Mães e pais mostram-se receosos quando o assunto é dar a seus filhos a oportunidade de experimentar algo novo em atividades que ofereçam desafios. De acordo com dados de uma pesquisa global, os pais brasileiros são os mais preocupados com a segurança dos filhos quando enfrentam riscos nas atividades fora de casa. Cerca de 82% dos entrevistados alegam que a preocupação de as crianças se machucarem é um impedimento na hora de deixá-las experimentar coisas novas, frente a 69% dos pais entrevistados na Argentina, França e Reino Unido.
Em contrapartida, as crianças anseiam cada vez mais por novas experiências e brincadeiras fora de casa - 31% das entrevistadas citaram: ?estar ao ar livre? e ?viajar a terras distantes? como atividades que sonhavam em fazer. No Brasil, ?viajar a lugares distantes?, como Disney World, e fazer coisas simples, como ?ir à praia?, lideram as preferências. Atividades mais radicais, como, por exemplo, mountain bike, também são desejos populares entre as crianças brasileiras pesquisadas (24%).
Os dados são resultado da pesquisa global ?Tente Algo Novo?, encomendada por OMO, com 800 crianças, de 8 a 13 anos, acompanhadas dos pais, de quatro países - Brasil, Argentina, França e Reino Unido. O estudo analisou os sentimentos que pais e filhos compartilham ao dar às crianças a oportunidade de experimentar algo completamente novo.
De acordo com Jerome e Dorothy Singer, professores de psicologia da Universidade de Yale e coordenadores do estudo, é fundamental que as crianças vivenciem experiências novas que envolvam um certo risco, desde que com supervisão e regras claras. Segundo os especialistas, o fato contribui para libertar os pais para que, também, libertem os seus filhos dos medos excessivos e hábitos sedentários. "O estudo reforça a importância de dar às crianças a oportunidade de aprender pela experiência, mesmo que essa possa envolver um certo grau de risco aparente ou de exposição a comportamento inéditos. As crianças podem se sentir mais felizes quando expostas a novas atividades, porque encontram novidade, excitação e a chance de tentar, por elas mesmas, algo diferente do que as experiências que lhes foram dadas em casa", afirma Jerome.
A pesquisa, desenvolvida para a nova campanha global de OMO, é uma continuação de um relatório anterior feito com 2.400 crianças de 16 países, incluindo o Brasil, sobre o papel do brincar através da experiência e cujos principais resultados demonstraram que as crianças no Brasil tendem a passar mais tempo dentro de casa e têm muito menos oportunidades de explorar a natureza. A pesquisa atual partiu para a análise de em que medida as crianças estão dispostas a se expor a novas atividades ao ar livre. No questionário, as atividades apresentadas às crianças incluíam algumas que envolvem um risco moderado (como andar de mountain-bike ou deslizar por uma ladeira escorregadia) e atividades não habituais (como trabalhar em uma fazenda ou cuidar de animais em um zoológico).
?Desde 2001 temos nos cercado de renomados profissionais e desenvolvido pesquisas globais e nacionais sobre a importância do brincar e do aprender pela experiência para a criança. Todas as pesquisas comprovaram que o aprender pela experiência, o se sujar e descobrir coisas novas são fatores primordiais para o desenvolvimento do potencial humano?, frisa Regina Camargo.
Sonhos simples
O aspecto comum em todos os países é o desejo de que as crianças têm de experimentar atividades novas e o sentimento de realização e satisfação que isto pode lhes proporcionar. Quando pedido às crianças na Argentina, Brasil, França e Reino Unido que imaginassem qualquer coisa no mundo que podiam fazer, tal como visitar algum lugar diferente ou fazer algo extraordinário, o tipo mais popular de atividade foi viajar (31%). Elas sonhavam em viajar para lugares distantes, como Disney World ou América do Norte, assim também como visitar lugares mais perto de casa, como a praia. No entanto, os sonhos variam, podendo ir dos mais simples aos mais impossíveis.
No Brasil, cerca de 22% das crianças escolheram cuidar de animais no zoológico como a atividade que elas mais gostariam de experimentar. A preferência vai de encontro à média dos quatro países, que revela ?passear em estrada de terra? e ?praticar mountain-bike? as escolhas mais populares. Na Argentina, as crianças buscam por coisas simples, como jogar ao ar livre ou apenas estar com os amigos. Na França, a pesquisa revelou escolhas de grande imaginação com a maioria dos entrevistados optando por viajar a novos lugares, como espaço sideral, caminhar na Lua e visitar outros planetas. Já no Reino Unido, as crianças também optaram por atividades ao ar livre, como jogar futebol ou andar a cavalo.
