Na vala as crianças brincam, esbanjam alegria, enquanto ao redor os pais assistem incrédulos a situação que se repete. Os sentimentos opostos se encontram minutos depois, ambos têm a missão desgastante de carregar água, muitos andam quarteirões atrás do líquido; baldes, vasilhas, garrafas pet, qualquer depósito é aproveitado, mas a rotina diária não se limita a uma única “viagem”, a tarefa é cumprida outras vezes, afinal nem sempre o esforço inicial é suficiente. A cada caminhada a revolta se alastra, nas torneiras nada sai, ao mesmo tempo que a esperança passa a ser escassa. Afinal, a luta perdura e parece longe de acabar.
Na Vila Santa Bárbara, zona Leste de Teresina, dois panoramas distintos entram em duelo, de um lado a abundância do abastecimento, já do outro o sofrimento com a intermitência do serviço. Realidades conflitantes, que geram manifestos e pedidos desesperados, a falta de água é um problema que assola os moradores, prejudica estabelecimentos e põe em voga uma questão séria e urgente. “Essa dificuldade é eterna, mas de sexta-feira (24) para cá piorou, não passa mais nada para as torneiras, uma equipe da Agespisa veio aqui e separou o cano geral ao meio e vedou com concreto os lados”, relata a comerciante Cilene Moura Fé, residente da Rua São Paulo.
A medida adotada pela empresa de águas e esgotos causou polêmica entre a população, que se sente lesada e promete realizar manifestações todos os dias, tal como a ação que ocorreu na última segunda (27). “Desde que fizeram isso o serviço acabou mesmo, antes vinha de madrugada e agora nem isso. Se não resolverem vamos manifestar todos os dias”, aponta a empresária Adriana Silva. O questionamento se volta para a efetividade do trabalho. “Olha, se fosse para piorar, era melhor ficar do jeito que estava; era ruim, mas pelo menos ainda tínhamos alguma gota em casa”, diz a dona de casa Helena Ramos.
Sem opções, os moradores retiraram a proteção de concreto colocada pela empresa no cano responsável pela distribuição na região e passaram a buscar água no local. A ação, porém, acabou gerando um buraco, que agora é tomado pelas crianças como um espaço de diversão, algo arriscado e que exige cuidado dos pais. “Nós queremos saber por que tamparam esse cano, pensam que somos idiotas, burros. A situação está precária, tem que ajeitar o cano e liberar a água”, comenta a moradora Maria Oliveira.
Mesmo com a fragilidade no abastecimento, a denúncia da população é que a conta aumenta mês a mês. “Eu rasguei a minha conta, enquanto não melhorar não vou pagar. Somos obrigados a pagar por algo que não tem, isso é vergonhoso”, declara a dona de casa Cileide Moura.
Idosos e gestantes são os que mais sofrem
Com 70 anos de idade o aposentado Antônio dos Reis não tem descanso, com a intermitência no abastecimento ele ajuda a família na tarefa de buscar água e acaba carregando baldes pesados. “Eu carrego de manhã e não tenho mais condições de fazer isso, estou velho para carregar tanto peso”, relata.
O problema também atinge diretamente as gestantes, provocando situações preocupantes. “Eu estou grávida de oito meses e vim pegar água, acabei passando mal, fui para na maternidade. Isso não é certo, tenho medo que aconteça algo de pior”, diz Maria Sousa. Sem opções, ela prefere continuar se arriscando. “o médico disse para que eu repousasse e não pegasse peso, mas não tem jeito, não tem água para beber, para banhar, para nada e eu me sinto obrigada a vir até esse cano quebrado buscar”, detalha.
Estabelecimentos são prejudicados
Dona de um salão de beleza, a empresária Adriana Silva perde clientes com a intermitência, na terça (28), o estabelecimento estava fechado. “Não tem como trabalhar sem água, como vou lavar o cabelo das clientes”, indaga.
O prejuízo no final do mês pesa bastante e compromete a renda familiar. “O movimento aqui no Santa Bárbara já não é intenso, com isso então fica ainda mais difícil. Nós somos excluídos, nos sentimos completamente esquecidos”, detalha.
Enfrentando a mesma dificuldade, Cileide Moura, que é proprietária de uma pizzaria, já não sabe a quem recorrer e adota medidas provisórias para continuar com as portas abertas. “Recentemente tive que encher o carro com louça suja para ir lavar no Bairro São Pedro. É algo humilhante”, complementa.
Em nota, a Agespisa informa que está realizando manobras no abastecimento da Vila Santa Bárbara, com o objetivo de melhorar a oferta de água para os moradores. Ainda esclarece que na região Planalto Uruguai há intermitência por causa da topografia elevada e também devido ao alto consumo nesse período mais quente do ano.
Clique e curta o Portal Meio Norte no Facebook