores e opositores."
"E não duvido que o mesmo aconteça com a minha. Essa é a natureza da pesquisa científica, mas todo comentário deve ser baseado em pesquisas e argumentos fundamentados", completa.
Há ainda outros enigmas que rondam sua morte. Quais foram suas últimas palavras? Quando os generais perguntaram ao rei em seu leito de morte para quem ele queria deixar seu império, alguns afirmaram que ele disse "Krat'eroi", que significa "o mais forte". Outros defendem que ele quis dizer, na verdade, "a Crátero", um dos comandantes de seu exército.
Onde estão seus restos mortais? O corpo de Alexandre ficou por séculos em um túmulo em Alexandria, no Egito, mas desapareceu.
Chugg acredita que é possível que o corpo mumificado tenha sido colocado no lugar do de São Marcos para impedir sua destruição durante uma insurreição cristã. Se for verdade, o venerado túmulo de São Marcos em Veneza, na Itália, poderia conter os restos mortais de Alexandre, o Grande - e não do evangelista.
O fato é que o antigo rei da Macedônia continua a despertar fascínio e admiração. Seja qual for a hipótese escolhida, o que muitos compartilham é o enorme desejo de compreender mais profundamente sua trajetória.