Elas relatam casos que sugerem cinco tipos de machismos recorrentes dentro do ambiente profissional. Assediadas, preteridas em entrevistas de emprego e até mandadas embora, segundo elas, simplesmente por serem mulheres.
“Eu comecei a sair com um cara de um setor diferente do meu na empresa. Nos aproximamos na hora do café, no corredor, e resolvemos sair um dia. Depois de um tempo, provavelmente para aparecer, ele contou para os colegas que estava saindo comigo. Um dia, então, no sistema de interação dos funcionários – uma espécie de chat interno – um desses colegas me pediu um boquete. Eu não entendi aquilo e ele justificou: ‘Você chupa fulano, por que não me chupa também?
Eu ignorei, mas um tempo depois, nos viram conversando na saída do expediente e viramos fofoca da empresa. Espalharam que a gente se pegava dentro do trabalho. Essa história chegou no ouvido dos gestores e eu fui demitida. O guri não. Ele continuou lá, como se nada tivesse acontecido.” Estela, 26, analista de TI.
“O RH só perguntou da minha vida pessoal, nada da minha formação foi questionado”.
“Estava fazendo o processo seletivo para uma ONG, em São Paulo. Fui chamada para a entrevista com o RH e começou o incômodo. A pessoa só perguntou da minha vida pessoal: porque se separou do pai dos seus filhos? Onde ficam seus filhos enquanto você trabalha? E quando eles ficam doente, quem cuida? Nada da minha formação foi questionado.
Ao fim das perguntas, ela informou o salário e disse que eu faria outra entrevista com a diretora da unidade. Cheguei na segunda entrevista, já um pouco irritada. E adivinha qual foi a primeira pergunta? ‘Quantos filhos você tem?'. Depois vieram: eles são totalmente dependentes de você? Se eles precisarem de você com urgência, vai sair correndo para atendê-los? Aqui eu já estava irritada e respondi com tom áspero que meus filhos são prioridades.
Ao fim da conversa, me pediram para preencher uma ficha e disseram que fariam contato. Uma semana depois, recebi um e-mail dizendo que a vaga foi preenchida. O que mais me deixou indignada foi tratar-se de uma ONG que cuida de crianças em situações de vulnerabilidade e de risco social. Ao que parece, somente essas crianças têm valor para eles, porque os filhos das colaboradoras certamente não têm.” Ana Paula Lourenço Rosa, 30, professora.
“Tive uma gerente que quando todos me perguntavam se eu queria ter filhos, ela tomava a frente e respondia que eu não deveria engravidar primeiro que ela – era dois anos mais velha do que eu. Acabou que ela engravidou quatro meses antes. Mas, depois do primeiro filho, vieram as perguntas sobre o segundo e, novamente, ela respondia por mim. Dizia que eu não precisava ter o segundo, já que meu filho tinha contato com crianças na escola e uma priminha com idade bem próxima. Mas eu engravidei novamente.
Ao contar para ela, ela me pediu que não contasse para ninguém na empresa, pois queria preparar o terreno, disse que essa notícia não seria bem-vista pelos meus colegas de trabalho. Passou o tempo e ela não me deixava contar, até que em determinado momento eu falei por conta própria, porque minha barriga começou a aparecer.
Saí de licença e durante meu afastamento, ela me ligou e fez terrorismo, disse que as coisas não estavam bem na empresa, que a situação não era favorável. Eu pedi apenas que, se fosse me mandar embora, me avisasse antes de eu voltar, para não gastar com escolinha e para não desmamar a bebê. Não avisou. Fui mandada embora no dia que voltei da licença.
Agora estou em busca de recolocação, mas a minha área exige disponibilidade para viagens e constantemente escuto em entrevistas que meu CV é muito bom, pena que tenho filhos.” Elena, 35, supervisora de exportação.
“Quando comecei a procurar estágio em TI, na minha primeira participação em um processo seletivo eu era a única mulher entre 25 homens. Fui aprovada nas quatro fases do processo que aconteceram todas no mesmo dia. Cheguei à última etapa junto com outros dois rapazes. Eu teria que realizar uma série de atividades lógicas e também manuais, foi a fase mais longa. Fui a primeira a terminar e me certifiquei de que tudo que eu havia feito estava correto.
Quando os outros dois participantes acabaram, o gerente informou que já faria a devolutiva ali mesmo: os dois rapazes foram aprovados, e eu não. Eu não conseguia entender o motivo, já que tinha feito tudo certo e terminei antes deles .
O gerente, então, disse que eu tinha todos os requisitos para atender a vaga, mas que precisava de pessoas fortes para transportar as máquinas no braço dentro da empresa e, por isso, escolheu os meninos.
Naquela hora eu já sabia que não tinha conseguido a vaga por ser mulher, já que durante todas as etapas carregamos máquinas de um lado pra outro.
Enquanto ele falava, eu me questionava o motivo de ele me deixar ir até a fase final, se ele já sabia que não me contrataria por supostamente não ter a força braçal necessária. Então eu reagi e disse: ‘O senhor sabia que existem carrinhos onde podemos colocar as máquinas, e aí basta empurrar?’. Lembro da expressão de susto dele, que não esperava essa minha resposta. Ele tentou justificar, mas nada do que ele falou pode me deixar menos triste, desapontada e injustiçada.” Bianca Gomes, 24, analista de sistemas.
“Eu sofri discriminação o tempo todo em que trabalhei como garçonete em um restaurante, mas eu precisava de dinheiro e permanecia. Eu recebia menos que meu colega de trabalho. Fazíamos a mesma coisa e ele ganhava R$ 70 por dia, enquanto eu recebia R$ 40. A louça era minha responsabilidade, por isso, eu sempre ficava até depois do meu horário, enquanto ele saía na hora, já que não havia mais tarefas para ele.
Mas o pior ainda estava por vir. Um dia, uma mesa estava fazendo uma confraternização no restaurante. Eu servia com educação, sorria quase o tempo todo. Até que começaram as piadas de mau gosto, comentários sexuais e cantadas. Parei de sorrir, mas continuei servindo com educação.
Ao fim da noite, meu patrão me chamou a atenção, disse que os clientes reclamaram por eu não sorrir o suficiente ou não ser receptiva o suficiente. Eu disse que estava fazendo o meu trabalho, servindo as mesas. No outro dia fui demitida.” Raquel Larissa, 19, autônoma.