Apontado como líder máximo da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, será transferido para o presídio federal de Porto Velho, capital de Rondônia. A informação foi confirmada pelo promotor de Justiça Lincoln Gakiya e por mais três fontes ligadas ao processo de transferência da cúpula da organização para unidades federais.
"Ainda não recebi a listagem oficial do Ministério da Justiça, mas esta é a informação que tenho sobre esta liderança", afirma o promotor. "Eles serão separados em grupos e mesmo os que forem para o mesmo presídio ficarão em alas diferentes para evitar qualquer comunicação."
Gakiya é o autor do pedido que resultou na transferência de Marcola e outros 21 presos ligados ao PCC de penitenciárias estaduais no interior de São Paulo para presídios federais na manhã desta quarta-feira (13).
Eles foram divididos em grupos e levados para três estados. Além do presídio federal de Porto Velho, os de Brasília e Mossoró (RN) também receberão os membros da facção. As unidades são administradas pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
A escolta dos presos é realizada por agentes de execução penal do Gaep (Grupo de Ações Especiais Penitenciárias), um setor de elite do Depen. O órgão criou ainda uma força-tarefa, com base em Brasília, com o objetivo de agir em qualquer situação de "ameaça" nos presídios do país.
Segundo o secretário da Administração Penitenciária, o coronel da PM Nivaldo Restivo, a meta é manter os integrantes do PCC inicialmente por 360 dias em presídio federal. Nos primeiros seis meses eles estarão em RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), ou seja, em isolamento.
A defesa de Marcola afirmou desconhecer a informação de que seu cliente vá para Porto Velho. "Disseram que ele iria para Brasília, mas ele não queria aceitar: 'Papuda não quero'".
Marcola não deverá permanecer por um período superior a seis meses na capital de Rondônia. A intenção é a de que o detento passe por outros presídios federais, o que dificultaria possíveis tentativas de fuga. Além dos já citados, existem unidades em Catanduvas (PR) e Campo Grande (MS).
Um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro e publicado no Diário Oficial nesta quarta-feira estabelece que os presídios federais na capital de Rondônia e em Mossoró contarão com reforço de segurança feito pelo Exército nos próximos 12 dias.
Ainda nesta quarta, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, editou portaria que torna mais rígidas as regras para as visitas sociais aos presos em penitenciárias federais de segurança máxima.
De acordo com a norma, a visita no Sistema Penitenciário Federal pode ocorrer em pátio de visitação, em parlatório e por videoconferência. No entanto, quando de tratar de presídio federal de segurança máxima, as visitas serão restritas ao parlatório e por videoconferência, "sendo destinadas exclusivamente à manutenção dos laços familiares e sociais, e sob a necessária supervisão".
O governador João Doria (PSDB) afirmou no início da tarde que o planejamento feito entre os governos estadual e federal para transferir os presos do PCC (Primeiro Comando da Capital) levou 50 dias.
Quem é Marcola
Marco Willians Herbas Camacho começou no crime batendo carteiras no bairro do Cambuci, na região central de São Paulo, quando era criança. Dormia na rua e cheirava cola de sapateiro, algo que, como explicaria a deputados em uma CPI em 2006, renderia o apelido Marcola, "Marco cheira cola".
Renderia, também, passagens pela antiga Febem, hoje chamada de Fundação Casa, muitas vezes com o amigo César Augusto Roris da Silva, o Cesinha.
Nascido em Osasco em 25 de janeiro de 1968, Marcola chegou ao sistema prisional em outubro de 1986, aos 18. Foi flagrado em um dos sete roubos que cometera naquele ano, um deles ainda em janeiro, seis dias após se tornar maior de idade.
A porta de entrada foi a Casa de Detenção de São Paulo, ou Carandiru, que em 1992 se tornaria mundialmente conhecida como palco da maior chacina de presos da história do país, com 111 mortos.
