Morreu na noite desta terça-feira (21), aos 88 anos, o jornalista Ruy Mesquita, diretor de "O Estado de S. Paulo", de acordo com informações do próprio jornal. Ele estava internado desde o dia 25 de abril no Hospital Sírio-Libanês, no Centro de São Paulo. Os médicos haviam diagnosticado um câncer na base da língua.
Ele chegou a fazer uma cirurgia para a retirada do câncer. Os médicos, no entanto, não conseguiram conter o avanço da doença. Segundo a assessoria do hospital, Ruy Mesquita morreu às 20h40 desta terça-feira. Até as 21h40, o hospital não tinha informações sobre o velório e o enterro do jornalista.
Ruy Mesquita era da terceira geração de uma das mais tradicionais famílias de jornalistas do Brasil e por mais de 60 anos esteve na linha de frente do jornal ?O Estado de S. Paulo?, conhecido como ?Estadão?. O ?Dr. Ruy?, como costumava ser chamado, ocupava o cargo de diretor de opinião do ?Estadão? e, nos últimos anos, era o responsável direto pelos editoriais do jornal, considerados entre os melhores da imprensa brasileira.
Fundado em 1875 com o nome de ?A província de São Paulo?, o ?Estadão? é um dos jornais mais antigos e de maior influência no país e, por muitos anos, foi apontado como conservador, embora Ruy Mesquita gostasse de defini-lo como uma publicação de ideias liberais e democratas.
Filho de Julio de Mesquita Filho e neto do patriarca Julio Mesquita, ele nasceu em 16 de abril de 1925 e cursou a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), mas trocou os estudos jurídicos pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
Ao lado do pai, Julio de Mesquita Filho, e já como jornalista, apoiou o golpe de 1964, mas a família rompeu com o regime no ano seguinte, quando as eleições foram canceladas. O Estadão foi o primeiro alvo da censura prévia. Em 1968 chegou a ter a edição apreendida. Os jornais do grupo - como o Jornal da Tarde, fundado por doutor Ruy em 1966 -, entraram para a história do jornalismo ao desafiar os militares com a publicação de poesias e receitas no lugar de textos censurados.
Nos anos 1970, a construção da nova sede na Marginal Tietê, em São Paulo, deixou o grupo em dificuldades financeiras, contornadas apenas anos depois. Em 1996, após a morte do irmão Júlio de Mesquita Neto, doutor Ruy assumiu a direção do "Estadão".
Além do jornal ?O Estado de S. Paulo?, o Grupo Estado reúne atualmente a Rádio Eldorado, a Agência Estado, a Oesp-Mídia, a Oesp-Gráfica e o portal Estadao.com.br.
>Dilma Rousseff
Presidente
"Ruy Mesquita foi um homem de convicções. Diretor do jornal O Estado de S. Paulo, criador do inovador Jornal da Tarde, Doutor Ruy - como era conhecido - foi símbolo de uma geração da imprensa brasileira. Neste momento de dor, presto a minha solidariedade à família e amigos."
Joseph Safra
Banqueiro
?O Dr. Ruy foi um talentoso e determinado brasileiro que exerceu com brilhantismo o jornalismo e deu uma contribuição inestimável para a vida política e empresarial do país. A história de vida, visão inovadora e ética do Dr. Ruy são um legado para todos nós. Um jornalista brilhante, um grande brasileiro.?
Pedro Moreira Salles
Banqueiro
?Ruy Mesquita reunia todas as virtudes que queremos ver em um grande jornalista: independência, firmeza, correção, profundidade, capacidade de mudar de opinião frente ao espírito do tempo e, não menos importante, um texto de extraordinária qualidade. Um texto que, durante décadas a fio, ajudou a formar a opinião dos formadores de opinião no país. Se a página três do Estadão construiu sua reputação como a mais bem escrita e influente do jornalismo brasileiro, esse legado se deve em grande parte ao seu esforço.?
Jose Roberto Ermírio de Moraes
Empresário
?O Dr. Ruy sempre foi um exemplo de integridade como jornalista e empresário. Como homem público, sempre defendeu a liberdade de expressão, a livre iniciativa e colocou os interesses do País à frente dos interesses pessoais. Além disso, nunca lhe faltou coragem de assumir posições, à frente do Estadão, sempre que houvesse confrontos de ideias sobre temas envolvendo a sociedade. A imprensa brasileira perde um grande empreendedor e o Brasil perde um defensor da democracia.?
Abilio Diniz
Empresário
?Conheço o Dr. Ruy há muitas décadas. Sempre tive por ele uma profunda admiração. Seus editoriais contribuíram na defesa de democracia do povo brasileiro. E sua luta pela imprensa livre jamais será esquecida. Vai fazer falta.?
Marta Suplicy
Ministra da Cultura
?É um dos grandes jornalistas brasileiros que se vai. É o fim de uma era.?
