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Sexo: Mulheres vivem regime ditatorial

O médico Gerson Lopes afirma que as mulheres vivem “um regime ditatorial” com relação ao sexo e desempenho na cama

A mulher contemporânea usufrui de sua liberdade sexual, aproveita o direito ao prazer e conhece melhor o próprio corpo. Com a queda de barreiras morais e o advento da pílula anticoncepcional, o sexo erótico ganhou força na vida delas, a ponto de incitar uma busca incessante pelo orgasmo, que agora tem que ser "múltiplo".

O novo momento é marcado por uma grande cobrança pelo gozo e performance na cama, segundo o ginecologista Gerson Lopes, presidente da Comissão Nacional de Sexologia da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Com isso, a satisfação sexual estaria mais associada ao resultado do que com a entrega, e assim o "fim da festa" ganha mais atenção que a experiência completa.

Delas: Explique melhor o conceito da ?orgasmocracia? que vivemos. E como isso afeta a relação da mulher com o sexo?

Gerson Lopes: É como se fosse um regime ditatorial em relação ao orgasmo. O direito ao gozo não pode ser substituído pela obrigação de tê-lo. Presa nessa ditadura, a mulher não se solta no processo do brincar e o foco está no resultado (orgasmo) e não no durante. Presa ao "fim" ela não curte adequadamente o "meio", comprometendo o envolvimento afetivo e sexual com o parceiro.

Claro que toda relação tem que ser prazerosa, mas não obrigatoriamente orgástica. Existem outros prazeres como olhar, ouvir, tocar, relaxar... Toda mulher deve sim tentar ter orgasmo, mas a satisfação sexual e a felicidade não têm necessariamente a ver com o orgasmo. A pressão de ter o orgasmo dificulta ainda mais a experiência orgástica.

Gerson Lopes, ginecologista: "Na clínica chegam mulheres que têm orgasmo, mas não sabem. Isso acontece porque elas possuem expectativas irreais"

Delas: E quem alimenta a ideia que toda mulher deve atingir o prazer máximo para ter uma vida sexual feliz?

Gerson Lopes: Talvez sejam expressões sutis de um viés machista em nossa sociedade. Porém, dizem que machismo é uma doença igual a hemofilia ? existe em homem, mas quem transmite é a mulher.

O mundo moderno é um mundo de resultados e a visão do orgasmo pelas mulheres é o reflexo disso.

Delas: Elas se cobram, mas os homens também se preocupam muito com o orgasmo das parceiras?

Gerson Lopes: Erroneamente muitos homens se responsabilizam pelo orgasmo da mulher. A pergunta cretina ?você chegou?? não traduz uma preocupação com ela e sim uma forma de autoavaliação. Ela chegando, significa para ele que desempenhou bem seu papel. Diante disso, o caminho para muitas mulheres é fingir o orgasmo para agradá-lo. Mas ninguém dá orgasmo a ninguém, ele simplesmente acontece. O homem pode apenas facilitar ou dificultar.

Delas: A importância do orgasmo e o assunto em geral também são compartilhados em conversas de amigas. As mulheres mostram uma competitividade entre elas em relação a sua vida sexual?

Gerson Lopes: Infelizmente as mulheres estão tão competitivas em relação ao sexo como os homens e também acabam mentindo tanto quanto eles. Sexualidade não é qualidade de pessoas e sim de envolvimento entre pessoas.

Delas: É possível que, em função de uma grande expectativa em relação ao sexo, algumas mulheres acham que não têm prazer e na realidade têm orgasmos perfeitamente normais?

Gerson Lopes: Na minha clínica chegam mulheres que têm orgasmo, mas não sabem. Isso acontece porque elas possuem expectativas irreais em relação a este fenômeno. A literatura diz que aproximadamente 20% das mulheres têm orgasmos e não sabem.

Delas: O caminho para uma vida sexual satisfatória está mais no conhecimento do próprio corpo que na cobrança por mais prazer? E será que as mulheres se conhecem o suficiente para isso?

Gerson Lopes: Sem dúvida conhecer possibilita mais prazer enquanto a cobrança de desempenho mais desprazer. Eu diria que as mulheres ainda não se conhecem bem. Conhecem muito bem seu corpo estético e higiênico, mas pouco o corpo erótico. E investir no seu erotismo é responsabilidade dela e não do parceiro.