Um ano depois do malfadado GP de Cingapura de 2008, Nelsinho Piquet falou pela primeira vez sobre os bastidores do acidente forçado por Flavio Briatore e Pat Symonds para beneficiar Fernando Alonso naquela corrida. Em entrevista a Reginaldo Leme no ?Fantástico? deste domingo, o ex-piloto da Renault diz que se arrepende muito de ter aceitado protagonizar a armação e teme que o incidente afete sua carreira na Fórmula 1 de forma decisiva.
- Fui o mais afetado nessa história. Na verdade, o maior punido fui eu. Tudo bem, o Flávio foi banido, o Pat teve uma punição de cinco anos... Minha carreira acabou, foi bastante prejudicada. Foi um grande erro. Eles me pegaram num momento fraco. Tinham pessoas na sala em que eu confiava. Foi uma coisa que eu errei. E que foi mais um motivo de eu apresentar para não acontecer com mais ninguém. E limpar essa história logo para isso não ficar guardado em mim para o resto da vida - diz Nelsinho.
Confira abaixo as declarações de Nelsinho Piquet na entrevista a Reginaldo Leme:
Recado para o Brasil
?Acho que magoei muita gente. Todo fã de automobilismo ficou chateado com essa história toda. Primeiro, tenho que agradecer a todo mundo que me apoiou nesse tempo difícil, que está apoiando até agora, quem acredita em mim. Quem não levou isso muito bem, peço desculpas. Sei que errei. Estou sendo castigado por tudo o que está acontecendo. E quero pedir que sempre acreditem em mim. Sempre venci em todas as categorias que passei, aqui e na Europa. Só que não acertei meu ponto na Fórmula 1 ainda. Preciso de uma equipe certa, um engenheiro certo e uma equipe certa. Uma equipe que acredite. Não sei qual vai dar certo. Sei que vou dar a volta por cima.?
Insinuações de Briatore sobre homossexualidade
?Foi baseado no desespero dele. É verdade que morei um ano e pouco com um amigo mais velho. Não achei casa em tempo suficiente porque viajo bastante. Botei minhas coisas tudo num galpão da empresa dele. Ele me acompanhou em várias corridas. Muita gente o conhece. Um amigo de família. O Flávio quis levar isso para outro lado, para tentar me ofender de alguma forma.?
Negociação em Cingapura
?Foi no próprio dia da corrida, no domingo mesmo, algumas horas antes da prova. Geralmente a gente chega à corrida com quatro ou cinco horas de antecedência. Eles (Flavio Briatore e Pat Symonds) me chamaram para conversar, não estavam muito confortáveis com a situação. Mas precisavam e queriam muito que isso (o acidente) acontecesse. O Flavio sabia que estava numa situação delicada. A gente tinha brigado o fim de semana inteiro por causa de um contrato que eu e meu pai não estávamos aceitando. Ele sabia que eu não estava nos meus melhores dias quanto ao emocional.?
Reação ao "pedido"
?Foi uma surpresa. Mas vindo de quem veio, dos dois caras mais altos (poderosos) da equipe, foi um pouco difícil de entender e pensar na hora. Estava um pouco abalado por causa do fim de semana complicado. O pedido veio do meu empresário e chefe da equipe e do engenheiro top. Não falta mais ninguém na equipe para pedir isso para mim.?
Abalo emocional no dia anterior
?Na noite anterior, fiquei bem mal no telefone. Falei até mais tarde com o Felipe (Vargas, engenheiro de confiança dos Piquet). A situação tinha ficado bem chata na equipe porque eu não tinha aceitado o contrato que o Flavio queria que eu assinasse. Então ele gritou, brigou. A coisa ficou bem feia e fiquei bem preocupado. Tive problemas com o carro na classificação. Estava bem abalado. Nas entrelinhas eles queriam dizer: "Faz isso pela equipe que a gente vai te ajudar?