Mas no ano do massacre Marcola já estava no Centro de Readaptação de Taubaté, interior de São Paulo, após ter passado por outros seis presídios no estado. O “Piranhão”, como era chamada a penitenciária, mudaria sua vida e o crime organizado no Brasil.
O PCC, ou Primeiro Comando da Capital, surgiu de um time de futebol no Piranhão em 31 de agosto do ano seguinte. Marcola não estava escalado naquele dia e, por isso, não figura entre os oito fundadores. Mas é considerado por historiadores um dos mentores da organização.
Na lista original estão Cesinha, o amigo de infância que o teria representado, e José Márcio Felício, o Geleião.
Marcola, na ocasião, estava em cela separada com Idemir Carlos Ambrósio, o Sombra.
O Sombra, em fevereiro de 2001, seria responsável pela ação na qual 29 presídios paulistas se rebelaram conjuntamente, com saldo de 16 presos mortos. Bem visto entre os presos de São Paulo, seria ainda o primeiro a ascender no PCC, liderando a facção até ser assassinado em julho daquele mesmo ano, por outros detentos, durante o banho de sol na Casa de Custódia de Taubaté.
A morte do Sombra abriu caminho para Cesinha e Geleião, que assumiram o controle até que o próprio Marcola os destituísse, no fim de 2002. Cesinha seria assassinado quatro anos depois por outro presidiário em Avaré, acredita-se que a mando do ex-amigo de infância, para consolidar poder.
Comparado aos antecessores, Marcola é considerado comedido. Sob seu comando, contudo, se deram as maiores demostração de força e audácia do PCC.
Em março de 2003, a facção assassinou o juiz-corregedor Antonio José Machado Dias, responsável pela fiscalização do presídio de Presidente Bernardes, onde parte dos criminosos da organização cumpria pena. A ordem foi gerenciada por Rogério Geremias de Simone, o Gegê do Mangue, que ganhou destaque no bando com o episódio.
Em 2006, o PCC promoveu uma onda de mais de 300 ataques às instituições e forças de segurança no estado que deixou ao menos 59 agentes da lei mortos. A ofensiva só teve fim quando uma advogada visitou Marcola e disse garantir que ele estava bem.
Pessoas que tiveram contato com Marcola o descrevem como carismático e inteligente, alguém que leu vorazmente, no cárcere, “A Arte da Guerra”, do filósofo chinês Sun Tzu, e obras do poeta italiano Dante Alighieri. Não costuma falar palavrão e é considerado vaidoso —por isso também tem o apelido de Playboy e Bonitão.
O poder de Marcola continua intacto por ora. Contestações surgiram no ano passado após as mortes de integrantes da facção, entre eles Gegê do Mangue, assassinado em uma emboscada no Ceará. Novamente o nome de Marcola está entre os autores da ordem para matá-lo (e, depois, determinar o assassinato das pessoas que cumpriram tal ordem).
Aos 51, Marcola viveu três décadas em presídios. Dos 32 anos desde sua primeira internação no sistema, ficou longe das grandes por apenas três anos, quase todos na década 90, quando conseguiu fugir cinco vezes.
Nos intervalos longe da prisão, participou de assaltos a banco, incluindo um em Cuiabá, quando foi flagrado roubando uma agência do Banco do Brasil. Conseguiu fugir do presídio, porém, pela porta da frente um mês depois.
Foi recapturado num lance de sorte da polícia paulista. Tinha acabado de ser deixado em um orelhão, quando voltava de uma viagem ao Paraná (onde estava escondido), quando investigadores o reconheceram e foram questioná-lo. Estava desarmado e não reagiu.
Mesmo tendo passado sua vida adulta atrás das grades, Marcola não cumpriu ainda nem 10% de sua pena. Condenado a 330 anos, seis meses e 24 dias de prisão, teria que ficar na cadeia até 1 de novembro de 2318. A data está estipulada em seu prontuário, o 45.465.