Quando Lea Ribeiro Queiroz se mudou para o residencial Francisca Trindade, na zona Norte de Teresina, ela não imaginava que conviveria diante de uma crise social. O bairro registra uma das maiores taxas de criminalidade da capital e cada vez mais crianças estão expostas à violência. Preocupada com o futuro dos pequenos, Lea se reuniu com sete amigas e juntas fundaram o Centro Assistencial Paraíso, uma atividade individual que está dando certo.
Guiado pelo amor ao próximo, o Centro Assistencial Paraíso promove aulas de reforço para crianças do residencial e também para alunos dos bairros mais próximos que estudam o ensino básico. Conhecido como Projeto Zezinho, o serviço é totalmente gratuito e atende cerca de 100 alunos nos turnos manhã e tarde. Todos os colabores são voluntários e em troca da boa ação realizada, recebem o carinho e afeto dos populares.
?Logo que me mudei para o bairro, notei que muitos pais de família eram analfabetos e não conseguiam ajudar os filhos com o dever de casa, fazendo com que muitas crianças passassem o dia inteiro na rua. Vimos que a comunidade precisava de ajuda e criamos o centro com o intuito de ajudar as crianças e famílias carentes. No início as crianças assistiam às aulas no chão, pois não tínhamos nem carteiras. Eventualmente recebemos doações que supriram a demanda, mas ainda é nossa principal necessidade. Sem cadeiras, não há aula?, conta a fundadora Lea Queiroz.
Os alunos aplaudem a atitude do centro. Estudante da quarta série, o pequeno Francisco Eduardo revela que o desempenho no colégio melhorou. ?Eu precisava muito de aulas de reforço, pois sentia dificuldade em aprender o assunto que passavam na escola e minhas notas eram baixas. Depois que minha mãe me colocou aqui, só tiro nota alta e hoje recebo até elogio dos professores?.
Iniciativa expande serviços
Inaugurada em 2007, a iniciativa fez tanto sucesso que expandiu os serviços para os adultos. Em parceria com a SEDUC, o centro oferece o projeto Brasil Alfabetizado: um curso profissionalizante voltado para a alfabetização de jovens e adultos. Ao longo de oito meses, os 15 alunos matriculados na turma deste ano aprendem a ler, escrever e aumentam as chances de entrar no mercado de trabalho. Todo o material escolar é doado aos estudantes.
?Fazemos esse trabalho com muito amor. Vamos além da mera relação entre professor e aluno. Estabelecemos um vínculo de amizade e respeito mútuo. Os alunos me procuram para tirar dúvidas que têm vergonha de perguntar para outras pessoas e todo dia aprendo uma coisa nova com eles. O pagamento vem no amor que recebemos deles?, fala o professor Sérgio Feitosa.
Buscando melhorar a qualidade de vida das mães, o Centro Paraíso buscou ajuda de outras fundações e hoje oferece cursos profissionalizantes de biscuit, corte e costura, manicure, corte de cabelo, salgados para festa e bordado. A iniciativa fez a felicidade das mães, que agradecem a oportunidade. ?Antes eu vivia angustiada, não tinha perspectiva de emprego e dependia dos auxílios do governo. Depois do curso de manicure passei a ganhar meu próprio dinheiro e agora posso dar uma vida ainda melhor para meus filhos?, comemora a dona de casa Néria Talita dos Santos.
De olho no sofrimento das famílias carentes, a presidente Francisca das Chagas Oliveira pediu amparo a associações e há dois anos desenvolve o Sopão Assistencial, um projeto elaborado especialmente para amenizar a fome dos mais necessitados. O sopão é servido aos domingos e as pessoas fazem fila desde as primeiras horas do dia.
O Centro Paraíso sobrevive com o dinheiro tirado do próprio bolso pelas coordenadoras e de doações feitas por algumas famílias. A casa onde funciona a instituição foi doada para a organização por tempo indeterminado, mas elas encontram dificuldades para manter a iniciativa. A dona de casa Néria dos Santos qualifica o projeto e faz um pedido para toda a cidade: ?gostaria de chamar a atenção da população para que o povo nos ajude. As meninas desenvolvem um trabalho muito bonito, mas que não recebe atenção dos governantes. Elas precisam de cestas básicas, livros, cadeiras escolares e até carvão para continuar atendendo as pessoas da vila?, pontua.
Campanha é feita para ajudar jovem deficiente
Lea Queiroz e Francisca das Chagas são a prova concreta de que carinho e dedicação rompem barreiras. À medida em que o Centro arrecadou verba para melhorias estruturais, as gestoras expandiram o campo de operações da associação e hoje realizam ações beneficentes para ajudar famílias em estado crítico. No momento elas realizam campanha para conseguir uma cadeira de rodas adaptada para o pequeno Francisco Samuel, de apenas um ano e oito meses.
