A crise chegou ao mercado de trabalho. As empresas seguem ampliando o quadro de funcionários, mas o ritmo de criação de vagas perdeu fôlego e hoje é o mesmo do início da turbulência global em 2008, depois do quebra do banco americano Lehman Brothers. Foram geradas 858 mil novas vagas no primeiro semestre, 407 mil a menos comparado igual período de 2011, quando foram criados 1,265 milhão de postos de trabalho, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho.
Descontando-se efeitos sazonais, o saldo entre admissões e demissões foi de 68 mil, segundo cálculos feitos pelo Bradesco. O patamar é similar aos 65 mil de novembro de 2008 e quase metade da média mensal de 115 mil vagas criadas no início do governo Lula, em janeiro de 2003.
"É um ritmo bem mais lento de geração de empregos", diz Leandro Câmara Negrão, economista do Bradesco. "A desaceleração começa a ter impacto no mercado de trabalho", diz Caio Machado, economista da LCA Consultores. "O emprego não foi atingido na mesma proporção pela crise, mas não se gera mais tantas vagas", acrescenta Clemente Ganz Lúcio, diretor do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio Econômicos (Dieese).
Graças ao crescimento da renda e ao bom desempenho das vendas no varejo, o mercado de trabalho parecia "blindado" contra a crise. Com o recrudescimento da crise na Europa, a desaceleração na China, e a queda dos investimentos e a alta da inadimplência no Brasil, a confiança dos empresários foi abalada, reduzindo o ímpeto de novas contratações.
Indústria. A geração de vagas perdeu ritmo em todos os segmentos da economia, incluindo alguns que viviam um "boom", como construção civil e comércio. A situação da indústria, que amarga altos estoques e produção estagnada, é a mais grave. Em junho, a indústria de transformação gerou metade dos 22,6 mil criados em junho do ano passado.
"O nível de perda de empregos não é alarmante, mas a situação da indústria já nos causa bastante desconforto", diz Vagner Freitas, presidente da Central Única de Trabalhadores (CUT).
O caso da montadora General Motors - que fez um acordo anteontem com o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos para segurar, temporariamente, pelo menos 940 demissões - é um dos exemplos.
Em junho, a indústria paulista fechou 23,5 mil vagas (excluindo o setor de açúcar e álcool), revertendo o saldo positivo acumulado até agora, no ano, para uma queda de 13,1 mil vagas, conforme dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
"Quando seguramos o pulso da indústria, não sentimos nenhuma recuperação", diz Paulo Francini, diretor do departamento da Economia da Fiesp.
Resistência. O quadro, no entanto, não é catastrófico, porque não há demissões em massa como aconteceu em 2009. Naquela época, as empresas gastaram muito para demitir trabalhadores e depois recontratá-los quando a economia se recuperou no ano seguinte. A taxa de desemprego, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), se mantém na mínima histórica de 5,7%.
Os analistas lembram que a taxa do IBGE mede o desemprego somente nas seis regiões metropolitanas. Isso precisa ser levado em conta porque, nos últimos anos, houve uma migração da indústria para o interior, onde o desemprego só é contabilizado pelo Caged . Além disso, a taxa do IBGE é influenciada pelo fato de que menos pessoas estão em busca de trabalho, uma consequência da queda da taxa de natalidade e do aumento da renda.
No segundo semestre, o mercado de trabalho deve ganhar algum fôlego, por conta das medidas do governo para incentivar o consumo, mas o resultado do ano promete ser fraco.
Para o Bradesco, o País vai criar 1,26 milhão de novas vagas em 2012, abaixo da média de 1,55 milhão dos últimos cinco anos.
"O que me preocupa é 2013. Se não houver uma reativação dos investimentos, será um ano completamente diferente", diz José Pastore, especialista em relações de trabalho e professor da Universidade de São Paulo (USP).