Por José Osmando de Araújo
Quem espalha discurso de ódio, valendo-se das facilidades instrumentais propiciadas pela internet e suas redes, além das ilicitudes contidas nos seus atos em si mesmo, apresenta uma outra característica que só faz potencializar os seus delitos: são pessoas manipuladoras, deturpadoras e mentirosas. E a primeira prova de manipulação e mentira que podem espalhar é a de que ao expor suas postagens abastecidas de violência e ódio, estão exercendo o direito à “liberdade de expressão.”
O ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto, do alto de sua sabedoria e sensatez, tem reiterado em suas entrevistas e manifestações públicas que “fake News não é liberdade de expressão. É crime.” O direito à liberdade de expressão está contido e assegurado na Constituição Federal do Brasil, que expressamente protege a liberdade da manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, livre de censura ou licença.
Mas liberdade de expressão significa acolher e tolerar o diferente, a ideia oposta, o argumento contrário, mesmo em contextos de polarização exacerbada. Fora disso, é criar-se territórios imaginários em que os ganhadores do jogo são sempre as pessoas que simplesmente desejam ganhar, abatendo a qualquer custo os seus desafetos ao longo do caminho.
FOMENTAR A VIOLÊNCIA
Daí, portanto, agredir verbalmente, proliferar discursos de ódio contra nordestinos, povos indígenas, mulheres, negros, pobres, entre outros, não é exercer liberdade de expressão. É fomentar a violência contra populações historicamente maltratadas, vistas como empecilhos nos seus caminhos de arrogância, desprezo e desrespeito. A história tem demonstrado que todos os selvagens casos de genocídio no mundo foram precedidos de campanhas de violência, mentiras, ódio. Assim se fez contra judeus, assim se faz contra povos indígenas.
ZONA VERMELHA
E o Brasil tem se postado pessimamente nesta questão. Pela primeira vez em mais de 20 anos, passamos a figurar na chamada “zona vermelha” do Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa, um levantamento respeitado, elaborado pela ONG Repórteres Sem Fronteiras, acreditando-se que esse quadro vai piorar daqui para frente, pois um dos alvos preferenciais das fábricas de mentiras, de fake News e manifestações de discurso de ódio, são jornalistas respeitados e independentes dos meios de imprensa tradicionais, duramente atacados com inverdades.
SANDICE
As manifestações constatadas na internet e suas redes contra jornalistas, durante as campanhas eleitorais de 2018 e 2022 são bem um espelho das práticas desprezíveis de pessoas e segmentos que vivem dedicados à massificação do ódio, dividindo cada vez mais a sociedade entre seguidores de deuses ou de demônios. Entre os que merecem viver e os que precisam morrer. Essa a dimensão da sandice.
VIOLAÇÃO DA DIGNIDADE
A mesma Constituição que nos assegura o sagrado direito da liberdade de expressão, fixa que aqueles que usam suas manifestações escritas ou verbais para desgastar a honra alheia, que difamam, caluniam, ou injuriam os outros, que se valem da pregação do ódio para fazer valer sua presença nos meios de mídia, podem ser responsabilizados civil ou criminalmente pelas consequências dos seus atos. A liberdade não é um salvo conduto para a violação da dignidade alheia.
ESTÚPIDO PARADOXO
A liberdade de expressão deve sempre encontrar limites quando se trata de discursos de ódio, que incitam à violência e até à morte. Admitir a difusão do ódio, a pregação da violência, a incitação ao crime, é um estúpido paradoxo à liberdade de expressão. E a proteção para isso é a Lei. Só ela pode responder aos incautos e delinquentes, fazendo prevalecer regras decentes de convivência, com exemplares punições aos crescentes transgressores das relações saudáveis e civilizadas, de tolerância e respeito.