Homossexuais, cotistas, defensores de Direitos Humanos, colegas parlamentares, muita gente já foi alvo das declarações polêmicas do deputado federal Jair Bolsonaro (PP/RJ). Recentemente, até as mães entraram no seu rol de provocações. Em entrevista ao jornal gaúcho Zero Hora, o deputado disse que as mulheres deveriam ganhar salário menor porque engravidavam e prejudicavam o empresariado, devido a seu afastamento pela licença-maternidade. Por conta disso, nossa equipe foi procurar a mãe de Bolsonaro, para saber o que ela própria pensava das declarações destemperadas dele. Em certa ocasião, por exemplo, o deputado disse preferir que o filho morresse em acidente do que “aparecesse com um bigodudo”. E, a uma deputada, que não merecia ser estuprada porque era feia.
Dona Olinda Bonturi Bolsonaro completa 89 anos no fim do mês. Vive com uma filha em Miracatu, no Vale do Ribeira, a 137 quilômetros de São Paulo, para onde se mudou depois de deixar Eldorado, a 249 km da capital, cidade onde a família mantém quatro lojas de comércio. Comunicativa e amável, ela conversou depois que o próprio Jair foi avisado. Por telefone mesmo ele disse que havia sido mal interpretado sobre o fato de as mulheres terem de ganhar menos. Reclamou “porque quem paga a licença-maternidade são os empresários, depois abatem do INSS, só que, com isso, perdem produtividade”. Mas autorizou a entrevista com dona Olinda. Jair é o terceiro de seis filhos, três meninos e três meninas. Nem todas as lembranças dela são mais tão vívidas, embora disposição não lhe falte:
Dona Olinda, como a senhora criou o Jair?
Olinda Bonturi Bolsonaro: Com amor, muito amor. Não queria que fosse uma criança estúpida, bruta, falasse besteira. Dava comidinha na hora certa...
Ele era impetuoso?
O.B.B.: Era humilde, manso, filho maravilhoso, nunca encrencou em nada comigo. Uma beleza de filho (quase chorando), estou arrepiada de falar.
Nunca deu trabalho, nunca foi de brigar na rua?
O.B.B.: Nunca, era reservado, quieto, compreensivo (chorando), um filho mesmo maravilhoso.
Dava-se bem com os amigos?
O.B.B.: Brincava e jogava bola na rua, era estimado pelos coleguinhas. Procuravam ele em casa, tudo estava bem para ele. Mas era digno, não era de falar besteira.
O.B.B.: Não maltratei nunca um filho, nunca fiquei brava nem disse: “Vai apanhar”. Apanhar, não. A gente conversa com a criança.
Hoje seu filho fala coisas bastante duras, e acaba arranjando briga com muitas pessoas...
O.B.B.: Querem que ele fale mole, não é? Esse é o modo dele de falar. Fica irritado, então, fala do jeito dele, irritado. Mas é uma boa pessoa.
As críticas que fazem a ele não a incomodam?
O.B.B.: Não, eu conheço o filho que tenho.
Dona Olinda não se ressente com as perguntas. Mantém o jeito afável, receptivo. Percebe o embaraço do entrevistador (afinal, vai falar de estupro a uma senhora de 89 anos).
O.B.B.: Pode perguntar
Hoje seu filho fica brigando, agredindo com palavras. Houve o episódio com a deputada, disse que não merecia ser estuprada porque era feia...
O.B.B.: É o jeito dele. Era ele mesmo, não estava imitando ninguém. É a natureza dele.
Jair Bolsonaro fez carreira no Exército. Hoje, é capitão da reserva. Está no terceiro casamento, deu cinco netos à dona Olinda. “Quatro moços maravilhosos, e uma menina linda”, ressalta ela. O pai do deputado, Geraldo, era dentista prático, fazia todo o tratamento, mas não tinha diploma de faculdade. Quando Jair e os cinco irmãos nasceram, a família morava em Campinas. Geraldo resolveu mudar para o Vale do Ribeira, então lugar pobre, sem dentistas. Foram parar em Eldorado, caminho para o Paraná.
Renato confirma que nem sempre o deputado e o pai se deram bem. Acha isso natural para um relacionamento de pai e filho. “Meu pai tinha o estilão dele, boêmio”, continua ele, que é capitão da reserva do Exército, como o irmão famoso. “Mas nunca deixou um filho trabalhar, porque achava que filho tinha que estudar”. Era “uma pessoa dura”, conforme conta. “Enérgico. Não admitia que os filhos fizessem nada errado. Fumava e bebia, mas não permitia que fumássemos ou bebêssemos.”
Jair também é enérgico, chega a ter uma postura agressiva. “Ele tem o posicionamento dele, como político. Não tolera coisa errada.” Dá pancada nas pessoas... “Nós somos de formação militar, temos a disciplina consciente. Aquela retidão de procedimentos, de coerência, de não aceitar as coisas erradas. Se vemos uma fruta na beira da estrada, não pegamos porque não é nossa”, conta Renato.
Foi assim desde a infância, “mais rude, mais nervoso”, conta o amigo Cidenei Alves, policial militar aposentado. Naquela época, Eldorado tinha uma praça bonita, com a igreja matriz e um grande chafariz. “Brincávamos na fonte”, recorda o colega. Saíam para as fazendas das redondezas. “Pegávamos laranja, caçávamos passarinhos. Era diferente de hoje, não tínhamos maldade.” Na praça, também jogavam futebol. “Se alguém desse uma pegada nele, ficava bravo.” Jogava bem? “Ele era muito bom estudante, mas ruim de bola.” Adolescentes, ficavam conversando na praça até altas horas. “Não havia problema de segurança, dormia-se com as janelas abertas.” Nessa época, Jair ganhou um apelido: Palmito. “Era branco e comprido.” Não gostou nada. “Ficou meio bravo”.
Nessa época, ambos decidiram tentar a carreira militar. Em 1970, tropas do Exército chegaram a Eldorado atrás de Carlos Lamarca, que havia desertado e passado a comandar ações de guerrilha no Vale do Ribeira. “Ficávamos conversando com os militares, eles mostravam as armas.... Isso nos fascinava.” Jair ingressaria na Academia Militar das Agulhas Negras, no Rio. O que Cidenei acha das declarações fortes do amigo? “Não julgo ele, para não ser julgado. Vai do jeito dele.”