Deputado é acusado de aplicar golpes milionários no Brasil e nos EUA

Reportagem do Fantástico entrevistou 25 pessoas que se dizem vítimas de Luis Miranda, do DEM; 11 gravaram entrevista. Parlamentar nega as acusações.

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O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) é acusado de aplicar golpes milionários em quem aceitasse se tornar sócio dele em supostos negócios no Estados Unidos. O caso foi revelado neste domingo (8) pelo Fantástico. A reportagem conversou com 25 pessoas que se dizem ter sido vítimas de Luis Miranda. Onze gravaram entrevista. Destas, nove preferiram não se identificar porque disseram ter medo do parlamentar. As informações são do G1.

O empresário Sandro Silveira Antonalia contou ao Fantástico que teve um prejuízo de cerca de R$ 150 mil. “Minha surpresa é que, de tudo o que ele prometeu, não aconteceu nada.”

Foto: Arquivo pessoal

Outro empresário, que não quis se identificar, disse que acreditou em Luis Miranda quando ele começou a vender franquias da Fitcorpus — clínica de estética criada em 2008 pelo deputado. “Ele ficava com todo o lucro, praticamente. A gente dependia dele para o aluguel de máquinas e era onde realmente se ganhava dinheiro, que era com os equipamentos de laser”, afirmou.

Segundo o empresário, depois de quatro meses, a franquia fechou, e até hoje, Luis Miranda não pagou o que lhe devia: “A gente ficou com um prejuízo de cerca de R$ 200 mil”.

Outra empresária comprou uma franquia da Fitcorpus, mas desistiu no mesmo dia, ao ler o contrato com mais atenção. Ela exigiu a devolução do dinheiro (também cerca de R$ 200 mil), mas também disse que não recebeu nada até hoje. O deputado nega ter aplicado golpes no Brasil e nos Estados Unidos.

Miami

O Conselho Regional de Medicina do DF proibiu a clínica de estética de Luis Miranda de realizar qualquer tipo de procedimento cirúrgico. Ele sofreu pelo menos 26 ações na Justiça — são processos de franqueados, sócios, pacientes e ex-funcionários.

Depois dos processos, Luis Miranda se mudou, em 2014, para os Estados Unidos. Em um vídeo gravado na chegada ao país, ele explicou assim a saída de Brasília: “Fui muito prejudicado pela desonestidade das pessoas no Brasil”.

A equipe do Fantástico foi a Miami, na Flórida. Para ostentar o dinheiro, Miranda chegou a gravar um vídeo em uma concessionária comprando um dos carros mais caros do mundo, pagando por ele mais de R$ 1 milhão.

Nos tempos em que morou nos Estados Unidos, o número de seguidores nas redes sociais de Luis Miranda foi aumentando. Nos discursos de motivação, dizia que “qualquer um pode ter uma casa na beira do mar, é só querer, é uma decisão”. Também afirmou que cresceu “absurdamente” nos Estados Unidos “não é porque eu sou cara mais inteligente do mundo, é que eu aprendi que o meu dinheiro pode trabalhar para mim”. Assim, chegou a 4 milhões de seguidores.

Prometendo ensinar seus segredos para ganhar dinheiro fácil, ele achou uma forma de ganhar dinheiro com os seguidores: vendendo cursos on-line.

“Imagina você ganhar R$ 180 mil dentro de casa, com seus filhos, com seus amigos, tomando cerveja. Botar R$ 180 mil no bolso fazendo simplesmente, absolutamente, nada”, afirmou em um dos vídeos.

Em outra filmagem, Luis Miranda disse que teve 18 mil alunos entre janeiro de 2017 e julho de 2018. Como estratégia para ganhar a confiança de todos, criou um bordão: “Estamos juntos e juntos somos mais fortes”.

Curso e sociedadeFoto: Arquivo pessoal

O empresário Sandro Silveira Antonalia acreditou no curso e disse que pagou por ele R$ 1.200, custo dividido em 12 vezes. Se cada um dos 18 mil alunos anunciados por Luis Miranda tiver pago o mesmo valor, ele teria recebido R$ 21,6 milhões em 18 meses.

“Ele demonstrava ali como se fosse uma coisa muito fácil, muito garantida, que daria muito certo”, disse ao Fantástico uma das vítimas. “É um estelionatário, um quadrilheiro.”

Além dos cursos, Miranda encontrou outra fonte de renda: oferecer sociedade aos seus seguidores nas redes sociais na compra e venda de mercadorias dos EUA, principalmente carros.

