O brasileiro Alexandre Lopes foi anunciado nesta quinta-feira (17) como um dos quatro finalistas ao prêmio de melhor professor dos Estados Unidos. A premiação anual inclui um processo de seleção com diversas etapas, Lopes, de 44 anos, dá aulas para crianças de três a cinco anos em turmas de educação inclusiva na escola Carol City Elementary, na Flórida. Natural de Petrópolis, no Rio de Janeiro, ele emigrou para os Estados Unidos em 1995.
O anúncio foi feito na tarde desta quinta-feira pelo Conselho de Chefes de Departamentos de Escolas Estaduais, uma organização sem fins lucrativos que reúne os secretários de educação dos estados americanos. Lopes afirmou, em seu perfil do Facebook, que recebeu a notícia com "orgulho e felicidade", e aproveitou para agradecer aos amigos pelo apoio. "Sou-lhes eternamente grato", disse ele.
O professor brasileiro, que é o quarto representante consecutivo da Flórida entre os finalistas, agora concorre com três professores do ensino fundamental II e ensino médio dos estados de Washington, Maryland e New Hampshire, que dão aulas de química, física, inglês e música.
Os quatro participarão de um encontro na capital dos Estados Unidos em abril, quando o anúncio do grande vencedor será feito em um evento na Casa Branca.
Desde julho, quando foi eleito o melhor professor da Flórida e passou a integrar o grupo de 50 competidores da etapa nacional, Lopes tem viajado pelo estado onde mora dando palestras para outros professores sobre sua metodologia na sala de aula e entrevistas a diversos meios de comunicação americanos. Doutorando da Universidade Internacional da Flórida, ele se especializou na educação especial para a primeira infância e, há oito anos, trabalha na escola Carol City Elementary, em Miami.
"Inclusão total e irrestrita"
As turmas para as quais o brasileiro leciona são heterogêneas. Parte dos alunos é autista e, como a Carol City Elementary fica em uma região de baixo poder aquisitivo, a maioria dos estudantes pertence a minorias dentro da sociedade americana. Alguns ainda são filhos de imigrantes e não têm o inglês como idioma nativo.
"É uma inclusão total e irrestrita, da maneira que eu gosto, com alunos deficientes, imigrantes, minorias... Como eu acho que a sociedade deveria ser", conta. Lopes considera sua abordagem "holística" e afirma que se envolve em todos os aspectos da vida de seus "aluninhos", como gosta de se referir às crianças que ensina, tanto da parte acadêmica quanto da emocional e da social. Para o brasileiro, isso significa incluir todos os membros mais próximos da família no processo escolar, muitos deles ainda se adaptando à notícia de que seus filhos são autistas.
Aceitando a diversidade
Na sala de aula do brasileiro, porém, todos são iguais. "Eu não diferencio meus alunos. Procuro ser consistente para fazer com que meus alunos com autismo tenham os outros como modelo, e para fazer com que meus outros alunos aceitem todas as diferenças que existem na nossa sociedade", explica Alex, como é conhecido pelos alunos e colegas de trabalho. Suas técnicas variam de acordo com o conteúdo das aulas. Segundo ele, música e dança são dois elementos que predominam durante as atividades, mas a adoção da tecnologia também ajuda os pequenos estudantes a se expressarem.
Entre os equipamentos está uma tela que reproduz, ao toque de um botão, mensagens pré-gravadas na voz dele ou de um estudante. O instrumento é usado pelos alunos autistas para que eles possam comunicar o reconhecimento dos símbolos, um processo que, segundo Lopes, acontece nestas crianças de maneira diferente das demais.
Para aprender a construir palavras, os aluninhos usam blocos de madeira que representam cada letra e os unem e separam para formar sílabas, sempre atentos aos sons das palavras para compreender a relação entre as rimas e a formação das palavras com grafia parecida. "Isso serve para tirar a palavra do abstrato e torná-la uma coisa concreta, o que é muito importante para crianças com deficiência", explica.
Alexandre também digitaliza as páginas de livros, ocultando as frases escritas para reescrever a história a partir das imagens de forma coletva e, assim, conseguir tirar das crianças a linguagem construída durante as demais atividades.
A imigração, o atentado e a mudança
O início da vida adulta de Lopes não poderia ser mais distante de seu cotidiano atual, trabalhando sete horas por dia, cinco dias por semana, com um intervalo de 30 minutos para o almoço. No início da década de 1990, o hoje melhor professor da Flórida trocava Petrópolis pela capital fluminense para estudar produção editorial na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Naquela época, ele havia abandonado o sonho de criança de ser professor, já que sempre ouvia relatos de como a carreira exigia muito e pagava pouco.
