Mãe do bebê sequestrado na sexta-feira à noite em Saquarema, a dona de casa Gabriela Pereira, de 18 anos, conta que tomou conhecimento de que se tratava de um sequestro quando foi até a delegacia prestar depoimento sobre o crime. Humilde, ela não podia imaginar que seria vítima desse tipo de ação.
? Eles me ligaram,dizendo que tinham achado o meu filho. Eu só queria chegar o mais rápido possível, para vê-lo e pegá-lo no colo de novo ? disse Gabriela, pouco antes de reencontrar seu bebê.
Ela contou como a casa de seus pais foi invadida pelos sequestradores.
? Estava na casa da minha mãe quando entraram dois bandidos armados, pedindo o meu filho e dizendo que iriam levá-lo. Segundo eles, um homem, que identificavam como Marcelo, estava devendo R$ 2 mil ao tráfico. Mas não conheço nenhum Marcelo. Eu tentei segurar meu bebê. Mas um deles disse: ?Ou você me dá o seu filho ou eu estouro a cabeça de vocês dois?. Entrei em desespero, não tive escolha.
Gabriela afirma que vivenciou os momentos mais angustiantes de sua vida. Mas, apesar do sofrimento, afirma que nunca perdeu a esperança de recuperar o filho.
? Nunca deixei de acreditar nisso. Se não encontrasse o meu filho de novo, a minha vida iria acabar. Passei duas noites sem dormir e sem me alimentar direito ? contou.
Seus planos, agora, são aproveitar o tempo ao lado do filho:
? Fui do inferno ao céu em menos de dois dias. Recuperei a felicidade.
A trama digna de novela teve final feliz. O bebê recém-nascido que havia sido sequestrado foi devolvido no domingo à família. O desfecho foi surpreendente. Ao prender o acusado do crime, Altair Ferreira dos Santos, a polícia descobriu que ele era figura conhecida no meio político da região e assessor parlamentar do presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Paulo Melo.
O drama começou quando a família se preparava para começar uma vida nova. O caminhoneiro Rodrigo Francisco dos Santos, de 28 anos, e a mulher, Gabriela Sabino Ferreira, de 18, tinham deixado São Gonçalo, onde moravam, para ter o primeiro filho do casal perto de seus familiares.
Os planos foram interrompidos de forma súbita. Gabriela, que dera à luz o pequeno Gustavo há apenas quatro dias, estava com ele no colo na casa dos pais, em Bacaxá, distrito de Saquarema. Todos se preparavam para dormir, quando dois homens encapuzados e armados invadiram o imóvel, na Rodovia Amaral Peixoto. Eles apontaram uma arma para a cabeça de Gabriela, obrigando-a a entregar a criança.
? Ou você me dá o seu filho ou eu estouro a cabeça de vocês dois ? ameaçaram.
Antes, ainda destruíram um dos cômodos da casa. Era apenas o início do pesadelo porque, logo depois, levaram o bebê, ignorando as súplicas do pai:
? Não devo nada a ninguém, sou trabalhador. Só quero o meu filho.
Acusados são presos em flagrante
Por trás da ação, haveria uma história sustentada por mentiras e movida por ambição. O assessor parlamentar Altair, de 48 anos, e a mulher dele, Gessica Paulino Marinho, de 20, sustentavam a existência de uma gravidez, embora ela tivesse perdido um bebê aos três meses de gestação. Gessica estaria usando uma barriga falsa para que ninguém soubesse do ocorrido. A polícia investiga a suspeita de que a fraude tinha como objetivo enganar o pai adotivo dela, um fazendeiro rico de São Paulo, que havia prometido R$ 500 mil de presente quando o neto, seu herdeiro, nascesse.
Uma coincidência, segundo a polícia, fez do pequeno Gustavo a vítima perfeita para o casal. Além de assessorar o presidente da Alerj, Altair era administrador do Hospital Nossa Senhora de Nazareth, em Bacaxá, onde Gabriela teve o filho. De acordo com a investigação, o assessor parlamentar se valeu de informações privilegiadas sobre o menino. Gustavo nascera de cesariana na última terça-feira, às 18h, com 3,850 quilos e 51 centímetros.
Como o bebê ficou em observação no hospital até quinta-feira, Altair, ainda na versão da polícia, teve tempo para planejar o sequestro, com a ajuda de dois homens. Um deles seria chefe do tráfico de drogas do Morro do Castro, em São Gonçalo. Ele teria uma dívida de gratidão com Altair, que teria conseguido para o bandido atendimento médico no hospital onde trabalhava, há cerca de sete meses. Mas os investigadores têm informações de que nem toda a parte operacional foi delegada pelo administrador.
Ele próprio teria dado cobertura aos sequestradores, permanecendo do lado de fora do imóvel durante todo o tempo.
Com o sequestro, começaram dias de grande aflição. Ontem, poucas horas antes do desfecho do caso, a família e a população local estavam mobilizadas. Com cartazes, parentes tomaram a Praça de Bacaxá, pedindo empenho da polícia. A tia do bebê, Marina Sabino Ferreira, de 28 anos, contou que, no momento em que os sequestradores apareceram, ajudava Gabriela a cuidar do bebê.
? Estou trêmula até agora ? disse. ? Gabriela só faz chorar e pedir o filho dela de volta. Ela está com os seios cheios de leite para amamentar o filho e não pode fazer isso.
Logo depois, mais uma vez junto com familiares numa vigília na porta da 124 DP (Saquarema), onde se investigava o crime, Marina tomou conhecimento do fim do sequestro:
? Estamos muito felizes!
Ontem à tarde, depois de receberem uma denúncia anônima, policiais do 25 BPM (Cabo Frio) acharam Gustavo numa casa com Altair e Gessica. O casal foi preso em flagrante por sequestro e cárcere privado. Eles também foram indiciados por formação de quadrilha.
? Foi um crime que chocou e mobilizou a nossa equipe, que ficou em prontidão para localizar a criança. Além de policiais, também somos pais de família ? disse o delegado Luciano Coelho dos Santos.
Depois de recuperarem o filho, Rodrigo e Gabriela foram recebidos com festa pelos vizinhos. O bebê foi tratado como celebridade. Um coro repetia seu nome. Rodrigo disse que, depois de tanta atribulação, o seu maior desejo era descansar:
? Só quero colocar o sono em dia. Foi um susto tremendo, mas Deus nos deu a vitória. Pensei que o mundo ia acabar, mas é um grande alívio ter meu filho de novo em casa.
Por meio de nota, o presidente da Alerj, Paulo Melo, lamentou o episódio, que classificou de insano, e afirmou que vai exonerar Altair. No texto, o deputado afirma que está extremamente decepcionado com o assessor, ?cidadão conhecido por todos na cidade?. Para o parlamentar, foi um ato ?covarde e brutal?. A expectativa dele, ainda segundo a nota, é que ?a Justiça atue com o rigor da lei?.