Ele afirmava aos seguidores que compraria veículos batidos em leilões, faria reformas em oficinas — inclusive na dele, em Miami — e os colocaria à venda por um preço bem maior. Para isso, os sócios teriam de mandar dinheiro para ele. Segundo as vítimas, Luis Miranda dizia que ficaria com a metade do lucro e o sócio, com a outra metade.

“Eu faço a operação toda para vocês. Vocês ficam despreocupados do início ao fim.”

Um brasileiro que não quis se identificar enviou US$ 60 mil (cerca de R$ 240 mil) para a compra de dois carros. Como não teve lucro, pediu a devolução, pelo menos, do valor investido.

“Era um dinheiro que eu guardava para minha aposentadoria. Fiquei inconformado.”

Grupo de investimento

Em dezembro de 2017, Luis Miranda teve outra ideia — um grupo de investimento. De acordo com ele, os lucros seriam maiores do que os da caderneta de poupança e do Tesouro Direto, por exemplo.

Em um vídeo, Miranda disse que quem investisse US$ 1 mil teria US$ 150 mil após cinco anos.

“Vamos bater metas inacreditáveis e vamos crescer muito, porque o mais importante no mundo é a honestidade.”

Alguns brasileiros foram para os Estados Unidos, para conversar pessoalmente com Luis Miranda. Entre eles, Sandro Antonalia. Depois de fazer o curso on-line, ele queria ser um dos investidores. Para isso, vendeu dois carros e a empresa que tinha no Brasil.

O empresário foi para Miami em maio do ano passado, onde conheceu Miranda. “Convivendo na empresa dele todos os dias, depois de um tempo, eu vi que acabei caindo num golpe. Ele é um vendedor de sonhos”, disse.

Antonalia disse ao Fantástico que Luis Miranda reservou moradia para ele nos Estados Unidos. Quinze pessoas — a maioria delas, brasileiros atraídos pelas promessas de riqueza — dividiam o mesmo espaço.

Depois de três meses, um encontro com investidores, Antonalia disse que tudo não passava de um golpe. Segundo ele, Luis Miranda teria feito ameaças.

“Ele queria me bater com um taco de beisebol que ele tinha no escritório. Tinha arame farpado.”

Depois disso, Antonalia voltou ao Brasil. “Eu vivi toda a tensão. Enquanto não cheguei aqui no Brasil, eu não sosseguei”, afirmou.

Dados falsos

Nos Estados Unidos, a reportagem do Fantástico encontrou Francisco Martins, que trabalhou com Luis Miranda. Ele afirmou que, no primeiro trimestre de 2018, o fundo de investimentos não deu o lucro esperado, mas Miranda mentiu, apresentando dados falsos, de que o ganho líquido por mês tinha sido de 6%.

“Na verdade, essa planilha foi criada com os números reais. Depois, ele mudou. Ele alterou”, disse Martins. Segundo o ex-funcionário, o resultado da mentira foi imediato.

“Teve muitas pessoas que venderam casas, carros. Pegaram dinheiro com familiares, juntaram dinheiro. Pai, mãe, tio… Juntavam dinheiro para mandar para esse investimento.”

O ex-funcionário, que tinha acesso a toda a contabilidade, disse que Luis Miranda tinha pelo menos 280 investidores. Quantas pessoas conseguiram resgatar o dinheiro? “Eu acho que um pouco mais de 10 pessoas. Não mais que isso.”

Um brasileiro que mora nos Estados Unidos investiu US$ 30 mil e não recebeu nenhum retorno. Outro, que mora no Brasil, investiu US$ 50 mil e convenceu um parente a usar o mesmo valor.

“Raspei a poupança e coloquei tudo na mão dele. Me separei, perdi família. Tive que tirar meus filhos da escola.”

Dívida

A estimativa é de que a dívida do deputado chegue a quase R$ 9 milhões. Onde foi parar o dinheiro? Francisco Martins afirmou que Miranda fazia saques da conta onde estava o dinheiro dos investidores para bancar os gastos milionários.

Segundo outro ex-funcionário, a despesa pessoal dele chegaria a R$ 200 mil por mês. Na Flórida, ele morava em um condomínio onde o valor médio de um aluguel é de R$ 16 mil.

“Tudo isso com dinheiro de investidor que estava na conta, e ele usava sem ter uma separação”, diz Martins.

Nas redes sociais, o deputado sempre atribuiu o fracasso dos negócios a uma campanha difamatória liderada por um grupo de internautas.

Nesta semana, a Polícia Civil do DF indiciou quatro pessoas que seriam desse grupo. Nenhuma delas foi ouvida até a noite deste domingo (8). Na noite de quinta-feira (5), um outro suspeito foi preso em Brasília.

