Uma sindicância feita pela Prefeitura de Goiânia e Ministério Público comprovou uma fraude na folha de ponto de médicos do Centro Integrado de Assistencia Municipal à Saúde (Ciams) do Setor Novo Horizonte, em Goiânia. De acordo com o relatório da investigação, pelo menos 16 profissionais teriam recebido por plantões da unidade de saúde sem trabalhar.
A grande quantidade de plantões registrados na unidade levantou a suspeita da Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Em outubro do ano passado, uma comissão de sindicância começou a buscar respostas. Segundo o responsável pela investigação, o assessor jurídico da SMS, Carlos Eduardo Itacaramby, foram verificadas situações absurdas.
"Por exemplo, o profissional conseguir trabalhar durante três dias consecutivos em plantões de 24 horas, ou seja, o cara ficou três dias na unidade", aponta Itacaramby.
A investigação teve como base documentos de controle dos dias de trabalho dos médicos da unidade de saúde. Entre eles, o chamado mapa, que registra a presença dos profissionais nos plantões. Essas frequências foram comparadas com dados de outros dois documentos: o cartão de ponto dos profissionais e o relatório feito pelos enfermeiros. As divergências ficaram evidentes.
A comissão da Secretaria de Saúde levantou, de cada um dos profissionais suspeitos, a listagem por mês de plantões que teriam sido fraudados. De acordo com o levantamento, as irregularidades foram cometidas de janeiro a agosto de 2012.
Há o caso de um médico que teria recebido indevidamente por 46 plantões, sem sequer aparecer no Ciams. Considerando que cada plantão de 12 horas custa para o município R$ 800, só este profissional teria recebido R$ 36.800, uma média de R$ 4.600 por mês, no período apurado.
Em outro caso, um médico recebeu R$ 22 mil quando o valor do contrato era de pouco mais de R$ 16 mil. Quase R$ 5 mil a mais por horas não trabalhadas.
"O objeto principal da investigação é a pessoa receber por plantões que ela não trabalhou. Isso é o que mais chama a atenção. É um ato extremamente lesivo aos cofres da saúde", diz o assessor jurídico da SMS.
Irregularidades
O Ministério Público de Goiás (MP-GO) começou a investigar o caso em janeiro deste ano e também identificou uma série de irregularidades. "Pagamentos em duplicidade de profissionais, pagamento de valor indevido e ausência do local de trabalho", listou a promotora de Defesa do Patrimônio Público Marlene Nunes Bueno.
Até agora, além de 16 médicos, a investigação levantou a fraude ocorreu com a participação de servidoras Ciams. As funcionárias prestaram depoimento há quatro meses e foram afastadas dos cargos, para não atrapalhar as investigações.
São elas: a diretora geral Vânia Lúcia de Paula Ramos, a diretora técnica Doraine Regina Barcelos, a diretora administrativa Vanete Sandra Meirelles, e a assistente administrativa Vanessa Andrade. As servidoras e os outros 16 envolvidos estão respondendo a um processo disciplinar que tem como punição de advertência à demissão. Os médicos não tiveram os nomes divulgados porque eles ainda não foram ouvidos.
As quatro servidoras afastadas foram procuradas pela reportagem. Por telefone, Vânia Lúcia Ramos disse que não tem nada a comentar. Vanete Meirelles informou que só fala sobre o assunto acompanhada do advogado. Doraine Barcelos e Vanessa Andrade não atenderam as ligações.
Prejuízos
Para o MP, o prejuízo não é só financeiro. "Essa prática que ocorreu no Ciams do Novo Horizonte é uma prática absolutamente grave, porque não se trata só de desvio de recurso público. Houve alí um comprometimento no atendimento à população", argumenta a promotora.
A notícia da fraude causou indignação a quem sofre todos os dias com a falta de médico nas unidades de saúde em Goiânia. "Tem que devolver o dinheiro, né? Vai receber sem fazer nada? Sem estar atendendo a gente?", questiona a estudante Tainara de Jesus Araújo, enquanto aguardava atendimento no Ciams.
"Poderia estar pagando outros [médicos] e a população estar sendo atendida", reclamou o montador de móveis Edson Souza.
Ao fim do processo será movida uma ação de cobrança contra os servidores, para que eles devolvam o dinheiro recebido indevidamente, com juros e correção monetária.