Sirenes não tocaram quando a Barragem 1 da Vale se rompeu em Córrego do Feijão,Brumadinho , em 25 de janeiro. Mas, desde então, soa em Minas Gerais com frequência jamais observada. Para especialistas, as sirenes são o som do medo dos técnicos das empresas de consultoria, que temem declarar a estabilidade das barragens de rejeito depois do desastre de Brumadinho. Não há uma cascata de barragens subitamente em risco, mas sim uma mudança na conduta das empresas contratadas para avaliar a segurança.
A emergência é anunciada por determinação da Agência Nacional de Mineração (ANM) quando uma barragem tem a declaração de estabilidade negada pela empresa independente contratada para emiti-la. Na semana passada, sirenes tocaram quando o nível máximo de emergência, o 3, foi acionado pela Vale na barragem B3/B4, em Nova Lima. A emergência também foi declarada nas barragens de Forquilhas 1 e 2, em Ouro Preto. Na semana anterior, o nível máximo de risco foi atingido no reservatório Sul Superior, em Barão de Cocais. Todas são da Vale.
E as sirenes vão continuar a soar em Minas à medida que mais declarações de estabilidade precisarem ser renovadas e forem negadas, afirma Carlos Barreira Martinez, professor de segurança de barragens das universidades federais de Itajubá e de Minas Gerais.
— As barragens não se tornaram nem mais nem menos perigosas agora. Mas, após a prisão dos técnicos envolvidos com Brumadinho, os profissionais da área temem se comprometer e, acredito, quase todas serão reprovadas — enfatiza Martinez.
A maioria das barragens de rejeito data das décadas de 1970 e 1980, mas vários reservatórios sofreram alterações nos últimos anos devido à pressão por mais minério e o aumento das exportações. Com isso, as barragens foram sendo alteadas para receber mais rejeito, o que elevou o risco em potencial.
Foi o caso da Barragem de Fundão, da Samarco, controlada pela Vale e a BHP Billiton, e que se rompeu em Mariana, em novembro de 2015. Para o engenheiro Joaquim Pimenta de Ávila, consultor de segurança em barragens e que se tornou testemunha-chave no caso do rompimento de Fundão, não há uma epidemia de barragens na iminência de romper.
— A tragédia de Brumadinho fez com que consultores e a Vale passassem a temer um novo desastre. A emergência 3 não significa que uma barragem se romperá naquele momento, e sim que ela oferece perigo elevado. Mas agora ninguém quer se comprometer — diz ele.
Ávila projetou Fundão e relatou à Polícia Federal, em 2016, que seu projeto havia sido alterado pela mineradora. Ele havia alertado a Samarco sobre o risco de rompimento um ano antes do desastre.
O engenheiro acrescenta que, depois de Brumadinho, a ANM também mudou as regras e tornou o processo mais rigoroso. As inspeções passaram a ser semestrais. E uma empresa não pode mais declarar a estabilidade com ressalvas. Ou aprova ou reprova, sem meio-termo. Ainda assim, a própria ANM tem somente três engenheiros em Minas para fazer a fiscalização das 218 barragens de mineração inseridas na Política Nacional de Segurança de Barragens. Segundo a agência, “com o corpo técnico atual (três engenheiros), foram vistoriadas, em 2018, 68 barragens, sendo que algumas destas mais de uma vez”.
— O medo agora impera — diz Ávila.
E o medo não é só dos técnicos das empresas contratadas para emitir o laudo de estabilidade. É também das pessoas que vivem junto às barragens. Martinez estima que, no Quadrilátero Ferrífero, onde estão Grande Belo Horizonte e também a maioria das barragens, haja 200 mil pessoas junto a áreas com algum grau de risco.