O massacre na escola estadual Professor Raul Brasil, em Suzano (SP), na quarta-feira (13), que deixou dez mortos e 11 feridos, trouxe à tona novamente o debate sobre o controle de armas de fogo —como o revólver calibre 38 usado pelos autores do ataque. O tema já tinha voltado aos noticiários em janeiro, quando o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto que facilita a posse de armas, uma de suas principais promessas de campanha.
Após o massacre de quarta-feira, foram retomadas críticas à facilitação da posse de armas e renovados pedidos por novas leis aumentando o controle de armas. Mas houve também argumentos em contrário, defendendo o direito de defesa dos cidadãos. O senador Major Olímpio, do PSL, partido de Bolsonaro, viu no massacre uma evidência de que "a política desarmamentista fracassou" e afirmou que "se tivesse um cidadão armado dentro da escola, um professor, um servente, um policial aposentado lá, ele poderia ter minimizado o efeito da tragédia".
As declarações do senador ecoam argumentos usados por um número crescente de políticos nos Estados Unidos que têm proposto leis que, em vez de limitar a venda, visam aumentar o número de armas de fogo nas escolas e em outros edifícios públicos, além de armar professores e funcionários de colégios como meio de defesa contra eventuais ataques. Nos EUA, foram registrados mais de 200 ataques em locais públicos com uso de arma de fogo desde 2013. Mas se os vários massacres ocorridos em escolas e universidades ao longo das últimas décadas não levaram a restrições no controle de armas de fogo no país, o mesmo não pode ser dito da história recente do Reino Unido.
Em 1996, um massacre de crianças em uma escola na Escócia levou a uma mudança radical na lei e, como consequência, na acentuada redução do número de ataques do tipo e de mortes por armas de fogo na Reino Unido. No dia 13 de março daquele ano, o ex-líder escoteiro Thomas Watt Hamilton, 43, invadiu um ginásio da escola primária Dunblane, na cidade escocesa de mesmo nome, e matou 16 crianças e um professor, antes de cometer suicídio.
Hamilton estava armado com duas pistolas e dois revólveres, todos adquiridos legalmente —e 743 cartuchos de munição. As crianças mortas tinham entre 5 e 6 anos de idade. Uma professora de 45 anos também foi morta ao tentar proteger seus alunos. Outras 11 crianças e três adultos ficaram feridos. O caso gerou comoção no país e levou à criação de várias associações de defesa do controle de armamentos.
Um abaixo-assinado pedindo a proibição das armas de fogo no país, que teve apoio do jornal The Daily Mail, um dos mais populares tabloides britânicos, reuniu mais de 700 mil assinaturas. O Reino Unido já tinha uma das legislações mais restritivas do mundo em relação à posse de armas, mas no começo de 1997, o governo britânico levou à aprovação no Parlamento a proposta de proibição total da posse de pistolas com calibre superior a 22.
Poucos meses depois, o novo governo trabalhista, empossado recentemente, ampliou a proibição para todas as pistolas, de qualquer calibre. A lei prevê apenas algumas poucas exceções, como no caso de armas carregadas com pólvora consideradas antiguidades, armas de interesse histórico cujas munições não sejam mais fabricadas e pistolas de ar comprimido. O Reino Unido tem um dos menores índices de homicídios por armas de fogo em todo o mundo. Segundo as estatísticas oficiais, apenas 43 pessoas foram mortas por armas de fogo no país entre abril de 2009 e março de 2010 —41 na Inglaterra e no País de Gales e apenas duas na Escócia.
Os dados mais recentes são de 2018. Segundo o Escritório Nacional de Estatísticas, houve 726 homicídios em 2018 na Inglaterra e País de Gales. Desses, a maioria, 285, foram mortes por esfaqueamento, 106 por "socos e pontapés" e apenas 29 por armas de fogo. Desde Dunblane, houve apenas mais um massacre do tipo, em junho de 2010, quando Derrick Bird, um motorista de táxi de 52 anos, matou 12 pessoas e feriu 11 antes de suicidar, usando uma escopeta.