A reunião antes da prova
?(A conversa) Foi tudo antes da prova. Coisa rápida. Vai ou não vai? Nem passou pela minha cabeça (ligar para Nelson Piquet, seu pai). Nunca tive uma reunião com os dois tão rápida. Eu queria de qualquer forma tentar melhorar minha situação na equipe. Não era só o chefe de equipe. Se eu tivesse meu manager (empresário) fora da sala me esperando, talvez eu pudesse pensar. Mas, meu empresário, o cara que normalmente era para estar querendo o meu melhor, estava ali junto, ouvindo tudo o que estava acontecendo. Sabia de tudo o que estava acontecendo. Não foi uma pergunta e tive que responder na hora. Foi uma conversa... Aos poucos eles foram dando ideias. Ajudaria a equipe, a sua situação.?
Não-punição pela FIA
?Fui o mais afetado nessa história. Na verdade, o maior punido fui eu. Tudo bem, o Flávio foi banido, o Pat teve uma punição de cinco anos... Minha carreira acabou, foi bastante prejudicada. Foi um grande erro. Eles me pegaram num momento fraco. Havia pessoas na sala em que eu confiava. Foi uma coisa que eu errei. E que foi mais um motivo de eu apresentar para não acontecer com mais ninguém. Tem muitas histórias que não devem ter saído. Sou um apaixonado pela Fórmula 1 como todos aqui somos. Eu queria mostrar que isso não pode acontecer. E limpar essa história logo para isso não ficar guardado em mim para o resto da vida.?
Como limpar a carreira?
?A primeira coisa é admitir o erro que fiz. Dizer todo mundo que está envolvido. Próximo passo é começar do zero e trabalhar três vezes mais do eu sempre fiz. Sei que vai ser difícil. Vou ter que me dedicar o máximo possível. Nunca desisti. Tenho um sonho que sempre vai ser um piloto de Fórmula 1. Agora é lutar. Tentar voltar. Provar tudo o que fiz na carreira inteira.?
Opções para um recomeço
?Meu sonho sempre foi a Fórmula 1 e vai continuar sendo. É lógico que se não acontecer isso... Nem pensei nisso. Na minha mente só tem a Fórmula 1. Estou longe de desistir disso. A temporada nem acabou. Estou esperando as equipes voltarem de Cingapura e do Japão para conversar. Não sei se vou estar em Interlagos. Tenho portas abertas ainda. Não precisa de pressa.?
Reação dos outros pilotos
?Muitos pilotos já erraram também. O Hamilton foi um exemplo disso, talvez não tão grave quanto eu. Não tem muito o que dizer. Se tem que aceitar ou não? Eles não são meus amigos. Não faz muita diferença o que eles pensam. Eles têm a opinião deles. Se houver crítica do Rubinho e do Felipe é um coisa. Dos outros pilotos é outra coisa. O que o Rubinho e o Felipe falarem, eu tenho que levar em consideração. É do coração, não da boca para fora. Minha preocupação é com os amigos e as equipes. Tenho que conseguir uma vaga para o ano que vem. Aconteceu, a gente aprendeu. Agora é olhar para frente e começar tudo de novo.?
Alonso sabia?
?Não sei. Não tinha nada a ver envolver ele nessa história. Ele também não queria se meter. Não é o meu problema. Muita gente fala que ele sabia, outros dizem que não.?
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Negociação da imunidade com a Fia
?Não negociei. Eles falaram: "Se você esclarecer essa história a gente vai te oferecer isso". Sem punições na FIA. Mas a punição que eu levei foi maior que a de qualquer um. Afetou a minha carreira inteira. O Pat e o Flávio já estão em fim de carreira, entre aspas. Os dois estiveram mais de 20 anos na Fórmula 1 e têm outros negócios. Para mim foi pior. Olha o que aconteceu e está acontecendo comigo.?
Está conseguindo dormir?
?Tenho, tenho (risos). Tenho que saber controlar, negociar isso dentro de mim bem. Olha, preocupa só o fato se eu vou conseguir uma vaga boa no ano que vem. Talvez eu continue. A vida continua. Se não conseguir nada aqui, talvez vá para outro lugar. Se eu conseguir, graças a Deus, vai ser muito bom. Não vou desistir tão cedo.?
