A Justiça dos Estados Unidos decidiu desbloquear cerca de US$ 500 milhões (R$ 877 milhões) do grupo Opportunity, de Daniel Dantas, que estavam congelados naquele país desde o começo do ano passado. Uma corte americana diz que os valores só podem ser bloqueados quando houver uma decisão definitiva da Justiça brasileira.
Opportunity nega acusação e não comenta Dantas, porém, não poderá movimentar os recursos. O juiz Marcelo Cavali, substituto da 6ª Vara Federal, onde corre o processo sobre o Opportunity, decidiu ontem que o banqueiro e seus sócios não podem movimentar os valores. Se mexerem, estão sujeitos a uma multa diária de R$ 1 milhão e, eventualmente, prisão preventiva.
O procurador da República Silvio de Oliveira pediu ao juiz para que os recursos continuem congelados porque entende que qualquer movimentação nos EUA significaria novos atos de lavagem de dinheiro. O juiz concordou. Os recursos desbloqueados fazem parte do Opportunity Fund, um fundo de investimento criado em 1992, e da Tiger Eye, uma conta que pertence a Dantas e a sua irmã Veronica.
O saldo da Tiger Eye é US$ 242 milhões (R$ 424,5 milhões), segundo documentos da Justiça dos EUA, valor similar ao que estaria no Opportunity Fund. O governo brasileiro conseguiu o congelamento nos EUA em janeiro de 2009. Alegava que o fundo e a conta de Dantas receberam recursos ilegais, enviados para os EUA por meio de doleiros.
O resultado do processo caracterizaria o crime de lavagem, segundo o pedido brasileiro. Uma corte de apelação do distrito de Columbia não entrou no mérito da investigação. O juiz federal Brett Kavanaugh diz que a lei americana não permite o congelamento de valores sem que haja uma decisão definitiva da Justiça brasileira. Foram dois votos favoráveis ao desbloqueio e um contra.
O Departamento de Justiça dos EUA estuda possíveis recursos, mas, em tese, a decisão é definitiva, já que resulta de uma apelação. No meio do ano passado, um juiz de primeira instância, John D. Bates, mandou desbloquear os valores. O governo americano recorreu e perdeu.
COMO ESTÁ O PROCESSO O processo sobre o Opportunity, alvo da Operação Satiagraha, não tem sentença nem em primeira instância no Brasil. Ele começou em julho de 2008, mas está parado desde setembro do ano passado no Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Duas varas da Justiça federal (a 2ª e a 6ª) reivindicam o processo, mas o TRF ainda não decidiu qual delas ficará com o caso.
O Judiciário brasileiro foi alvo de críticas do Gafi, órgão internacional de combate a lavagem de dinheiro, porque não produz sentenças definitivas sobre crimes financeiros. Desde 1998, o país tem só 11 sentenças definitivas sobre lavagem, segundo o Gafi.
O procurador Rodrigo de Grandis, que conduziu a investigação contra Dantas, diz que a decisão americana é extremamente grave e pode dificultar a cooperação internacional. "Sentença definitiva no Brasil é como dom Sebastião: esperamos há milênios", afirma, referindo-se ao rei português cuja volta é esperada desde o século 15.
Pedro Abramovay, secretário Nacional de Justiça, disse à Folha que o desbloqueio é "péssimo sinal" que os EUA enviam. "O mundo avançou no combate aos crimes financeiros após o 11 de Setembro [de 2001] porque os EUA criaram um ambiente de cooperação internacional", afirma. "Sem o bloqueio de ativos, esse ambiente fica minado." Antes do desbloqueio americano, o governo brasileiro contabilizava US$ 3 bilhões congelados no exterior.