Um dia depois de enterrar sua mulher, Miguel Palma buscava desconsolado nesta terça-feira (2) o nome de seus dois filhos desaparecidos numa lista de mortos pelo tsunami que arrasou o povoado de Constitución, no sul do Chile.
Na madrugada de sábado, cerca de meia hora depois que um dos mais fortes terremotos da história moderna golpeara o Chile, ondas de 10 metros acabaram com o povoado e seus arredores, deixando mais de 350 mortos na área.
Os alarmes contra tsunami nunca soaram.
O ginásio do povoado converteu-se em um necrotério improvisado, onde na terça-feira chegou um caminhão com caixões para que as famílias pudessem sepultar seus mortos.
Em meio ao pranto de outros familiares, Palma revisava a lista de 70 mortos pregada na parede do ginásio, buscando os nomes de seus dois filhos de 9 e 7 anos.
"Estavam acampando na ilha e chegou o mar, e desde então não sabemos nada sobre eles", disse Palma, de 28 anos, acompanhado por seu pai.
"A mãe estava com eles, a encontramos e a enterramos ontem. A municipalidade nos enviou a urna, mas o traslado tivemos de fazer em veículos particulares", acrescentou.
Constitución, povoado de 50 mil habitantes ao lado do Oceano Pacífico e a mais de 300 quilômetros ao sul de Santiago, registrou cerca de metade dos mais de 700 mortos deixados pelo sismo de magnitude 8,8 e pelos tsunamis posteriores.
Entre a costa central de Llo-Lleo e o porto de Talcahuano, ondas gigantescas devoraram povoados costeiros, penínsulas e portos.
Durante as primeiras horas após o terremoto, o governo negou-se a falar sobre um tsunami, mas terminou reconhecendo logo e explicando que o sistema de alarme falhou por um "erro" da Marinha.
Em Constitución, ondas gigantes avançaram pela cidade e fizeram subir o nível da foz do rio Maule. As casas precárias da praia foram arrastadas por 150 metros e lançadas ao mar.
"Vimos pessoas penduradas nas árvores usando seus celulares como luzes, pedindo ajuda aos gritos desde a ilha", disse María Isabel Piña, que tinha um posto de venda de pão e empanadas na frente da foz do rio.
Numa ilha, 200 metros mar adentro, cerca de duas centenas de pessoas haviam acampando no sábado para celebrar uma festividade típica da região.
"Salvaram-se apenas cinco pessoas na ilha", disse Graciela Bravo, nativa de cerca de 50 anos.
Os sobreviventes em Constitución caminham sem rumo pelas ruas destruídas e já começam a sentir o odor dos cadáveres. Muitos fazem fila fora do ginásio para receber água.
Outros buscam ajuda ou comida entre os escombros e as casas destruídas. Em um supermercado da cidade, já não há quase nada: foram levadas até as caixas registradoras.
Enquanto isso, a ajuda começava a chegar em um helicóptero do Exército e as pessoas corriam ao local com pedidos.
O governo disse que está fazendo todo o possível para entregar a ajuda nos lugares mais afetados, mas para os sobreviventes as necessidades são muitas.
"Não há nada, perdemos tudo. Fiquei com isso que você vê. Foi só o que pude salvar. Precisamos de roupa, víveres, água, alimentos", disse Jorge Orellana, de 23 anos, que salvou apenas um par de bolsas que levava consigo.
Miguel Palma, finalmente, não encontrou o nome de seus filhos na lista de falecidos.