Enrico Soffi, 45 anos, deixou a Itália em abril do ano passado e veio ao Brasil focado em construir imóveis de até R$ 270 mil, voltados para a classe média. Investiu R$ 1 milhão em 2010 e prevê ampliar em pelo menos 50% os aportes este ano. ?Queremos aproveitar a falta de habitação que têm as classe C e B, que estão crescendo e não têm a capacidade de comprar uma casa de R$ 600 mil?, diz Soffi, que vê um momento de expansão ?extraordinária? no país.
O caso de Enrico não é isolado: de acordo com dados do Banco Central, mais de US$ 15 bilhões de dinheiro estrangeiro entraram na economia do país só em dezembro, por meio de investimento direto na produção. No ano, o montante chegou a US$ 48,4 bilhões, maior valor desde 1947, em meio a um cenário em que a economia no Brasil está aquecida e que países ricos da Europa lutam para superar as sequelas deixadas pela crise financeira internacional.
Para não se perder em um mercado que difere em idioma, sistema tributário e preferências culturais, Enrico buscou a ajuda de uma consultoria especializada e se saiu bem. Desfecho diferente do que teve a empresária também italiana Sônia Ferrari, que demorou mais de um ano para conseguir tirar um visto permanente para atuar no Brasil como investidora: enfrentou muita fila e burocracia até entender o que estava errado com a sua documentação.
"Demorei um tempo pra entender que estive com problema, nada se faz sem experiência. Vi que estava mal assessorada e por isso depois fui procurar e testar mais escritorios", diz ela que, depois que conseguiu a assessoria correta, obteve o visto em menos de dois meses. Mesmo assim, acredita que o potencial de ganhos no Brasil compensa os obstáculos.
"Com certeza vale a pena. Para qualquer empresa de grande porte seria um erro fatal não conquistar o seu espaco aqui hoje, e preparar o seu futuro para tempos ainda melhores daqueles que já estamos vivendo aqui no Brasil", analisa. "Sei de muitas empresas americanas e europeias que já estavam aqui antes da crise e que os lucros daqui ajudaram seus balanços de forma sensível", diz.
Hoje, ela abriu uma empresa para orientar estrangeiros na mesma situação de "desamparo" inicial. Mais que isso: representa marcas europeias que precisam de contato, distribuição, compradores e parceiros para entrar com suas operações no Brasil. O foco principal são as marcas de sapatos, bolsas e acessórios, em projetos que somarão mais de R$ 15 milhões só no ano da implementação.
"É preciso entender a cultura do país e as suas peculiaridades, fazendo isso com profissionais e assessores de comprovada experiência. Uma empresa que queira entrar no país e não ter problemas não pode subestimar esse aspecto", ensina Sônia.
Na consultoria KPMG, a demanda de estrangeiros por informação sobre o Brasil cresceu tanto que a empresa criou uma unidade específica para esse tipo de atendimento. A KPMG Global Business, criada em novembro, tem o objetivo de dar ao estrangeiro um "intensivão" sobre o país.
"Pegamos representantes de diversos setores para dar um "banho" de Brasil no investidor; organizamos estrategicamente atendimentos que já aconteciam de forma separada. A gente acha que isso é o que o governo o deveria fazer também: centralizar as informações para recepcionar esse público", diz Marienne Coutinho, uma das líderes do projeto.
Augusto Salles, outro sócio líder do Global Business, diz que a procura estrangeira aumentou de duas consultas por semana para duas por dia. Origens variadas ? EUA, Inglaterra, China, Índia e Japão aparecem entre os interessados - e dúvidas de todo tipo. Desde chineses projetando investimentos de bilhões, até empresas americanas que cobiçam o mercado de caixas d"água no Brasil. "Tem diferentes níveis de conhecimento. Uns já conhecem as peculiaridades, o tamanho, a economia emergente. Outros têm uma visão ingênua, tipo: "eu tenho uma caixa d"água matadora que se chegar no Brasil vai arrasar. Vocês usam caixa d"água no Brasil"?", conta Salles.
Grande parte do interesse desse dinheiro internacional pelo país vem do grande potencial de crescimento do consumo brasileiro. Levantamento feito pela consultoria KPMG com investidores potenciais de diversos países do mundo aponta que, dos 500 entevistados, 66% afirmaram que pensam em investir no Brasil para aumentar a base de consumidores por meio dos mercados locais e regionais.
Além disso, 41% já investem no Brasil e pretendem expandir suas operações; outros 10% também já são investidores, mas não têm planos de expansão. Questionados sobre qual é o atual ou pretendido modelo de negócios da sua empresa para o Brasil, 53% responderam investimento estrangeiro direto.
Jenesi Figueiredo também orienta estangeiros na FK Consultoria e diz que uma das razões para tanta atratividade brasileira é a situação ruim da Europa, abatida pela crise.
"Estamos mais bonitinhos porque eles estão feios, então parece que nós somos a virgem linda. Eu acho que o Brasil está normal", avalia. Em seu escritório, que teve expansão de 20% no movimento no ano passado, atende-se em italiano, inglês, sueco e até árabe.
"A imigração tem regras, e tem gente que não acredita nisso até ser deportado. Já temos muitos italianos, espanhóis e alemães vindo em função das Olimpíadas e da Copa do Mundo", diz.
O engenheiro francês Vincent Lefeuvre, 40 anos, comemora o fato de ter se interessado em investir no Brasil desde antes de 2002, ano em que se casou com uma carioca e mudou-se definitivamente para cá.
"Cheguei antes da crise na Europa, mas foi durante a crise que eu percebi que eu tive razão de investir no Brasil. Agora eu tenho na frente dos outros uma vantagem de cinco anos. E isso vale ouro no mundo dos negócios", diz o dono da Tecohnopolis Consulting, especializada em estruturar e implementar fábricas e parcerias entre empresas estrangeiras e brasileiras no setor industrial. A previsão é de que em 2011 a empresa invista entre R$ 200 mil e R$ 400 mil em escritórios e contratação de pessoal qualificado na area da gestão de projetos e contratos.
Na opinião do francês, o caminho para evitar problemas por falta de informação é mesmo buscar ajuda privada. "É mais uma pista de obstáculos permanentes. Os problemas não impedem a empresa de funcionar, mas tem um custo de tempo e de energia muito alto", diz ele, que garante já estar habituado à lentidão do processo . "A burocracia é terrível. Mas não é pior que na França".