Com as m?os enfiadas nos bolsos, um gorro mal-ajeitado na cabe?a e o corpo franzino arqueado para frente, O., de 32 anos, chega envergonhado ? frente do padre Evaristo Higa e pede: "posso tomar a sopa tamb?m?"
Ele se refere ao sop?o distribu?do todos os s?bados aos sem-teto de Hamamatsu, na prov?ncia de Shizuoka.
H? duas semanas, ap?s perder o emprego e a vaga no alojamento, o rapaz passou a ser mais um a dormir nas ruas da cidade que abriga a maior concentra??o de trabalhadores brasileiros no Jap?o.
O padre Higa, que h? 14 anos criou o Grupo Esperan?a para distribuir sopa, bolinhos de arroz, rem?dios e roupas aos sem-tetos japoneses e estrangeiros, lembra que esta n?o ? a primeira vez que uma crise econ?mica leva os brasileiros para a rua.
"H? dez anos, na recess?o dos anos 90, ajudamos a repatriar 13 sem-tetos. Desta vez, n?o h? muitos porque a maioria j? n?o mora mais em alojamentos de empresas e, assim, t?m a quem pedir abrigo", diz ele ? BBC Brasil.
Cortes em massa
O surgimento de trabalhadores brasileiros sem-teto em um per?odo de recess?o como este n?o ? de se espantar.
Afinal, a grande maioria ainda vive de contratos tempor?rios, mesmo sem nunca ter trocado de emprego. Sem a prote??o trabalhista, reservada apenas aos funcion?rios efetivados, s?o eles os primeiros a serem cortados.
Com o an?ncio oficial de que a economia do pa?s est? em recess?o, as montadoras de ve?culos e f?bricas de eletr?nicos, principais pilastras da economia do Jap?o e tamb?m fontes de emprego dos dekasseguis, n?o param de anunciar quedas na produ??o e a diminui??o de trabalhadores tempor?rios.
A explica??o ? simples: o maior parceiro econ?mico do pa?s asi?tico s?o os Estados Unidos, que j? n?o consomem tanto. O mercado interno tamb?m n?o consegue absorver a alta produ??o. Como resultado, um grande n?mero de brasileiros acaba recebendo a carta de demiss?o.
A mais recente montadora a divulgar cortes foi a Mitsubishi, a quarta maior empresa do setor automotivo no Jap?o. Ser?o mil vagas a menos e uma redu??o de 120 mil unidades de ve?culos produzidos at? mar?o de 2009.
A Toyota, considerada a principal fonte de renda direta ou indireta dos brasileiros que vivem na regi?o de Aichi, planeja cortar 3 mil postos de trabalho tempor?rios, enquanto a Nissan, terceira do setor, vai reduzir 3,5 mil postos em todo o mundo.
Em busca de vagas
A pergunta que todos se fazem agora ?: at? quando a recess?o vai durar?
"Paramos de anunciar [empregos] na m?dia e n?o temos id?ia de quando a situa??o ir? melhorar", avisa Cl?udio Sakamoto, 42 anos, do departamento de Recursos Humanos da Misuzu, f?brica de componentes eletr?nicos que emprega atualmente cerca de 300 brasileiros.
"At? meados de outubro, por?m, havia pelo menos mais cem brasileiros empregados", calcula Sakamoto, que prev? ainda mais demiss?es.
J?lio Nakazaki, 45 anos, da empreiteira Just One, conta que nunca foi t?o dif?cil encontrar vaga nas linhas de montagem das f?bricas de autope?as.
"Empregamos brasileiros h? 18 anos e sempre teve coloca??o. Agora, n?o tem nenhuma", revela.
A Just One tem, atualmente, 600 brasileiros nas fornecedoras de pe?as para a Toyota, na prov?ncia de Aichi. No m?s passado, eram mais de 700.
Com a falta de vagas nas empreiteiras, a sa?da encontrada por muitos foi procurar coloca??o nas ag?ncias p?blicas de emprego, chamadas de "Hello Work".
Somente na filial de Hamamatsu, regi?o que concentra cerca de 22 mil trabalhadores latinos, 635 estrangeiros foram atendidos em outubro, o dobro de setembro. Em novembro, a m?dia foi de 80 atendimentos di?rios a brasileiros e a previs?o ? de que o movimento aumente ainda mais.
A grande quantidade de m?o-de-obra parada tamb?m fez com que as poucas f?bricas que ainda est?o contratando se tornassem mais exigentes.
"Se antes, n?o exigiam o conhecimento da l?ngua japonesa, agora passaram a exigir. Se aceitavam pessoas de at? 55 anos, hoje, contratam somente quem tem at? 45", explica Marcos Sakashita, 41 anos, da empreiteira K.K. Toki, de Okazaki, prov?ncia de Aichi.
Os sal?rios tamb?m j? n?o s?o os mesmos. Um trabalhador do setor de autope?as, um dos que mais atrai os homens brasileiros, ganha por hora at? US$ 13. Agora, as vagas s?o em outras ?reas, como a de alimentos e hotelaria, e cujo valor por hora n?o ultrapassa os US$ 8.
"Quem quiser trabalhar vai ter de se contentar com o sal?rio mais baixo mesmo", lamenta Sakashita.