Francisca das Chagas relata que a família procurou o Centro em desespero, pois o filho havia nascido com uma doença rara. ?O neném nasceu com um tipo de deficiência em que o sangue não leva oxigênio suficiente para o cérebro e por causa da doença ele nunca poderá voltar a andar. Estamos fazendo uma ação para conseguir uma cadeira de rodas adaptada para Francisco?, narra.
Além do aparelho, a família é carente e também necessita de cestas básicas, leite e fraudas. Lea completa: ?Estamos telefonando para residências de toda a cidade e pedindo que as famílias de bom coração ajudem no que for preciso. Qualquer quantia serve, a união faz a força?.
As pessoas interessadas em ajudar o pequeno Francisco não precisam se preocupar com nada. O Centro conta com uma equipe especial de mensageiros voluntários que recolhem mantimentos ou valores em dinheiro na casa do doador.
Transformando crianças e pais
O Centro Assistencial Paraíso está mudando a vida da população carente do residencial Francisca Trindade. Além dos alunos atendidos pela escola de reforço, os pais que desejam se alfabetizar sabem exatamente a quem recorrer.
Para ajudar os chefes de família a incrementarem a renda familiar, a organização promove oficinas profissionalizantes que podem ser desenvolvidas em casa, sem que as mães precisem se ausentar do lar.
Presidente da fundação, Francisca das Chagas Oliveira firmou uma parceria com a Fundação Wall Ferraz e há um ano oferece cursos gratuitos de biscuit, manicure, bordado, corte de cabelo e salgados para festa. Até agora, mais de 30 mães foram contempladas com o benefício.
A dona de casa Maria da Concecição dos Santos se matriculou no curso de corte de cabelo e agradece a oportunidade. ?Tenho três filhos, sou mãe solteira e não posso passar muito tempo fora de casa. Durante as aulas aprendi a técnica e hoje complemento a renda do mês cortando cabelo em casa. Estou muito satisfeita com o curso e pretendo fazer outros?, diz.
A intenção é que mais oficinas sejam implantadas com o tempo. ?Essa parceria possibilita o desenvolvimento de muitos cursos. Estamos apenas esperando o contato da Fundação para iniciar novas turmas?, explica a presidente Francisca das Chagas.
Centro conta com telemarketing para arrecadar doações
No intuito de potencializar as doações para as campanhas realizadas em prol das famílias mais carentes, uma central de telemarketing foi recentemente instalada para otimizar a arrecadação de donativos para a associação.
Coordenadora responsável do setor, Keity Francianny de Araújo explica que o Centro Paraíso realiza uma campanha a cada mês.
?As campanhas são feitas para diminuir a necessidade de quem mais precisa. Algumas famílias passam por dificuldades e não têm nem como alimentar os filhos. Isso sem falar nas pessoas carentes que passam por problemas de saúde e não têm o dinheiro para comprar a medicação. Felizmente, a resposta tem sido positiva e recebemos algumas doações. Ainda existem muitas pessoas com bom coração?, reflete.
Outra voluntária é a telefonista Adriana Fialho. Entre a conclusão do Ensino Médio e a busca por emprego, ela resolveu aproveitar o tempo livre para ajudar a associação.
?Em vez de ficar parada, escolhi ajudar. Muita gente da região precisa de ajuda e não posso fechar os olhos para isto. Poderia estar em casa assistindo à televisão, mas prefiro fazer o bem?, finaliza.
Paraíso precisa de doações para seguir em frente
Iniciativa pioneira no residencial Francisca Trindade, o Centro Assistencial Paraíso é o único projeto em vigor no bairro. Além dos projetos citados, a organização oferece treinos de futebol duas vezes por semana e campeonatos anuais, graças a uma parceria com a SEMEC. Entretanto, tudo tem seu preço: apenas as bolas e traves são doadas pela Secretaria Municipal de Esporte e Cultura. O financiamento dos outros acessórios, como chuteiras e uniformes saem do bolso das administradoras. O mesmo acontece com o lanche oferecido aos alunos da escola de reforço e outros projetos assistenciais.
O Sopão Comunitário precisa de doações, já que todos os ingredientes para o preparo do alimento são doados. ?A carne da sopa é garantida por uma doação da APAT, mas tem dia que o sopão não sai porque não temos verduras para colocar na comida?, desabafa a presidente do centro. Ela afirma que o Paraíso tentou se credenciar no programa Mesa Brasil, mas a burocracia é muito grande e a organização ainda não foi aceita.
Para continuar seguindo em frente, o Centro Assistencial Paraíso precisa de doações. ?Toda ajuda é bem-vinda. Uma parte do dinheiro para manter a associação sai de nossos bolsos, mas também temos família para cuidar. Por isso, pedimos que as pessoas de bom coração olhem para nosso trabalho e nos ajudem?, clama Francisca.