Como provar que a ideia não partiu de você?
?Não tem muito o que falar. Como eu poderia criar uma história dessa? Não existe. Depois tentei imaginar uma história como se fosse eu... Não tem como eu criar uma história dessa. Não tinha cabeça nem para dizer não, quanto mais bolar uma história dessas.?
O local do acidente
?Tinha que ser naquela curva (a curva 17). Na volta de apresentação, eu rodei na curva da largada, que era outra.?
Briatore e a força do acidente
?Ele fez aquilo para fazer uma cena. Não sei se vocês viram, tem uma imagem que ele me agradece depois da corrida. Ele bate nas minhas costas e agradece.?
Contar para Nelson Piquet, seu pai
?Foi tão duro, que não fui nem eu que contei. Depois da corrida, eu percebi o erro que fiz. Sabia o quanto tinha sido errado. O Felipe (Vargas) falou: "Você vai ter que contar para o seu pai." Meu pai não queria me estressar mais ainda, por isso a gente nem voltou ao assunto. Todo mundo sabia que eu estava numa posição difícil. É para isso que serve a família, sempre apoiar numa decisão, mesmo errada.?
A continuação na Renault em 2009
?Achei que estava melhorando tanto no fim do ano, marcando pontos, conseguindo pódios e largando sempre perto do Alonso. Achei que ia continuar melhorando, mas eles cortaram as minhas asas totalmente no início do ano. Sem me dar treino, sem me dar pneu novo e sempre colocando para andar na chuva. Carro mudou muito e o pneu também. Se pudesse escolher de novo, teria ido para a STR.?
Negociações recentes na Fórmula 1
?No momento em que saí da Renault, falei com algumas equipes. Depois da confusão toda, todo mundo preferiu esperar a poeira baixar. Tenho que ver quem está aberto ainda. A melhor equipe talvez seja a STR, que não vai começar do zero. Tem cara de ter uma ambiente calmo para pilotos novos. Nas três ou quatro equipes novas, tem pagar para andar. Isso é a última coisa que quero fazer. Acho que não preciso.?
Possibilidade de ida para o automobilismo americano
?Tudo é uma opção. Tenho, além do sonho de vencer um campeonato de Fórmula 1, também vencer Le Mans, Daytona... Gosto de correr em tudo quanto é carro diferente. Mas não é uma coisa que fica na minha cabeça. Primeiro vou pensar na Fórmula 1.?
Teste na Nascar
?Vou lá só para conhecer. A equipe insistiu bastante, me convidou. Será só um teste normal, nada demais. Nem sei, nunca fui, não sei nem como é que é.?
Acredita que o torcedor vai te desculpar um dia?
?Espero que sim. É lógico que não vou pedir para todos os torcedores me desculparem. Tem os fanáticos por Fórmula 1 que vão ficar chateados por muito tempo. Não posso fazer nada agora, a m... já foi feita. Perdi meu lugar na Fórmula 1, muitas equipes não acharam legal o que aconteceu. Tem sido muito difícil. Fui mais punido até que os outros envolvidos nesse caso. Espero poder reverter essa história toda. E quero pedir desculpas mais uma vez a quem gosta de Fórmula 1 e acompanha automobilismo no Brasil.?
Rubinho ou Button?
?Isso não é uma pergunta. Está todo mundo torcendo pela mesma pessoa. Espero que o Rubinho ganhe. Está difícil, mas não é impossível. Todo mundo sabe o exemplo do Kimi dois anos atrás. Estou torcendo por ele. Ele tem ido bem nas últimas provas.?
Tramoia no título de 2007?
?Não. Eu lembro de ter visto reprises do ano e o Hamilton cometeu vários erros. Tiveram várias corridas em que ele errou. Ele não perdeu o campeonato só por uma corrida. Teve um erro na China e em Interlagos, em Magny-Cours, que ele cortou a chicane e foi punido. Acho que não. Ele teria sido campeão sem os erros.?