Quando os atiradores começaram a matar sua família, Ali el-Sayed, 11, deitou no chão de sua casa e molhou suas roupas com o sangue de seu irmão para enganar os assassinos, fazendo-os pensar que ele já estava morto.
O menino sírio tentou evitar tremer, mesmo quando os atiradores, com longas barbas e cabeças raspadas, mataram seus pais e todos os quatro de seus irmãos, um por um.
O mais novo a morrer foi o irmão de Ali, Nader, de 6 anos. Seu corpo foi atingido por duas balas: uma na cabeça, e outra nas costas.
"Eu coloquei o sangue do meu irmão em cima de mim e agi como se eu estivesse morto", disse Ali à Associated Press por Skype na quarta-feira (30), com voz rouca e fria, cinco dias após a matança que deixou o garoto órfão.
Sobrevivente
Ali é um dos poucos sobreviventes do massacre ocorrido no último fim de semana em Hula, um conjunto de aldeias de agricultores pobres a província de Homs. Mais de 100 pessoas foram mortas, muitas delas mulheres e crianças, que foram baleados ou esfaqueados em suas casas.
O massacre trouxe repúdio mundial imediato ao presidente Bashar Assad, que desencadeou uma violenta repressão contra uma revolta que começou em março de 2011. Ativistas dizem que até 13 mil pessoas foram mortas desde que a revolta começou.
Os investigadores da ONU e testemunhas culpam pelo menos algumas das mortes de Hula a homens armados de um grupo chamado ?shabiha? e que operam em nome do governo de Assad.
Recrutado das fileiras religiosas da comunidade Alawite Assad, os milicianos permitem que governo se distancie da responsabilidade direta pelas mortes que lembram execuções, torturas e ataques, que se tornaram marcas registradas do ?shabiha?.
Ajuda de ativistas
Ativistas que ajudaram a recolher os mortos após o massacre de Hula descreveran corpos desmembrados nas ruas, e fileiras de cadáveres envoltos em cobertores.
"Quando chegamos na cena começamos a ver o tamanho do massacre", disse Ahmad al-Qassem, um ativista de 35 anos de idade. "Eu vi um garoto com o cérebro derramado, uma outra criança que não tinha mais de 1 ano de idade que foi esfaqueada na cabeça. O cheiro de morte era insuportável."
Sem responsabilidade
O regime nega qualquer responsabilidade pelos assassinatos, atribuindo-os a terroristas. E mesmo se o ?shabiha? é responsável pelas mortes, não há evidências claras de que o regime comandou diretamente o massacre.
Segundo a ONU, que está investigando o ataque, a maioria das vítimas foram baleadas à queima-roupa, assim como os pais e irmãos de Ali. Os atiradores pareciam ir atrás das pessoas mais vulneráveis, como crianças e idosos, para aterrorizar a população.
O ativista sírio Maysara Hilaoui disse que estava em casa quando o massacre em Hula começou. Ele disse que houve duas ondas de violência: uma a partir de 17h da sexta-feira (25) e uma segunda às 4h do sábado (26).
"O ?shabiha? aproveitou a retirada dos rebeldes", disse ele. "Eles começaram a entrar nas casas, matando jovens e idosos."
Ali, 11, disse que sua mãe começou a chorar no momento em que cerca de 11 homens armados entraram na casa da família, no meio da noite. Os homens levaram o pai de Ali e seu irmão mais velho para fora.
"Minha mãe começou a gritar: ?Por que vocês levaram eles? Por que vocês levaram eles???, disse Ali.
Logo depois, disse ele, os homens armados mataram toda sua família.
Ali é um dos poucos sobreviventes do massacre, mas não foi possível checar sua história independentemente. A AP entrou em contato com ele por meio de ativistas em Hula que marcaram uma entrevista com a criança pelo Skype.