Ao deixar o mutirão dos endividados na quinta-feira passada, em São Paulo, onde esteve para renegociar os débitos e "limpar o nome", Alessandro Prata, 36, não entendia por que um dos bancos não ofereceu "condições favoráveis" para o pagamento.
"Sou cliente há 20 anos, mas o banco não analisou isso. Eles só valorizam quem tem mais poder aquisitivo. Estou decepcionadíssimo."
A indignação do vendedor é a mesma de muitos usuários do sistema financeiro que, nas últimas semanas, estiveram em bancos públicos e privados em busca de taxas de juros mais baixas em diversas linhas de crédito.
Ocorre que, em razão dos critérios usados pelas instituições para analisar o perfil de endividamento e o risco de calote de cada cliente, são poucas as pessoas que, de fato, conseguem se beneficiar das menores taxas.
Entre as características dos tomadores de crédito avaliadas pelos bancos estão: salário, idade, empregabilidade, comprometimento da renda com dívidas, volume de investimentos na instituição e histórico de pagamentos (se já passou cheque sem fundos ou atrasou prestações).
O cliente que tem mais de 30% da renda comprometida com dívidas costuma ser visto como de alto risco.
O banco tem modelos estatísticos que analisam, por exemplo, a probabilidade de um cliente que deu cheque sem fundos há dez anos ficar inadimplente hoje. "É uma chance pequena, mas, se ele fez isso há um ano, a probabilidade costuma ser maior", disse Maria Dolores Oliveira, diretora de modelos analíticos da Boa Vista Serviços.
Segundo ela, uma informação bastante importante é se ocorreram diversas consultas de crédito em um período curto -significa que o cliente procurou recursos em diferentes bancos e lojas.
Além disso, a instituição considera quais são as chances reais de o cliente conseguir tratamento melhor na concorrência. Se o cliente recebe o salário em outra instituição ou tem investimentos na concorrência, o banco pode decidir oferecer mais vantagens para retê-lo -se o perfil dele interessar, claro.
NEGATIVO
Ricardo Loureiro, presidente da Serasa Experian, empresa de informações financeiras, afirma que um dos problemas no Brasil é a ausência de dados positivos compartilhados sobre o histórico de pagamento dos consumidores. Hoje, o banco analisa dados positivos disponíveis só em seu histórico.
"Até agora, os bancos e demais empresas de crédito acessam apenas informações negativas, sobre inadimplência, e não registros sobre os hábitos dos bons pagadores. Com a regulamentação do cadastro positivo [aprovado em 2011], os consumidores terão mais poder de barganha para exigir uma análise de crédito mais personalizada."
Loureiro afirma que, hoje, os bons pagadores são punidos com altas taxas de juros em razão do calote dado nas instituições financeiras pelos maus pagadores.