O município do Rio de Janeiro foi processado por centenas de famílias que estão sendo expulsas de suas casas devido às obras da via expressa Transoeste, construída para a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016, informou a Defensoria Pública do Estado.
Moradores das comunidades de Restinga, Vila Harmonia e Vila Recreio II, na zona oeste da cidade, acusam a prefeitura de oferecer indenizações irrisórias por suas casas e de serem pressionados a aceitar, como alternativa, financiamentos para a compra de apartamentos pequenos, longe dos locais em que hoje vivem e trabalham, indicou a defensoria.
De acordo com o órgão, há relatos de moradores que viajavam ou saíam para trabalhar e, quando voltavam, encontravam suas casas demolidas, com a mobília dentro. Outros reclamaram de estar sendo pressionados diariamente por funcionários da prefeitura a deixar o local. Todas as acusações foram negadas pela subprefeitura Barra e Jacarepaguá, responsável pelos despejos.
Parte do projeto de preparação viária do Rio de Janeiro para os eventos esportivos dos próximos anos, a Transoeste será uma via expressa de 56 km, com investimento de R$ 800 milhões, que ligará três bairros da zona oeste da cidade: Barra da Tijuca, Campo Grande e Santa Cruz, segundo a Secretaria Municipal de Obras.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) solicitou ao Brasil no início de março informações sobre os despejos. A solicitação atende ao pedido de medida cautelar encaminhada pelas comunidades à CIDH em fevereiro.
José Jorge Santos de Oliveira, 51 anos, jardineiro, é um dos moradores que se recusa a abandonar a Vila Recreio II, onde mora há 16 anos. Segundo ele, sua casa está avaliada em pelo menos R$ 50 mil, mas a prefeitura só oferece indenização de R$ 8,7 mil ou mudança para o apartamento do programa federal "Minha Casa, Minha Vida" no bairro de Cosmos, longe de sua residência atual.
"Eles propõem que eu dê minha casa de presente para a prefeitura em troca de assinar um financiamento de outro apartamento menor e mais longe. Vou gastar no mínimo R$ 260 por mês com condomínio e parcelas, e se optar pela indenização, os R$ 8,7 mil não são suficientes para comprar outra casa", afirmou o morador.
Das três liminares obtidas no início do ano pelas comunidades para embargar a obra, apenas uma está em vigor: a que se refere à Vila Recreio II, enquanto as demais - referentes a Restinga e Vila Harmonia - já foram derrubadas pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a pedido da Procuradoria do município. Desta forma, apenas a Vila Recreio II, que abriga 140 famílias, está com as obras embargadas, aponta a defensoria.
O embargo exige que a prefeitura apresente o projeto viário da obra e justifique a necessidade de remoção, "apresentando alternativas de realocação que atendam os interesses da comunidade", segundo a ação judicial.
No entanto, de acordo com a Secretaria municipal de Habitação, das 629 famílias de nove comunidades que serão afetadas pelo projeto, 129 já assinaram contratos de financiamento para a compra de apartamentos, e outras 203 receberam indenizações médias de R$ 24 mil.
O órgão defende o valor pago em indenizações, salientando que a avaliação do imóvel leva em conta as benfeitorias feitas pelos moradores. Porém, para a defensoria, as famílias também têm direito constitucional à posse do terreno, pois algumas delas estão no local há mais de 40 anos.
Para a relatora da ONU para o direito à moradia adequada, Raquel Rolink, uma série de intervenções urbanas vem ocorrendo no Rio de Janeiro sem obedecer à legislação, sob o argumento de que precisam ser concluídas rapidamente para os eventos esportivos.
"Está sendo criado um estado de exceção. (As obras) não estão obedecendo os processos naturais de planejamento urbano, o que torna as comunidades atingidas muito vulneráveis", declarou.