Ela tem dez anos de idade, mede 1,39 m e pesa 34 quilos - e sabe que leva um bebê na barriga.
Uma menina paraguaia que está grávida de 21 semanas e meia se encontra em boas condições de saúde, disse à BBC a médica encarregada de monitorar sua evolução, Dolores Castellanos.
Mas, devido à sua pouca idade, a gravidez é considerada de risco e alguns temem que mesmo uma pequena complicação possa por a vida da mãe e do feto em risco.
"Estamos acostumados a tratar mães crianças e vemos muitas meninas ansiosas, mas ela parece bem", diz Castellanos, diretora da área de infância e adolescência do hospital Cruz Vermelha, em Assunção.
"Como ela está em companhia de outras garotas de sua idade, parece bem equilibrada."
A menina - cuja identidade não foi revelada - está no centro de uma acusação de estupro. O acusado, seu padrasto, é objeto de um mandado de prisão.
O caso coloca um dilema para autoridades do Paraguai, onde no ano passado 680 menores de 15 anos deram à luz, de acordo com o Ministério da Saúde Pública.
A mãe da garota quer que a filha seja autorizada a se submeter a um aborto "para salvar sua vida".
Mas as autoridades rejeitam o pedido, porque a lei paraguaia só permite a interrupção da gravidez quando a vida da gestante corre perigo.
A mãe foi presa em caráter preventivo enquanto durar o inquérito que investiga as circunstâncias da gravidez, sob acusação de faltar com os devidos cuidados para com a filha e de obstruir a Justiça.
O problema da gravidez infantil é comum em toda a América Latina, mas no Paraguai a legislação é especialmente rigorosa, proibindo a interrupção inclusive em casos de estupro.
No Brasil, o aborto só é permitido em casos de estupro, risco de morte para a mãe ou quando o feto for anencefálico.
Para pressionar o governo paraguaio, a organização Anistia Internacional lançou uma campanha com hashtag #NiñaEnPeligro (#MeninaEmPerigo).
No entender da Anistia, obrigar a menina a ser mãe "constitui tortura e outros maus tratos, de acordo com a Convenção contra a Tortura das Nações Unidas".
Especialistas de todo o mundo, incluindo da Organização Mundial da Saúde (OMS), concordam que a gravidez traz riscos específicos para meninas, cujos corpos ainda não estão plenamente desenvolvidos.
As chances de uma mãe menor de 16 anos morrer no parto são quatro vezes maiores que as de uma mulher acima de 20 anos, de acordo com as Nações Unidas.
"Os problemas de saúde são mais prováveis se a garota ficar grávida nos dois anos seguintes à primeira menstruação", diz o relatório Maternidade na Infância 2013 da ONU, "ou quando sua pélvis e canal de nascimento ainda estão em fase de crescimento".
A médica Castellanos diz que os riscos para a menina paraguaia vão aumentar à medida que a gravidez avançar e seu útero crescer dentro de seu pequeno abdômen. "Ela já sente os movimentos do feto", diz a médica.
A criança foi levada pela mãe a um hospital público no dia 21 de abril, quando começou a apresentar dores abdominais. Há três dias, foi transferida ao hospital Cruz Vermelha.
Ela está sob assistência de um psicólogo e segue uma dieta especial à base de vitaminas, ferro e cálcio.
No momento, o estado de saúde da menina é bom e os médicos só interromperão a gravidez se temerem por suas vida.
Mas a criança, que completará 11 anos em maio, é um pouco frágil: tem peso e altura muito abaixo da média para sua idade, diz a médica.
Um dos maiores perigos no seu caso é o nascimento prematuro. Outro é a pré-eclâmpsia, uma desordem caracterizada por hipertensão que resulta em uma criança muito abaixo do peso.
Segundo o relatório da ONU, a América Latina é a segunda região do mundo com maior prevalência de maternidade infantil, depois da África.
A Nicarágua é o país latino-americano com o maior percentual das mulheres com idades entre 20 a 24 que relatam ter dado à luz antes dos 15 anos: 4,4%. No Paraguai, o índice é de 0,8%.
Para o Brasil, essa estatística contida no relatório é de 1995: 1,8%.
Para evitar mais gestações de adolescentes, alguns políticos paraguaios defendem maior educação sexual.
No entanto, em casos da gestação infantil, em que é improvável sequer haja consentimento, esta não deve ser a melhor saída, diz o médico Santiago Sanchez, do hospital Cruz Vermelha. "Na maioria dos casos, são estupros", afirma.
Por isso é que, para os ativistas, apenas uma reforma da lei do aborto paraguaia pode evitar complicações em casos como o da menina de dez anos de idade.