Segundo a polícia, ele se encontrou com Luis Miranda e teria exigido R$ 760 mil dizendo que, entre outras promessas, conseguiria evitar que o Fantástico exibisse a reportagem deste domingo sobre o deputado.

Como estão os negócios

A LX Holding, empresa montada por Luis Miranda nos Estados Unidos, funcionava no centro comercial de Miami. Hoje, está abandonada, sem ninguém.

A equipe do Fantástico também esteve em uma oficina que reforma carros comprados em leilão. Segundo testemunhas, o verdadeiro dono é Luis Miranda, mas o deputado teria um “laranja” para cuidar do negócio.

No local, a reportagem foi recebida por um homem que disse se chamar Eudes e ter nascido na República Dominicana.

Primeiro, ele falou que era o dono da oficina e não conhecia Luis Miranda. Depois, disse que era sócio do deputado, que o negócio não estava encerrado e prometeu aos investidores que todos vão receber: “Claro que vai pagar. E Luis Miranda vai ser presidente do Brasil”.

Pelo menos 50 vítimas procuraram a Justiça exigindo a devolução do dinheiro relacionado a investimentos nos Estados Unidos.

Vida pública

Em setembro do ano passado, Luis Miranda anunciou que voltaria a Brasília, onde nasceu, para se lançar candidato a deputado federal. Foi eleito com mais de 65 mil votos.

Durante a campanha, ele disse que não queria “salário do governo, verba de gabinete, nada disso”, pois pretendia dar o exemplo.

Ele não cumpriu o que disse na campanha: por mês, recebe R$ 33.700 do salário de deputado e mais R$ 111 mil de verba de gabinete. Ele é titular em 10 comissões na Câmara dos Deputados, entre elas a da Previdência Social, a de Finanças e Tributação, e a de Reforma Tributária.

Além disso, Luis Miranda teve as contas da campanha reprovadas pelo Tribunal Regional Eleitoral. Ele recorre da decisão.

O deputado também enfrenta processo de cassação na Justiça Eleitoral e foi obrigado a entregar o passaporte para a Polícia Federal devido a um outro processo, sobre indenização. Ele também está recorrendo desta decisão.

Miranda também é investigado pela procuradoria-geral da República. A apuração é sigilosa.

O que Luis Miranda diz

Luis Miranda conversou com a reportagem do Fantástico na tarde deste sábado (7), na casa dele, em Brasília. O deputado negou ter aplicado golpes no Brasil e nos EUA e voltou a culpar os ataques virtuais que, segundo ele, tinham como um dos objetivos tirá-lo do mercado de cursos on-line.

“Foi minado o capital por causa desses ataques. O faturamento despencou, caiu em 90%. Infelizmente, existem pessoas mau caráter. E esse não sou eu. Estou aqui de cara aberta querendo resolver os meus problemas. E resolvendo todos da forma mais correta possível, dentro da lei”, afirmou.

Sobre Sandro Silveira Antonalia, que se diz vítima do golpe, o deputado alegou que ele nunca foi um investidor. Sobre a suposta falsificação das planilhas apresentadas aos sócios, Miranda culpou o ex-funcionário: “Eu não sou especialista em números, ele era a pessoa que se responsabilizava por isso. Ele vai responder por isso e vai responder de verdade”.

Luis Miranda alegou também que, por causa de gastos de campanha, ainda não abriu mão do salário de deputado, mas que vai fazer isso. Afirmou também que nunca gastou dinheiro dos outros.

“Eu ganhei R$ 4 milhões e meio só com a venda de cursos. Me permite comprar uma Lamborghini nos Estados Unidos de US$ 250 mil”, disse. Questionado sobre por que não a vendia para quitar as dívidas, respondeu que a empresa está “cumprindo seu papel legal” e que, se a empresa se encontrar “numa situação impossível de efetuar seus pagamentos”, o patrimônio dele estará “à disposição”.

O deputado disse que as pessoas estão recebendo as dívidas: “Elas estão recebendo. Estão pagando toda semana. Mas, infelizmente, tem pessoas que querem furar fila. A gente montou uma fila porque foi uma quantidade imensa de resgates. É um a um. É lento. São 50 pessoas querendo sair agora, está pagando um por semana. Às vezes, um a cada 15 dias. Então é lento, mas está pagando. Sabe qual é o problema das pessoas? Elas querem entrar em um negócio e só ganhar. Quando tem uma dificuldade, ninguém quer passar dificuldade”.

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