Este ano, o Brasil está vivenciando uma situação incomum: uma safra recorde, uma diminuição nos preços das commodities agrícolas e uma desinflação global estão conduzindo a uma redução nos preços dos alimentos, algo que não ocorria desde 2017. De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que avalia o custo dos produtos para famílias com renda de um a cinco salários mínimos, os preços no grupo alimentação no domicílio apresentaram uma média de 2,4% de queda no acumulado até novembro.
O INPC, que serve como um indicador do impacto das variações de preços dos alimentos nas populações de menor renda, registrou uma deflação de pouco mais de 1%, sendo as carnes 9,4% mais baratas e as aves e ovos, 6,8%.
Os economistas explicam que a safra recorde de grãos, incluindo soja, milho e feijão, contribuiu para a oferta abundante desses produtos, impactando positivamente em outros itens da cadeia alimentar, como óleo de soja, carnes e frango. Além disso, os preços das commodities agrícolas, que haviam aumentado significativamente nos últimos anos, têm desacelerado, refletindo diretamente no consumidor.
"Acho que, de fato, a população de renda mais baixa teve um ano bem melhor do que os anteriores. O Bolsa Família voltou, e o salário mínimo teve um aumento real (acima da inflação) no começo do ano. E agora, no fim do ano, teve o Desenrola, ajudando a reduzir dívidas. Tudo isso ajuda", afirmou o economista Luiz Roberto Cunha, professor da PUC Rio, em reportagem do O Globo.
O INPC, que representa cerca de metade da população brasileira, funciona como um termômetro do impacto dessas mudanças nos preços dos alimentos nas famílias de menor renda, para as quais a alimentação é uma parte significativa do orçamento.
Para o Coordenador dos índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), André Braz, o menor custo dos alimentos foi a principal âncora da inflação este ano, permitindo um índice de 4,4% no ano, dentro da meta estabelecida pelo governo de até 4,75%.
"As famílias não comem mais, elas comem melhor. Além de poder comprar outras coisas que fazem falta no dia a dia", explica Braz ao O Globo, ao considerar que o óleo de soja, feijão-carioca, leite longa vida e frango devem terminar o ano com preço menor do que no ano passado, o que melhora a qualidade da alimentação.
"Na parte de proteína, estimamos queda de 9,4% nas carnes. O preço de aves e ovos deve cair 6,8%. Muitos itens na alimentação perderam força, e alguns entraram em deflação", explica Fábio Romão, economista sênior da LCA Consultores, ao O Globo. Ele informou que além da supersafra de grãos, produtos in natura, como batata, cebola e frutas, subiram bem menos do que em 2022.
Pespectivas para 2024
Embora o ano de 2023 traga um alívio nos preços dos alimentos, os especialistas alertam que essa redução não anula os aumentos observados nos anos anteriores, continuando a ser mais cara do que antes da pandemia. A perspectiva para 2024 aponta para um cenário menos favorável, com o fenômeno climático El Niño.
Braz afirma que o El Niño deve atrapalhar a safra do ano que vem, mas seus efeitos podem ser atenuados caso o volume de chuvas seja maior e mais regular. Mas a tendência é que as altas temperaturas perdurem até meados de abril de 2024, afetando o ciclo de plantio das culturas de soja e milho. Como resultado, há o repasse para os preços de óleo de soja, carnes, frangos e ovos, já que essas commodities são a base da alimentação na pecuária e na avicultura.
"Ano que vem não vai ser tão favorável, os alimentos vão voltar a subir. Espero uma queda de 1% para alimentos e bebidas em 2023. Para 2024, pode-se registrar uma alta de 4%, já embutido o risco do El Niño. Vai depender do rigor do fenômeno climático e do quanto ele vai prejudicar essa safra que ainda não foi plantada. Por isso, essa estimativa pode até subir", alerta Braz.
Outros preços que também pesam no orçamento das famílias que ganham menos podem compensar, contudo, o encarecimento dos alimentos. Segundo Romão, não é esperado aumento na tarifa de ônibus. Em ano eleitoral, os prefeitos evitam dar reajuste. Os remédios também devem subir menos, já que acompanham a inflação do ano anterior.
Com informações de O Globo