O fim da primeira temporada do futebol brasileiro em 2020 permite um “review”. A amostragem ainda é pequena, mas contém boas pistas do futuro, e o blog tratará de cada um dos quatro principais clubes paulistas, a começar pelo Palmeiras, dono da melhor campanha entre os grandes – 19 pontos, com uma vitória a menos que o Santo André.
Vanderlei Luxemburgo brada com frequência que o futebol não mudou. Seu time é a criatura provando o contrário ao criador. O “pofexô” sempre baseou seus trabalhos no agrupamento de jogadores de boa técnica no meio-campo, com liberdade ao mais criativo deles para, perto dos atacantes, dar assistências, fazer gols, brilhar intensamente. Informações do site GloboEsportes.com
Podemos lembrar, em suas construções mais bem-sucedidas, de Zinho, Rivaldo, Djalminha, Ricardinho, Marcelinho Carioca, Alex, e por aí vai. De características diferentes, aqueles de ritmo menos intenso sempre sofreram duras críticas. Zinho foi comparado a uma enceradeira e Alex ganhou apelido de um remédio que age com efeitos calmantes.
A evolução essencial do jogo, ponto de partida para as consequências, é impulsionada pelo avanço da preparação física que permite aos jogadores correrem mais, ocuparem espaços mais rapidamente e, assim, reduzir o tempo de ação de quem tem a bola e obrigá-los a encontrar soluções diferentes para romper os bloqueios, criar espaços para atacar.
O talentoso Luxa, obviamente, não descobriu isso só agora. Se nos anos 90, era em que ele foi protagonista, os craques desequilibravam mesmo em intensidade menor, os novos tempos são mais exigentes.
O Palmeiras talvez tenha o elenco mais repleto de meias criativos entre os de alto nível no país. Começou o ano com Lucas Lima e Raphael Veiga titulares, mas Luxemburgo logo notou que Veiga não poderia flutuar de fora para dentro, função que parecia, há três anos, ter sido criada para Gustavo Scarpa, reduzido a mero coadjuvante ao longo do tempo.
Num movimento tradicional da carreira, o treinador tentou emplacar Zé Rafael como segundo volante, recuando um meia. Depois de 12 jogos, seu Palmeiras aparentemente ideal não tinha nenhum deles titular. Lucas Lima, Raphael Veiga, Scarpa e Zé Rafael, todos no banco ou fora até dele.
O futebol mudou a ponto de fazer Luxemburgo mudar. A chegada de Rony e a excelente fase de Willian – regularidade de quase uma década – acomodaram Dudu nessa função de meia centralizado. Causa estranheza, mas é boa ideia. Parece haver um decreto de que jogadores habilidosos precisam ficar presos aos lados do campo. Se Dudu encontrar, com tempo de adaptação e movimentação coletiva, espaços para abrir por dentro, com dribles e passes, poderá ampliar ainda mais sua influência já altíssima.
O repertório ele tem. Em 2020, Dudu é vice-líder de dribles no Paulistão, em média atrás só do venezuelano Soteldo, do Santos. O camisa 7 também é quem mais dá o último e o penúltimo passes em lances do Palmeiras que terminam em finalizações.
Os volantes prediletos são Bruno Henrique e Ramires, desde que estejam em boas condições físicas. Ambos de bom passe e naturalidade na infiltração, embora já abaixo do auge físico em que um dia estiveram. Depois deles, quatro atacantes que misturam profundidade, jogo apoiado e finalização: Dudu, Rony, Willian e Luiz Adriano.
Aos poucos, Luxemburgo foi abrindo mão da circulação de bola que ele sempre gostou porque os meias do século 21 ainda insistem em jogar como se estivessem no passado. Ignoram a inexistência de espaço e a necessidade de multiplicar o número de passes com movimentação contínua. Se você pensou em Paulo Henrique Ganso, símbolo maior da incompatibilidade entre o jogador da posição e o futebol evoluído, bingo.
É cedo para dizer que o Palmeiras encontrou uma solução, mas apesar do mercado mais modesto e do tardio acréscimo dos jovens das categorias de base, ninguém tem, no Paulistão, qualidade em tanta quantidade. O Verdão ainda é o time mais confiável para decidir jogos. E Luxa, mais cedo ou mais tarde, vai admitir que o futebol mudou e vai continuar mudando.