Na aula de matemática da nona série, da professora Li Zhen, o exercício da manhã era de geometria. Os alunos da escola afiliada à Faculdade de Formação de Professores Jing"An foram solicitados a explicar o tamanho relativo de formas geométricas usando o teorema dos paralelogramos de Euclides.
"Quem pode me dizer como demonstrar que duas linhas são paralelas sem usar um segmento proporcional?", perguntou Li a cerca de 40 alunos sentados numa sala de aula lotada.
Um a um, uma série de estudantes desta escola pública de médio porte levantou a mão. Quando Li os chamou, cada um se levantou, formalmente, de suas carteiras e em geral responderam corretamente. Eles só retornaram aos seus lugares quando a professore os mandou sentar.
Educadores afirmam que essa abordagem disciplinada ajuda a explicar o anúncio, em dezembro do ano passado, de que 5.100 alunos de 15 anos de Xangai tiveram resultados melhores em comparação a estudantes de cerca de 65 países, num exame internacional da OCDE que avaliou a competência dos alunos em matemática, ciência e leitura.
Os estudantes americanos ficaram entre 15º e 31º lugar nas três categorias. A França e o Reino Unido também tiveram desempenho fraco. Especialistas disseram que é complicado comparar notas de alunos de países e cidades de tamanhos diferentes. Também argumentaram que as notas de Xangai não eram representativas da China, já que está cidade de 20 milhões de habitantes em franco crescimento é relativamente rica. Mesmo assim, ficaram impressionados pelas altas notas dos alunos de Xangai.
Os resultados foram encarados como mais um sinal da crescente competitividade da China. A posição dos Estados Unidos é um "alerta", disse Arne Duncan, secretária de educação.
Embora essa seja a primeira vez em que a China participa do exame, que foi administrado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, com base em Paris, os resultados reforçaram a reputação do país de produzir estudantes com sólidas habilidades de matemática e ciências.
Muitos educadores também se surpreenderam com as altas notas dos alunos chineses em leitura, que media a proficiência dos estudantes em seu idioma nativo.
Os alunos de Xangai tiveram um bom desempenho, dizem especialistas, pelo mesmo motivo de outros estudantes da Ásia - incluindo Coreia do Sul, Cingapura e Hong Kong: seus sistemas educacionais se apoiam em disciplina, ensino à distância e preparação obsessiva para exames.
Alunos de escolas públicas de Xangai muitas vezes permanecem na escola até as 16h, assistem pouco à televisão e são proibidos, pela legislação chinesa, de trabalhar antes dos 16 anos.
"Muito raramente as crianças de outros países recebem um treinamento acadêmico tão intenso quanto nossas crianças", disse Sun Baohong, autoridade na área de educação da Academia de Ciências Sociais de Xangai. "Então, se o exame é de matemática ou ciências, não há dúvida de que os chineses vão ganhar a competição."
Porém, muitos educadores afirmam que a força da China na educação é também uma fraqueza. O sistema educacional do país é exageradamente orientado a exames, as escolas daqui reprimem a criatividade, e as pressões dos pais muitas vezes privam as crianças das alegrias da infância, argumentam.
"São dois lados da mesma moeda: as escolas chinesas são muito boas em preparar seus alunos para testes padronizados", escreveu Jiang Xueqin, vice-diretor da Escola de Ensino Médio da Universidade de Pequim, num artigo publicado no "Wall Street Journal" logo depois do anúncio dos resultados dos exames. "Por este motivo, a China é incapaz de prepará-los para a educação superior e para a economia do conhecimento."
Numa entrevista, Jiang disse que as escolas chinesas enfatizavam demais os exames, e produziam alunos pouco curiosos e sem pensamento crítico e independente.
"Isso cria alunos de visão limitada", afirmou. "Mas o que a China precisa agora é de empreendedores e inovadores."
Essa é uma queixa comum na China. Educadores sustentam que uma ênfase em exames padronizados explica, em parte, a escassez de novas empresas inovadoras na China. Executivos de empresas multinacionais com operações no país dizem ter dificuldades em encontrar gerentes intermediários capazes de pensar de forma criativa e resolver problemas.
De muitas formas, o sistema é um reflexo do passado confucionista da China. Aqui, espera-se que as crianças honrem e respeitem os pais e professores.
"A disciplina raramente é um problema", comentou Ding Yi, vice-diretor da escola afiliada Faculdade de Formação de Professores Jing"An. "O maior desafio é um aluno que nunca faz seu dever de casa."
Embora a qualidade dos alunos varie amplamente na China (escolas rurais muitas vezes não têm dinheiro suficiente, e os índices de evasão podem ser altos), escolas em grandes cidades normalmente produzem alunos com fortes habilidades em matemática e ciências.
Acredita-se que Xangai tenha o melhor sistema escolar do país, e muitos alunos aqui conseguem ser aceitos nas faculdades e universidades mais seletivas dos Estados Unidos.
Em Xangai, os professores devem ser certificados e passar por um mínimo de 240 horas de treinamento; professores dos níveis mais altos podem ter de se submeter a 540 horas de treinamento. Há um sistema de incentivos e pagamento por mérito, assim como os sistemas vigentes em algumas partes dos Estados Unidos.
"No pacote de remuneração de um professor, 70% é o salário básico", disse Xiong Bingqi, professor de educação da Universidade Xangai Jiaotong. "Os outros 30% são remunerações por desempenho."
Mesmo assim, os salários dos professores são modestos, cerca de US$ 750 por mês antes de bônus e descontos _ muito menos do que ganham contadores, advogados e outros profissionais.
Embora as escolas de Xangai sejam famosas por suas preparações para exames, os administradores daqui estão tentando ampliar os currículos e conceder mais liberdade aos distritos locais. A escola Jing"An, uma das cerca de 150 escolas em Xangai que participaram do exame internacional, foi criada há 12 anos para elevar os padrões numa área conhecida por escolas deficientes.
O diretor, Zhang Renli, criou uma escola experimental com menos ênfase em matemática e que dá às crianças mais tempo livro para brincar e experimentar. A escola organiza uma apresentação semanal de talentos, por exemplo.
O prédio da escola, com cinco andares, abriga a oitava e a nova série e fica num distrito central de Xangai. Os alunos usam uniformes amarrotados, as salas de aulas estão sempre cheias, e o almoço é trazido para a escola toda tarde.
Porém, a instituição de ensino, que funciona das 8h20 às 16h quase todos os dias, é considerada uma das melhores escolas da cidade.
Em Xangai, a maioria dos alunos começa a estudar inglês na primeira séria. Muitos estudantes da quinta à oitava série frequentam cursos extracurriculares depois da escola ou aos sábados.
Uma aluna da Jing"An, chamada Zhou Han, de 14 anos, contou participar de competições de escrita e discurso, além de estudar erhu, um instrumento chinês clássico.
Ela também tem um professor particular de matemática.
"Não sou muito boa em matemática", disse a menina. "No começo, meus pais queriam que eu tivesse essas aulas. Mas agora sou eu quem quer."