Viúva e mãe de dois filhos, uma professora de escola particular de classe média, localizada na Zona Leste de São Paulo, tenta obter na Justiça indenização contra três estudantes que, em 2005, criaram uma comunidade no Orkut para hostilizá-la. Os adolescentes foram obrigados pela Justiça a cumprir medidas socioeducativas, e seus pais foram condenados em primeira instância a pagar indenização de R$ 10 mil, mas recorreram. O Tribunal de Justiça ainda não se manifestou. Sobre a indenização pesam correção monetária e juros de até 1% ao mês.
"Eu sou uma professora chata, um pouco rígida, e não admitia o uso de MP3. Um dos autores da comunidade me desafiava, havia uma desavença", diz a professora. Ela conta que a comunidade intitulada "eu odeio a professora..." fazia um trocadilho com seu nome, transformando-o em um adjetivo negativo. Mensagens eróticas e termos chulos enviadas por alunos atrelavam o rigor da profissional em sala de aula à sua condição de viúva, "sem marido".
"Foi terrível. Estudantes e professores de outros colégios vizinhos ficaram sabendo. Eu passava na rua e diziam: "é aquela", "é aquela", afirmou. A chateação também alcançou a filha da professora, que estudava no mesmo colégio e foi alvo de brincadeiras e ameaças.
A professora conta que foi avisada por uma aluna que o nome dela havia sido colocado em uma comunidade na internet. A filha dela, também adolescente, fez uma pesquisa e descobriu a comunidade. Ela imprimiu as páginas e avisou a direção da escola que imediatamente chamou todos para uma reunião e pediu explicações e desculpas. Na mesma tarde, a comunidade foi tirada do ar.
Desculpas
Segundo a professora, 16 estudantes que apareceram como membros da comunidade pediram desculpas e três deles mantiveram a postura anterior. "Quando foram convocados, esses três deram risada e disseram que o assunto ocorreu fora da escola e deveria ser resolvido fora da escola. Diante disso, a própria escola me orientou a processá-los. Fiz um boletim de ocorrência e entrei com a ação. Quando foram intimados, os alunos pediram desculpas e mandaram cartas", diz a professora.
De acordo com o advogado da vítima, José Borges de Morais Júnior, uma tentativa de conciliação terminou frustrada. O advogado pediu o pagamento de indenização de R$ 6 mil, mas os pais dos alunos fizeram uma contraproposta de R$ 1 mil. Como a conciliação não prosperou, a Justiça deu a sentença de R$ 10 mil. Para a professora, os valores envolvidos são o que menos importa. "Como ocorre com a maioria dos brasileiros,a pessoa só se incomoda quando dói no bolso. O interesse maior é que eles sintam que eles têm direitos, mas também têm deveres. Tem de existir respeito com o outro" afirmou.
A professora manteve o emprego. Um dos estudantes formou-se no mesmo ano e outros dois pediram transferência. Segundo a professora, duas mães dos processados mantiveram silêncio, mas uma terceira chegou a dizer que ela, professora, estava agindo com exagero. Educadora há 25 anos, ela afirma que fenômenos como esse ocorrem porque a família está transferindo a responsabilidade de educar para a escola. "Os pais têm medo de educar e perder o filho. Existe muita liberdade e pouca responsabilidade", afirmou.
O advogado dos três adolescentes, Zacarias Romeu de Lima, disse ao G1 que a defesa mantém a argumentação de que a criação da comunidade pelos alunos foi uma reação à atitude da professora em sala de aula. "A ação dela desencadeou uma reação dos alunos", afirmou. Ainda de acordo com ele, os adolescentes se arrependeram e cumpriram medidas sócioeducativas.
"Foram atitudes impensadas, de alguém que está em fase de formação, tanto que houve arrependimento deles. O importante é que se arrependeram e cumpriram a medida indicada pelo juiz da Vara da Infância e da Juventude. Eles nunca imaginavam que poderia chegar a essa fase", afirmou.