Sob aplausos de amigos e parentes e cânticos religiosos, Palmerina Pires Ribeiro, de 80 anos, que morreu após ter recebido, por engano, café com leite na veia, pela sonda errada, foi enterrada na manhã desta terça-feira (16) no cemitério Vila Rosali, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Ela deixa 16 filhos, trinta netos e doze bisnetos.
Revoltados, familiares e amigos não se conformam com o atestado de óbito, que não específica a causa da morte da idosa, ocorrida no último domingo, no Posto de Atendimento Médico (PAM) de São João de Meriti. A filha Zilma Ribeiro, que é agente de saúde no Rio, exibiu o documento onde aparecem como causadores da morte de Palmerina infecção urinária, infecção pulmonar e uma doença não identificada.
"Que doença é essa que aparece como XXX,no atestado? Isso é um absurdo. Minha mãe estava prestes a deixar o hospital. Já estava com o pulmão limpo e a urina límpida. Estava só terminando a sequência do antibiótico para ir para casa", reclamou a filha, que confundiu os símbolos usados para finalizar a frase do atestado de óbito com a falta de uma explicação sobre a doença declarada no documento.
Parentes suspeitam ainda que, além da injeção de café com leite na veia, Palmerina tenha sido vítima de excesso de medicamentos. Zilma contou que a diretora do PAM teria informado que tinham aplicado na paciente uma determinada substância para tentar reverter os danos causados pela injeção errada.
"Esse medicamento, segundo a médica, não era o ideal. Ele foi aplicado. Mas logo depois, ela disse que tinha encontrado um outro medicamento mais indicado e que ele tinha sido injetado na minha mãe. Se isso aconteceu, minha mãe pode ter morrido por excesso de medicação", disse Zilma.
A filha Loreni, que estava com Palmerina no hospital, diz que viu tudo e não se conforma com o descaso dos responsáveis do posto de saúde.
"Não tenho dúvidas de que era café com leite, que a estagiária injetou na minha mãe. Enquanto tiver olhos para ver e boca para falar vou dizer isso. Foi mais de meio copo de café com leite. Os médicos já reconhecem que houve erro, mas o atestado de óbito não mostra nada", disse Loreni indignada.
Os parentes acusam uma estagiária pelo erro no procedimento. Durante o velório e o enterro, parentes e amigos de Palmerina exibiram cartazes de protesto contra a morte da idosa.
"Isso é um absurdo, quem vai trazer minha avó de volta? Ninguém faz nada, ninguém nos dar uma satisfação, ninguém do hospital sequer respeita a dor da nossa família. Minha avó era uma senhora muito querida e amada. Isso é um grande descaso", relatou um dos netos da vítima, Gilberto Ribeiro, de 36 anos, que acrescentou ainda que no momento em que o procedimento foi realizado, a estagiária estava sem supervisora.
"Minha tia estava com ela e disse que na hora em que a estagiária foi aplicar o café com leite na sonda, não havia nenhuma enfermeira supervisora por perto. Aí em vez de ela colocar o café na sonda do nariz, que iria direto para o estômago da minha avó, ela colocou o alimento na sonda que levou o café para a veia e minha avó morreu", completou.
Segundo uma das filhas de Palmerina, Ilma Ribeiro, a mãe ficou internada com suspeita de pneumonia durante 10 dias no Hospital de Saracuruna, também na Baixada. Em seguida, ela apresentou uma melhora e foi para casa. No entanto, no dia seguinte, a idosa passou mal novamente e foi encaminhada para o PAM de São João, de onde, segundo os filhos, ela receberia alta nesta segunda.
Procurada pelo G1, em nota, a Prefeitura de São João de Meriti informou nque uma sindicância foi aberta para esclarecer o caso e que a estagiária e as enfermeiras supervisoras foram afastadas de suas funções.
Na quarta-feira (10), uma outra idosa, de 88 anos também morreu após uma enfermeira injetar sopa em sua veia. O caso ocorreu em Barra Mansa, na Região Sul Fluminense. No mesmo dia, o Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu uma sindicância para apurar o ocorrido.
O Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (COREN- RJ) vai entrar na justiça, nesta terça-feira (16), para obrigar as duas unidades de saúde ( de São João de Meriti e Barra Mansa) a fornecerem toda a documentação referente ao óbitos.
Leia a íntegra da nota enviada pela Prefeitura de São João de Meriti
"A Prefeitura de São João de Meriti, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, informa que está sendo aberta sindicância administrativa para esclarecer o caso e que tanto a estagiária técnica de enfermagem, como as enfermeiras supervisoras de estágio e de plantão na unidade de saúde foram afastadas de suas funções. Os responsáveis pelo erro serão punidos exemplarmente e deverão também responder a inquérito aberto na 64ª DP (Vilar dos Teles)".