Proposta pode criar estágio de Direito obrigatório em presídios

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério da Educação (MEC) estão discutindo uma proposta referente à criação de estágio obrigatório

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A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério da Educação (MEC) estão discutindo uma proposta referente à criação de estágio obrigatório em presídio para alunos de Direito.

De acordo com a Drª Giovana Nunes, membro da Comissão Nacional de Ensino Jurídico da OAB, a proposta ainda não foi submetida a deliberação pela Comissão Nacional de Educação Jurídica do Conselho Federal da Ordem e nem pela Câmara Consultiva do Marco Regulatório, criado pelo termo de cooperação OAB/MEC. ?Ainda é apenas uma proposta. Não há nada definido até o momento?, afirma.

Para o professor de Direito da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Nestor Alcebíades Mendes Ximenes, a intenção do MEC em tornar obrigatório que estudantes dos cursos de Direito façam estágio em órgãos públicos, é vista com cautela pelas Universidades e pela própria OAB, em razão do número de alunos nas faculdades de Direito e os órgãos públicos, incluindo as unidades prisionais.

O professor coloca ainda que o presidente nacional da entidade dos advogados, Marcus Vinícius Furtado, disse que é favorável à obrigatoriedade do estágio, porém estranhou a proposta de que os estágios sejam feitos exclusivamente em órgãos públicos, como tribunais, juizados especiais, Defensorias Públicas e Ministério Público, pois não há motivos para deixar de fora escritórios particulares de advocacia e organizações não governamentais, especialmente as que prestam assistência à população de baixa renda.

Além disso, surge uma outra questão relacionada à remuneração dos estagiários: quem pagaria essa conta, considerando que a medida levaria órgãos públicos a aumentar o número de estudantes contratados?

Sendo mais específico em relação ao estágio em presídios, o professor frisa que é necessário um amplo debate para disponibilizar estagiários para atuação nas unidades prisionais, a partir da segurança, triagem, orientação de professores qualificados, parceria com Ministério Público e Defensoria Pública. ?Isso tudo deve ter salas especiais para receber os estagiários, com acesso à internet e acompanhamento direto do Poder Judiciário?, comenta.

Outras iniciativas, segundo Nestor Ximenes, já foram realizadas pelo Conselho Nacional de Justiça, como é o caso do projeto ?Advocacia Voluntária?.

Recentemente, houve também a implantação do Núcleo de Acompanhamento ao Preso Provisório (NAPP), desenvolvido pelo Ministério Público e Tribunal de Justiça do Estado do Piauí.

?Mesmo com isso, ainda é preciso uma participação mais incisiva das universidades, para abranger essa proposta desde que seja de forma planejada?, pondera.

Naira Andresa (21), estudante do 2º período do curso de Direito, acredita que, se efetivada, será uma exigência positiva para os formandos, pois eles terão acesso a realidade com mais precisão. ?Somente a teoria não é o suficiente para uma melhor formação. Tendo os fatos concretos em mãos, podemos nos preparar melhor?, coloca.

Proposta apresenta pontos polêmicos

Para o estudante de Direito, Marcelo Filho, diante da discussão há dois pontos que geram polêmica, ainda mais se tratando de um curso tão elitizado e que ultimamente vem sendo tão "tecnicizado" com o intuito tão somente de formar profissionais para o exame da Ordem ou para concursos públicos.

O primeiro deles é com relação à obrigatoriedade, que acaba cobrando uma mudança efetiva em todas as instituições, inclusive naquelas que nunca tiveram para si a preocupação de investir em uma formação mais humanística e crítica da realidade, e o fato de o estágio ser em presídio ou camadas populares, o que gera um desconforto por serem demandas que se afastam do elitismo que insistentemente cobre o mundo jurídico.

"Se causa tanto impacto e polêmica é porque essas mudanças pretendidas de fato vão afetar na formação e a realidade do ensino jurídico. O Direito Penal é um ramo do direito que trabalha com os aspectos mais sensíveis de uma sociedade.

O estudo dele é desvinculado de uma análise real e prática dos seus efeitos, gera retrocessos e muito da realidade que a gente vê hoje nas estruturas punitivas do estado", comenta.

Marcelo acrescenta que com isso o estudante acaba não compreendendo a aplicabilidade da lei. E assim se fazem necessárias e urgentes práticas no sentido de que essas mudanças trazem.

Para ele, visualizar a execução das leis penais nos presídios conduzirá os estudantes a contribuir para uma justiça que não dependa de cor, classe social ou gênero, pois a massa de graduandos que se terá empenhados em acompanhar essa realidade conseguiria melhorar a situação dos processos penais do Estado, que por sinal vão mal, atingindo as menores taxas do Brasil em celeridade.

"Colocar os estudantes de Direito na rua, onde as leis acontecem, nos fará mais humanos e de fato agentes da justiça. Compreender a sociedade e como o direito atua nela com certeza diminuirá os abismos que temos no ensino jurídico hoje", conclui.

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