Uma das mais importantes mães de santo do Brasil, que liderou por 42 anos o Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, a ialorixá Mãe Stella de Oxóssi deixa, além do legado imaterial como mãe de santo, uma herança material e literária.
Do ponto de vista material, a pessoa física Maria Stella de Azevedo Santos era enfermeira aposentada e também recebia os direitos autorais de sua obra como escritora. Como mãe de santo e figura pública notável, também recebia presentes de admiradores, em gratidão às orientações espirituais que realizava. O espólio de Mãe Stella deverá ser dividido em um inventário. De acordo com o Ministério Público, a ialorixá e a psicóloga Graziela Domini Peixoto têm uma união estável reconhecida em cartório, que foi apresentada à entidade. Graziela confirma a união, mas membros do Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá afirmam que “nunca viram o documento”. Mãe Stella não tinha filhos, mas deixou uma irmã e sobrinhos.
O advogado especialista em direito dos negócios e propriedade intelectual Ricardo Costa Oliveira explica que, com a união estável, Graziela tem direito a 100% do legado financeiro de Mãe Stella. Ele explica que apenas pais e filhos concorreriam com a união estável na divisão dos bens, incluindo o direito à propriedade intelectual dos livros. Se Mãe Stella tivesse pais ou filhos, o dinheiro seria dividido entre eles e a companheira da ialorixá, que ficaria com 50% da herança. Caso a união estável não existisse - e não fosse posteriormente comprovada na Justiça -, a herança seria distribuída entre a irmã e sobrinhos. “O direito autoral, ao contrário da patente, é um tipo de propriedade intelectual que dura toda a vida e ainda um tempo a mais. No Brasil, o direito autoral literário segue para os herdeiros entre 50 e 70 anos”, acrescenta. Segundo o presidente da Sociedade Cruz Santa, entidade civil que mantém e administra o Ilê Axé Opô Afonjá, o ogã Ribamar Daniel, os proventos do terreiro não têm relação com a herança pessoal de Mãe Stella e são administrados pela entidade. “O que a sociedade recebe é voltado para as obras sociais, por exemplo. O que era dela, ia para a conta dela”, diz.
Legado literário
Mãe Stella, em vida, publicou sete livros e foi eleita para a cadeira de número 33 da Academia de Letras da Bahia (ALB), que tem como patrono o poeta Castro Alves.
O escritor Aramis Ribeiro Costa era presidente da ALB na ocasião. Para ele, a nomeação da ialorixá foi uma forma de fazer justiça à cultura afro brasileira. “Ela é uma digna representante do segmento cultural. A indicação dela para a cadeira era desejo de alguns acadêmicos e ocorreu por unanimidade”, explicou Costa. O escritor também destacou que além de representar a cultura afro brasileira, Mãe Stella era herdeira de “uma tradição de ialorixás famosíssimas”, daí sua importância. “Ela representava e faz parte de toda essa cultura que não é apenas livresca, de literatura, mas de cultura. Ela é uma representante muito digna e uma criatura humana extraordinária”, acrescentou Aramis.