Enquanto as mulheres têm de enfrentar muitos desafios para entrar no mercado de trabalho e lidar com salários menores que o dos homens, elas ainda são vistas por muitos brasileiros como "menos aptas" a conquistar um cargo de liderança por engravidarem.
Três em cada 10 homens concordam que é justo ter menos mulheres à frente de empresas porque elas podem engravidar e sair de licença maternidade. Além disso, 2 em cada 10 homens do Brasil afirmam que é "constrangedor" uma mulher ganhar mais que um homem.
Foi o revelou a pesquisa Brasileiras - Como elas estão mudando o rumo do País, divulgada nesta sexta-feira (2) pelo instituto de pesquisa Locomotiva, liderado pelo pesquisador Renato Meirelles. O estudo, realizado em novembro com 1.024 mulheres e 858 homens de todo o Brasil, revela um panorama alarmante sobre o machismo no País e, consequentemente, no mercado de trabalho -- e como isto afeta a renda, o empoderamento e a independência das brasileiras.
Apesar das mulheres representarem um pouco mais da metade da população brasileira, elas ainda sofrem muito preconceito e são alvo de violência e assédio no trabalho. O estudo mostra que, enquanto 60% das brasileiras concordam que as mulheres deveriam ocupar ao menos metade dos cargos de chefia nas empresas, 30% dos homens concordam com a frase:
"É justo mulheres assumirem menos cargos de chefia que homens, já que podem engravidar e sair de licença-maternidade."
Além disso, 20% dos homens, ou cerca de 15,4 milhões de brasileiros, acham constrangedor uma mulher ganhar mais que o homem e concordam com a frase: "o marido sempre deve ganhar mais que a esposa."
Entre as mulheres, 72% acreditam que o homem "se sente inferior" quando a mulher é mais bem sucedida profissionalmente que ele.
Não só esta percepção impede mulheres de conquistar cargos de gestão. A jornada dobrada e mínima ajuda dos homens nos afazeres domésticos fazem com que mulheres dediquem menos horas e esforço no trabalho corporativo e até prefiram deixar o emprego.
Enquanto 21% dos homens acham difícil conciliar a vida profissional e pessoal, o percentual entre as mulheres sobe para 31%.
O estudo Síntese de Indicadores Sociais - Uma análise das condições de vida da população brasileira, divulgado hoje pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostra exatamente isto: as mulheres brasileiros trabalham, em média, cinco horas a mais que os homens (somando o trabalho em casa), mas recebem 24% menos que eles.
"Fica claro que o Brasil avançou. Somos menos desiguais. Por outro lado, a gente olha a realidade e ela está muito aquém do ideal", avalia Renato Meirelles, do Locomotiva.
"Vimos que a desigualdade de gêneros promove a exclusão da mulher no mercado de trabalho, traz prejuízos efetivos para a economia brasileira e, na prática, aumenta a rotatividade nas empresas."
Segundo o estudo do Locomotiva, se o salário das mulheres se equiparasse ao salário dos homens, a economia brasileira teria uma injeção de nada menos que R$ 461 bilhões.
O problema, avaliou Meirelles, está no machismo naturalizado. "O primeiro passo para o entendimento do homem é como privilegiado, ou seja, alguém que se beneficia da desigualdade."
A junção de tudo isso resulta na exclusão da mulher do mercado de trabalho formal. O Locomotiva revelou que 51% das mulheres entrevistadas querem mudar de emprego no ano que vem. Além disso, 24% das mulheres que trabalham já trocaram de emprego alguma vez na vida para ter mais tempo com a família, contra 17% dos homens.
Ainda, 17% das mulheres que não estão trabalhando apontam como principal motivo não ter com quem deixar os filhos. Entre os homens esse percentual é 0%.
"Quando nós perguntamos o que é homem de sucesso, ninguém tem dúvidas: é um homem que tem sucesso profissionalmente. Quando pergunta o que é uma mulher de sucesso, a resposta se dispersa -- é uma boa mãe, é uma mulher que está bonita, que se desenvolveu profissionalmente. Historicamente, se pensa que a mulher tem um papel que não é o papel do homem. Esse mesmo pensamento também explica o grande número de mulheres terem mudado de emprego ou ter deixado de trabalhar para cuidar dos filhos, coisa que não acontece com os homens."