O cursinho pré-vestibular paulista CPV diz ter recebido uma oferta de venda de uma cópia da prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2009 uma semana antes da aplicação do exame.
Pessoas que tiveram acesso à prova tentaram vendê-la a veículos de imprensa. A notícia foi divulgada pelo jornal ?O Estado de S.Paulo? e o Ministério da Educação (MEC) decidiu suspender, na quinta-feira (1º), a realização do exame, marcada para os dias 3 e 4 deste mês. As novas datas foram marcadas para o dias 5 e 6 de dezembro.
Segundo o diretor de comunicação do curso, Alexandre Chumer, um homem, que não se identificou, telefonou duas vezes para a editora de material didático do curso no dia 28 de setembro. Na primeira ligação, a pessoa disse que tinha uma cópia da prova e queria vender por R$ 200 mil. O telefonema foi atendido por um funcionário do departamento comercial do curso que disse não ter interesse na compra, segundo Chumer. Depois, o mesmo homem telefonou novamente e baixou o preço da oferta para R$ 50 mil.
?No início, achamos que era brincadeira?, comentou o diretor, que disse só ter pensado na possibilidade de a proposta ser verdadeira depois que viu a notícia sobre o vazamento da prova veiculada na imprensa. Segundo ele, o curso não comunicou o fato à polícia por achar que não era verdadeiro e também porque a ligação foi feita para um telefone que não tem identificador de chamada, mas disse que está à disposição caso a Polícia Federal precise fazer qualquer investigação.
O curso informou ainda que apenas cerca de 20 dos seus 600 alunos vão fazer o Enem e que não concorda nem teria interesse em comprar a prova. ?Temos 50 anos de história, não faríamos isso?. A maior parte dos estudantes do CPV se prepara para vestibulares de instituições que não aceitam o exame em seu processo seletivo.
O G1 procurou a Polícia Federal para saber se o caso da oferta feita ao CPV seria investigado, mas ninguém atendeu a ligação na assessoria de imprensa do órgão na manhã desta quinta-feira (8) nem respondeu o e-mail encaminhado pela reportagem. Procurado, o MEC não quis comentar o caso.
Cinco indiciados
A Polícia Federal indiciou cinco pessoas pelo vazamento da prova, mas nenhuma delas ficará presa. ?O caso está totalmente esclarecido?, afirmou o delegado da PF, Marcelo Sabadin Baltazar. Segundo ele, os suspeitos de furtar a prova do Enem levaram dois dias para executar o crime, que aconteceu nos dias 21 e 22 de setembro.
Baltazar afirmou que, no dia 21 do mês passado, Felipe Pradella, de 32 anos, apontado pela polícia como o mentor do crime, pediu a outro colega de trabalho da Gráfica Plural, onde o exame foi impresso, para que pegasse o caderno um. No dia seguinte, de acordo com o delegado, o próprio Pradella pegou a publicação. Desta vez, subtraiu o caderno dois.
O delegado, que comanda a Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários, informou que, agora, a polícia pretende concluir um relatório no qual vão constar informações sobre o possível esquema falho na segurança da Gráfica Plural. ?É para o MEC aprimorar o sistema de segurança?. Apesar disso, nenhum representante da empresa foi indiciado.
Indiciamentos
O superintendente da PF em exercício, Fernando Duran Poch, informou que duas pessoas foram indiciadas por violação de sigilo funcional: Luciano Rodrigues, 39, e Gregory Camillo de Oliveira Craid, 26.
Felipe Pradella e outros dois jovens que, segundo os policiais, trabalhavam na gráfica, foram enquadrados nos crimes de peculato e quebra do sigilo funcional. ?O Pradella também está sendo responsabilizado por extorsão?.
Além de pedir os R$ 500 mil, ele teria ameaçado uma repórter de "O Estado de S. Paulo" após ver a notícia de vazamento do exame veiculada no jornal. Segundo o delegado, o rapaz ameaçou matá-la. ?Ele nega as ameaças, mas tem a gravação da jornalista. Vai ser feita uma perícia, mas temos certeza de que é ele?.
Baltazar explicou que foi de Pradella a ideia de ?ganhar dinheiro fácil?, retirando as duas encadernações e vendendo à imprensa. ?Ele vislumbrou a possibilidade de ganhar R$ 500 mil de uma vez só subtraindo a prova?. A polícia está com as imagens do circuito interno de TV da gráfica, mas diz que as cenas não mostram o momento do furto porque ?o local tem um ponto cego?
Ele descreveu como, a partir dos depoimentos, foram cometidos os furtos. No dia 21, Pradella teria pedido ao colega de trabalho, que seria seu ?amigo de infância? que pegasse a prova. ?Ele pôs na cueca e entregou ao Pradella?. E continuou: ?No segundo dia, o próprio Pradella se sentiu mais confortável e pegou a prova?.
Segundo o delegado, o suposto mentor do crime teria ido até o estoque da gráfica e enrolado o exame na camisa de outro amigo, pedindo que este levasse a peça para seu carro. Tanto Poch quanto Baltazar ressaltaram que ?não há motivação política? no caso. ?Eles assumiram que pegaram a prova, mas negam o interesse financeiro. Dizem que queriam dar um furo jornalístico?, contou ele, chamando o grupo de ?amador?.
Baltazar explicou que Craid, cuja ocupação é de DJ, e Rodrigues, dono de uma pizzaria, seriam o contato com a imprensa.
Outro lado
Claudete Pinheiro, a advogada que defende Felipe Pradella, disse que houve ?falta de prudência? da PF em indiciar o rapaz por extorsão. ?Eu tenho plena consciência de que meu cliente não fez isso?, afirmou ela sobre a suspeita de que Pradella tenha ameaçado a repórter de morte. Ela garantiu ainda ?não estar preocupada? com a conclusão do inquérito. ?Estou tranquila. Quero ver agora como o Ministério Público vai sustentar a denúncia?.
Para o advogado Luiz Vicente Bezinelli, defensor de Luciano Rodrigues, a PF agiu com ?rapidez e eficência, mas trabalhou sob pressão?. Ele sustenta que o comerciante foi indiciado ?pela necessidade que a polícia tinha de dar uma resposta?. E completou: ?ele não teve participação nenhuma?.
Também procurado nesta terça, o DJ Gregory Camillo Craid disse que não se pronunciaria até o caso chegar ao Ministério Público Federal, quando vira processo. Os advogados dos outros indiciados não foram localizados.