Miguel Jorge
Ex-ministro
?Amigo de todo mundo, admirado pelos que o conheciam, respeitado mesmo pelos inimigos, Ruy sempre foi um jornalista 24 horas por dia, 7 dias por semana. Era um pauteiro de primeira. Dava ideias de matérias que se tornaram antológicas, como a série República Socialista Soviética do Brasil, publicada no início dos anos 80. Aprendi com ele praticamente tudo sobre ética, correção, honestidade, senso do dever, respeito à verdade, também sobre jornalismo. Porque Ruy foi jornalista, sempre.?
Paulo Sotero
Jornalista
?Dos 17 anos em que trabalhei no Estadão, 11 dos quais sob a liderança de Ruy Mesquita, guardo a lembrança do editor dedicado e inteligente, sempre pautado pelo espírito público que herdou do pai e do avô. Lembrarei com carinho do homem extremamente atencioso - um cavalheiro - que sempre encontrava tempo para uma prosa com o correspondente do jornal em Washington. O Dr. Ruy que conheci foi um jornalista íntegro, que viveu intensamente as crises e esperanças de seu tempo.?
Fernando Mitre
Jornalista
?A marca de Ruy Mesquita se amplificava na redação. Da sua sala, ele era uma referência fundamental da grande, variada e talentosa equipe que agitava 24 horas o ambiente e dava vida ao jornal.
Da sua máquina, saíam textos antológicos, como o editorial que, em letras graúdas, tomando toda a primeira página, anunciava a série de reportagens sobre o império das estatais no Brasil, uma espécie de ensaio para o grande debate que se desenvolveu depois no País. Sucesso não parecia ser o que Dr. Ruy mais procurava. Sua prioridade era a solução dos problemas do Brasil e a isso se dedicava com obsessão. É assim que ele entra definitivamente para a história do seu país, como um dos grandes nomes do jornalismo. O sucesso foi inevitável.?
Sandro Vaia
Jornalista
?No final da tarde do dia 13 de dezembro de 1968, Ruy Mesquita juntou-se a um grupinho de jornalistas para ouvir, em rede nacional, o locutor que lia pausadamente o preâmbulo e os artigos ameaçadores do Ato Institucional n.º 5 - que consolidava inequivocamente a ditadura nascida em 31 de março de 1964. Ruy Mesquita trovejou, soturno: - Acabou. Estamos f....
Na manhã de 11 de setembro de 2001, eu estava na direção de redação do Estado e começava a preparar a edição histórica do atentado às Torres Gêmeas, quando Ruy Mesquita me ligou. Repetindo o tom soturno de 33 anos atrás, mas agora com uma voz mais cansada e estremecida de emoção, disse: ?Jamais pensei que estaria vivo para ver uma coisa dessas.? O jornalismo, a vida e a história acabam de perder o testemunho implacável de Ruy Mesquita.?
Lygia Fagundes Telles
Escritora
?A figura que vai ficar eterna é a do grande jornalista e cidadão exemplar. Mas gosto de me lembrar do amigo, com quem dividi o palco do Municipal, na montagem da peça Heffman. Ruy tinha uma voz linda, que sempre me encantou.?
Roberto DaMatta
Sociólogo
?Ouvi falar do Dr. Ruy quando comecei a fazer uma coluna no Jornal da Tarde. Eu estava dando aulas em Notre Dame, Indiana, EUA; e sempre que vinha ao Brasil, eu visitava o Estadão. Foi, pois, como um estranho no ninho, que ouvi do Mitre o nome de Ruy Mesquita pronunciado com reverência. Logo, o antropólogo dentro de mim viu que o nome ?doutor Ruy? representava um ideal.
Um dia, fui a sua sala onde fui recebido com uma simpatia que esbarrava na modéstia. Anos depois, num almoço com colaboradores deparei-me com o Dr. Ruy no elevador e ele imediatamente me reconheceu. Aquele reconhecimento, além do simpático almoço com meus ?colegas?, fez o meu dia.
Descrevo dois encontros rápidos como os instantes com os quais contamos a vida para reafirmar o orgulho de colaborar para um jornal vestido dos pés à cabeça de equilíbrio e de liberalismo. E para revelar a honra de ter me entrevistado com um dos construtores desse espírito neste Brasil onde ser liberal ainda é xingamento.?
Paulo Markun
Jornalista
?Em outubro de 1975 saí da prisão. Fora demitido retroativamente pela direção da TV Cultura, que teve a indelicadeza de apontar minha demissão quando Vlado (Vladimir Herzog) ainda dirigia o jornalismo da emissora, onde eu chefiava a reportagem. Minha mulher à época, Dilea Frate, também foi demitida.
Passamos momentos complicados. Luis Fernando Mercadante sugeriu que eu procurasse o Dr. Ruy Mesquita, a quem não conhecia.
O Dr. Ruy me recebeu, expliquei a situação e pedi uma chance. Ruy Mesquita não fez qualquer comentário. Simplesmente autorizou a abertura de uma vaga no Jornal da Tarde, onde fiquei um ano. Nesse tempo, tive poucos contatos com ele. Nunca mencionou o fato. Mais de uma vez, o entrevistei. Até mesmo no Roda Viva, onde fiz questão de registrar o gesto, que o Dr. Ruy fez com muitos outros perseguidos pelo regime. Sem alarde.?