Dois trechos da ótima entrevista com o presidente do São Paulo Futebol Clube, Carlos Augusto Barros e Silva, o Leco, valem ser ressaltados.
Na conversa franca com os repórteres Adriano Maneo e Camila Mattoso, da Folha de S. Paulo, o presidente são-paulino escapa aos lugares comuns e às respostas feitas tão comuns ao meio esportivo.
O primeiro momento:
Te incomoda o 'bambi'? Me incomoda quando tem um efeito pejorativo, desrespeitoso. O Andrés [Sanchez] não pode me ver que ele me chama de 'bambi', num ar super brincalhão. Eu me dou super bem com ele. Quando tem essa coisa da gozação, da brincadeira, tudo bem.
E, agora, o segundo destaque:
Como é sua relação com as organizadas? Não tenho nenhuma intimidade [com as organizadas], mas também não tenho hostilidade. Não tem como não conviver com elas.
Você já as recebeu desde que assumiu o cargo? Querida, eu tenho mais de 30 anos de São Paulo. Eu sei como é torcida. A Independente, e a Dragões também. Eu tive duas ou três situações, que me fizeram ser respeitado por eles.
Há muitos e muitos anos, eles queriam matar um jogador que eles diziam que era gay, aquela coisa do machismo [em referência a Richarlyson]. Na torcida tem um monte de gays, como em todos os lugares. Eu era vice-presidente de futebol, e eles foram lá falar comigo. Estavam ameaçando invadir, recebi uns 12, das duas torcidas. Conversamos e foi tudo bem. Defendi o jogador.
Ele era correto, bom jogador, um profissional impecável. As coisas aqui fora, dele, eu não quero saber. Eu não tenho controle sobre isso. E eles ficaram impressionados pelo fato de terem sido recebidos.
Quando assumi [a presidência], ainda que temporariamente, no período de 13 a 27 de outubro, logo no primeiro sábado eles marcaram uma manifestação no CT. E todo mundo estava vendo uma ameaça, porque eles iam fazer e acontecer. E se eles querem eles fazem mesmo, a gente sabe como é.
Eu autorizei, e vocês sabem que não é fácil isso, porque tem resistências aqui dentro. Tem pessoas conservadoras, homofóbicas, preconceituosas. Eles foram e foi uma puta festa. E aí, dois torcedores falavam assim: 'Dr. Leco é mano, é na moral! Ele recebe a gente e conversa com a gente, ele nunca deixou de conversar com a gente'.
Como você viu aí nas linhas anteriores, o homem que comanda uma das maiores equipes do país parece não se importar - como deveria ser - com as tais "piadas" de mau gosto que ligam os tricolores aos gays, como se houvesse algum problema nisso.
Ele fala também de como foi difícil enfrentar a homofobia dos torcedores contra Richarlysson, ex-jogador com passagem vitoriosa na equipe tricolor. Um atleta sofreu ameaças por ser quem é.
A pergunta que fica é: quando é que os torcedores rivais vão entender que ser 'bambi' não é ofensa? E quando é que os são-paulinos vão fazer como o seu presidente e dar de ombros para uma provocação vazia e homofóbica?
Já é 2016.
E o futebol deveria ser bem maior que rixas bobas e vazias.
Que as pessoas "conservadoras, homofóbicas, preconceituosas", como diz o presidente são-paulino na entrevista, não usem o esporte como um artifício para destilar ódio.