A polêmica de Daniel Alves, ex-jogador da Seleção Brasileira de Futebol, em denúncia de estupro contra uma jovem em uma boate trouxe uma discussão importante. Até quando o testemunho da vítima vale para a legislação brasileira? Na Espanha, o atleta foi preso sumariamente a partir de discursos inconsistentes e evidências claras.
Para Eugênia Villa, delegada e estudiosa de gênero, o que é mais emblemático no caso é a força da palavra da vítima, que termina encorajando outras mulheres a denunciar e serem ouvidas. "A aplicação do protocolo de proteção às mulheres em situação de violência pela boate com agilidade possibilitou decisão fundamentada pela Justiça espanhola", aponta.
Experiências brasileiras
Eugênia defende que as experiências brasileiras demonstram que é preciso fortalecer protocolos de proteção às mulheres, sobretudo no âmbito da sociedade. "É preciso a adesão da comunidade na compreensão de que a violência contra a mulher é um problema político, que atinge todas nós. Portanto, a atuação dos profissionais da boate foi fundamental para responder a pretensão da ofendida", acrescenta.
No Brasil, as leis têm conotações coloniais patriarcais, ou seja, obrigam as mulheres a comprovarem a violação dos corpos através de um exame físico.
"Embora o bem jurídico penal tutelado seja considerado a 'liberdade sexual', a comprovação se dá no âmbito da violação de nosso corpo físico a partir de um laudo sexológico e não no da liberdade, que se vincula ao plano psicológico, da vontade ou não de se autodeterminar. Logo, é uma perversa tutela que se conecta à ideia de patriarcado jurídico", aponta a pesquisadora.
Muitas pessoas acreditam que o estupro está diretamente relacionado à penetração, a chamada "conjunção carnal". No entanto, qualquer violação à autodeterminação de se relacionar sexualmente, ou de trocar intimidades com alguém, é considerado como estupro.
Entenda o caso do jogador preso na Espanha
Daniel Alves, jogador de futebol brasileiro, de 39 anos, enfrenta a justiça da Espanha após ter sido acusado de estupro contra uma mulher em uma boata em Barcelona, em dezembro de 2022. O atleta e a vítima prestaram depoimentos e a polícia espanhola encontrou inconsistências na fala de Daniel. Desta forma, o jogador foi preso preventivamente no país europeu no dia 20 de janeiro.
Por outro lado, o depoimento da vítima é condizente com o que foi registrado através do circuito interno de câmeras do estabelecimento. Para a defesa, Daniel contratou o mesmo advogado que defendeu Messi em uma situação de fraude fiscal, além do Barcelona, o time, no caso Neymar.
Boate Sutton
O estupro, que ao que tudo indica aconteceu dentro da boate Sutton, partiu de um convite de Daniel Alves. A mulher, que estava acompanhada de duas amigas, se juntou à mesa do jogador na área VIP, onde ele teria passado do ponto nos flertes, ficando próximo e tocando-as.
No entanto, as agressões não teriam findado com os inúmeros "nãos" da jovem. Ela teria sido obrigada a tocar no pênis do jogador sob ameaça de uma suposta arma. Além disso, foi levada ao banheiro onde teria ficado 15 minutos com Daniel Alves, que teria obrigado a moça a praticar sexo oral.
Após a polêmica, Daniel Alves foi imediatamente demitido do Pumas, time mexicano onde estava contratado. Além disso, a vítima garantiu que não quer um centavo do jogador, mas sim que ele permaneça preso.
Contradições que levaram à prisão
O jogador de futebol Daniel Alves, em um primeiro momento, negou que teria tido qualquer relação com a moça. Depois, disse que havia sim se relacionado com a vítima, mas de forma consensual. Algo que não bate com o fato dela ter sido atendida pela equipe da boate após a situação.
Após acionarem a polícia, Daniel Alves já tinha ido embora. Toda a situação mostrada nas câmeras mostra que a denúncia da moça faria sentido, além das filmagens da abordagem policial em que ela aparece profundamente nervosa e em estado de choque. Além disso, um lado médico encontrou lesões que indicam a luta corporal.
Daniel Alves foi preso depois de se apresentar voluntariamente na Delegacia de Barcelona e prestar depoimento. Ele foi transferido na segunda-feira (23) para um novo presídio, onde ficam os presos preventivos do país. A expectativa é que ele possa ficar até dois anos em regime fechado.