A necessidade de ajudar a família e a impossibilidade de conciliar o trabalho infantil e os estudos unem as histórias dos analfabetos Rosa, Gilson e Armando, localizados pela Folha numa mesma rua no centro do Recife.
Rosa Mendes, 63, vive sentada num pedaço de papelão, pedindo dinheiro na porta da Capela Dourada, no centro da capital pernambucana. Nasceu no interior da Paraíba, mas não lembra o nome da cidade nem quando chegou ao Recife. Nunca estudou.
Com dificuldade para formar frases, diz que começou a trabalhar aos nove anos e por isso nunca entrou numa sala de aula. "Fazia faxina, tinha que trabalhar", disse, sem autorizar uma fotografia.
Começar a estudar não está nos planos de Rosa. "Dá tempo mais não. Nunca tive cabeça para estudo. Não estudei mais nova, agora é que não estudo", afirmou.
Questionada sobre se a vida poderia ser diferente se soubesse ler e escrever, disse: "Sei lá".
Próximo a Rosa, também no centro do Recife, está o flanelinha Gilson do Nascimento. Ele não sabe a idade, nasceu em Olinda (PE), e o máximo de tempo que passou na escola foram dois meses.
"Não leio nem escrevo nadinha. Tinha vontade de aprender, mas só tem [escola] pagando", disse.
Já o comerciante Armando Marques, 43, que parou de estudar na segunda série para trabalhar, sabe ao menos escrever o nome de batismo.
"Ainda sinto falta [dos estudos]. Perdi muita oportunidade na vida por falta de estudo", disse o comerciante. "Mas eu me informo. Assisto televisão, e minha esposa lê jornal para mim", afirmou.
Mesmo analfabeto, virou um microempreendedor. Entrega pizzas e acabou de comprar uma barraca de coco em frente a um prédio desativado em que funcionará a seccional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
"Nunca me passaram a perna porque sou sabido, sou inteligente", diz Marques, que garantiu estudo aos seus quatro filhos e diz acreditar que agora é possível conciliar trabalho e escola.
"Vou abrir outros horizontes. Não vou mais depender de ninguém para assinar um cheque, para ler para mim", disse o comerciante.
ANALFABETISMO
Pela primeira vez em 15 anos, a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade aumentou no país, interrompendo uma tendência de queda contínua que se acelerou principalmente desde o fim dos anos 90.
O percentual foi de 8,6% para 8,7% entre 2011 e 2012, com um contingente de 13,2 milhões de analfabetos no país, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) foram divulgados nesta sexta-feira (26) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).