Estudos acham mutação que pode deflagrar leucemia infantil

Foi esse segundo tipo, menos comum e mais letal (só 60% dos pacientes infantis se curam), que os pesquisadores do Boldrini estudaram

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Um "interruptor" celular ativado por engano pode estar por trás de parte dos casos do pior tipo de leucemia a atingir crianças --a que ataca as células de defesa conhecidas como linfócitos T.

Num trabalho de detetive molecular, uma equipe internacional de pesquisadores, liderada por um grupo de Campinas (SP), mapeou os passos que levam de uma alteração no DNA à origem da doença. E já mostrou, em laboratório, uma possível estratégia para destruir as células afetadas pela leucemia.

O resultado sairá em edição futura da revista científica "Nature Genetics". Embora nem de longe resolva o problema da maioria das crianças com leucemia, os achados podem abrir caminho para tratamentos mais certeiros e individualizados.

"É uma forma mais precisa de caracterizar a doença", afirma José Andrés Yunes, pesquisador do Centro Infantil Boldrini, hospital de Campinas dedicado ao tratamento de cânceres e doenças do sangue de crianças. Yunes foi um dos coordenadores do estudo, junto com João Barata, da Universidade de Lisboa.

TERÇO

A mutação estudada pelos pesquisadores parece ser um dos eventos desencadeadores da leucemia linfoide aguda, doença que corresponde a um terço dos cânceres infantis no mundo.

Os dois tipos básicos da doença afetam os linfócitos B (células que produzem anticorpos) e os linfócitos T (atacam e destroem células infectadas por vírus).

Foi esse segundo tipo, menos comum e mais letal (só 60% dos pacientes infantis se curam), que os pesquisadores do Boldrini estudaram.

Na doença, uma forma imatura dos linfócitos se multiplica muito além de conta. "Essas células naturalmente precisam proliferar para defender o organismo, mas nesses casos elas tomam o lugar de outras células importantes", afirma Yunes.

Falando com leve sotaque, que mantém apesar de ter deixado a Argentina, seu país natal, aos 12 anos, o cientista compara a mutação que ajudou a identificar a um motor que está sempre ligado --e que ligou a si mesmo.

O motor, no caso, é o receptor (o "ponto de encaixe" bioquímico) da molécula interleucina-7.

Normalmente, a interleucina-7 funciona como sinalizador para o bom desenvolvimento do sistema de defesa do organismo.

Contudo, o grupo verificou que, em 10% das crianças com leucemia das células T, o receptor da interleucina-7 estava alterado, a ponto de não precisar mais de sua substância ativadora para ficar na posição "ligado".

E isso era uma péssima notícia, porque a presença do receptor alterado favorecia a multiplicação das células e as tornava virtualmente imortais --duas das características-padrão de qualquer câncer, incluindo a leucemia.

LEUCEMIA ROEDORA

Bastou injetar células com o receptor alterado em camundongos para que eles desenvolvessem algo muito parecido com a leucemia humana, dizem os cientistas.

A boa notícia, porém, é que os pesquisadores conseguiram usar drogas que inibem as consequências bioquímicas da ativação perpétua do receptor para produzir a morte das células alteradas.

"É claro que a mutação no gene do receptor não deve ser a única causa da leucemia. Nunca há uma só alteração", lembra Yunes. Mas, na fração de pacientes com essa modificação, dá para pensar em atacar diretamente uma das fontes do problema, em vez de depender da ação menos precisa da quimioterapia.

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