?Com relação às crianças brasileiras, é interessante notar que o desejo por viagens é maior. Talvez isso se deva ao fato dos pais se auto definirem mais protetores de sua prole em relação às atividades fora de casa do que os demais. Em nossos estudos anteriores, vimos que crianças no Brasil tendem a passar mais tempo dentro de casa. Assim, um sonho de viagem parece natural?, explica Dorothy Singer, que ainda traça um comparativo entre as atividades escolhidas nos demais países. ?Na França, as crianças brincam mais fora de casa, onde a imaginação é muito utilizada. Assim, não é de surpreender que usem a imaginação para expressar os desejos em caminhar na Lua ou visitar outros planetas. A característica da cultura francesa também pode incluir maior ênfase na exposição das crianças a contos de fadas e aventuras exploratórias exóticas. No caso das crianças britânicas, andar a cavalo está muito relacionado à história e às lendas do país, como a do Rei Arthur?.
Apesar das diferentes opiniões quanto às atividades escolhidas para uma experiência totalmente nova, os especialistas destacam a mentalidade das crianças na busca de alegria e satisfação em coisas simples da vida e o sentimento de realização que isto pode lhes proporcionar. Felicidade, liberdade, emoção e confiança são os sentimentos que se destacaram no questionário, quando as crianças pensam sobre desafios e novas aventuras. Segundo o levantamento, as crianças sentem-se indestrutíveis ao tentar coisas novas e as emoções positivas dominam essas experiências: 63% das crianças dizem que quando vão além e provam algo novo sentem-se mais felizes. No Brasil, as crianças são significativamente mais propensas a sentirem-se mais felizes (76% contra. 63% do total) e livres (53% contra. 40% do total) do que a média dos quatro países pesquisados. As emoções negativas também são mais raras entre as crianças brasileiras, com apenas 9% de probabilidade de se sentirem nervosas quando se trata de experimentarem coisas novas, e 2% de probabilidade de sentirem medo. Estes estão a par com a média dos quatro países pesquisados.
Mães protetoras
Pelo levantamento global, 92% dos pais e dos profissionais infantis concordam que é essencial para o desenvolvimento das crianças incentivá-las a experimentar coisas novas e diferentes, inclusive no Brasil, onde 88% dos entrevistados concordam com a afirmação: 61% concordam ?fortemente?, 27% concordam ?um pouco? e apenas 5% ?discordam? da afirmação.
Entretanto, os dados coletados identificam impedimentos para essa experimentação. Mais de 69% dos pais admitem que sua maior preocupação ao permitir que seu filho ?vá além? e experimente alguma coisa nova é de que a sua criança se machuque. No Brasil, pais e profissionais infantis são mais propensos a dizer isto em relação à média dos quatro países pesquisados, com índice superior a 82%. Os entrevistados brasileiros também se preocupam significativamente mais em deixar as crianças experimentarem atividades que possam afastá-las de seus deveres escolares (31% contra.15% do total).
?Em nosso estudo anterior, dos diversos países da pesquisa, o Brasil ocupou o terceiro lugar entre as nações com altas taxas de criminalidade, de acordo com o Grupo Hiscox. Nós acreditamos que isso deve influenciar as preocupações das mães dos grandes centros. A falta de tempo para participar com seus filhos das atividades pode ser outro fator para esse impedimento. O mais interessante é que as crianças entendem isso e se importam em ajudar a reduzir essa preocupação dos pais?, complementam os especialistas. Segundo eles, os dados sugerem que as crianças brasileiras preferem compartilhar as novas experiências acompanhadas das mães (18% contra. 11% do total).
?Esse estudo comprova mais uma vez a necessidade das crianças engajarem-se em atividades que lhe ofereçam experiências novas. Uma maior disponibilidade de espaços de natureza, monitorados por adultos, encorajaria os pais a se libertarem e também a seus filhos dos medos excessivos e de hábitos sedentários. Uma característica importante da aprendizagem pela experiência em novas situações é que a criança é capaz de reconhecer que o medo é um componente natural no enfrentamento da novidade, mas que pode ser superado", reforçam os professores Singer.