Ele conta que arrumou um emprego na Pan American Airways para pagar o aluguel no Rio de Janeiro. Depois de formado, o então bacharel se apaixonou e decidiu se mudar para os Estados Unidos em julho de 1995. "Mas eu jamais deixei o Brasil. A vida me trouxe aos Estados Unidos, mas tenho muito orgulho da minha origem e de ser quem sou", diz.
Durante vários anos, Lopes seguiu trabalhando como comissário de bordo para várias companhias aéreas americanas, onde fazia traduções de inglês, português e espanhol nas rotas da América Latina. Mesmo com os benefícios e as muitas viagens que pôde fazer pelo mundo, ele afirma que sentia falta de estudar. "Eu queria algo que fosse um pouco mais recompensador, mas era difícil porque tinha que pagar as minhas contas", lembra.
Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, sua empresa ofereceu pacotes de benefício a quem aceitasse se afastar do emprego e abrir mão do salário. Lopes, já com mais de 30 anos de idade, aproveitou a chance para buscar uma nova formação. Segundo ele, sua ideia original era se tornar professor de línguas estrangeiras, mas uma conselheira vocacional sugeriu, além do curso de educação, um curso introdutório em educação especial na primeira infância.
"Me apaixonei pela área e minha professora se apaixonou pelo meu trabalho. Ela me recomendou para uma bolsa de mestrado na Universidade de Miami", explica o professor, que foi aprovado no processo seletivo com bolsa integral e, assim que completou seus créditos e estágios obrigatórios, recebeu o convite para iniciar uma turma de educação inclusiva na Carol City Elementary, onde está desde 2005, com um salário mais baixo do que recebia quando era comissário de bordo.
Lopes agora equilibra o trabalho com a pesquisa de doutorado na Universidade Internacional da Flórida, onde também foi selecionado para estudar com bolsa integral, e o Projeto Rise, uma iniciativa americana em nível federal que estimula a formação continuada de professores de escolas com população carente no país.
Eleito entre mais de 180 mil docentes
Durante mais de seis meses, Lopes passou por uma série de longas e trabalhosas etapas para conquistar o título de melhor professor de toda a rede estadual da Flórida. O processo começou com uma votação entre os próprios colegas da escola em que ele trabalha, na região centro-norte do condado de Miami, o quarto maior dos Estados Unidos, com 25 mil docentes. Ele então preparou um material por escrito com dezenas de páginas, no qual explicava sua filosofia educacional, suas motivações e sua metodologia de ensino.
O documento foi avaliado na sua região e ele foi selecionado como um dos cinco finalistas, que receberam visitas em suas salas de aula de uma comissão com 13 examinadores e participaram de entrevistas. Lopes venceu a disputa e, no início do ano, passou a concorrer ao posto de melhor professor do condado. O resultado, também favorável ao professor petropolitano, saiu em fevereiro deste ano, junto com um carro 0 km, prêmios em dinheiro e uma bolsa de estudos, à qual ele abriu mão por já ter uma no doutorado.
A etapa estadual, que tem patrocínio da rede de lojas de departamento Macy"s, exigiu novos artigos, visitas à sala de aula e entrevistas, além do envio de um vídeo apresentando o trabalho na escola e um encontro de três dias na cidade de Orlando com os mais de 70 professores dos condados e distritos especiais da Flórida.
Na entrevista final, o brasileiro lembrou aos examinadores que, naquele dia de junho, o planeta Vênus estava transitando em frente ao Sol, um fenômeno que só se repetirá daqui a um século. "Eu disse a eles que, quando isso acontecer, eu não vou estar mais aqui, meus aluninhos não vão estar mais aqui, mas a sociedade ensinada por eles e pelo meu ensino, sim. Depois disse a mim mesmo: "que resposta mais tola!" Voltei para casa achando que não venceria", afirmou.
Lopes estava errado, e seu nome foi anunciado como melhor professor do estado na última quinta-feira. Assim como as exigências da competição, as recompensas da etapa estadual também são maiores, e incluíram surpresas e um prêmio de US$ 5 mil (mais de R$ 10 mil) aos cinco finalistas, além de US$ 10 mil (mais de US$ 20 mil) ao grande vencedor.
A fama, o dinheiro e as regalias que tem recebido nos últimos meses, porém, são honras menores para ele. "Eu tive uma vida muito feliz, de muitas alegrias. Mas as alegrias que eu encontro com o sucesso dos meus alunos não se comparam com nada que eu já experimentei", afirmou Lopes, que diz ter uma admiração especial pelos pais de alunos com deficiência. "Essas crianças são filhas desses indivíduos, mas elas também são parte da nossa sociedade, é injusto que deixemos esses pais sozinhos com o grande desafio que enfrentam."