Soluções caras para problemas anunciados desde a formação de Teresina. Por que a capital demorou tanto para acordar para o escoamento das águas pluviais? De acordo com o Plano Municipal de Saneamento Básico, somente em soluções para os alagamentos da cidade, será necessário gastar 3,5 bilhões em 20 anos. O plano, que inclui outros pontos além de drenagem urbana, soma mais de R$ 8 bilhões em recursos.
Parte deste orçamento já está sendo captado pelas equipes da Prefeitura Municipal de Teresina, que elencaram oito bacias problemáticas como prioridade. As denominadas PE31, P10, PD06, PD02, P17, P18 e P19 foram as escolhidas. Essas sub-bacias estão presentes em todas as zonas da capital, assim como as enchentes que acometem a cidade todos os anos.
“Tudo começou em 2010 quando a prefeitura elaborou o plano diretor de drenagem. Mapeamos a zona Urbana e Rural com relação a topografia, volume d’água, etc. Tudo isso foi mapeado e dividido em 70 sub-bacias. São áreas delimitadas pela própria natureza. São subdivisões naturais. A partir deste mapeamento captamos recursos para os projetos executivos de oito, que foram julgadas como prioridade”, explica José Alberto, assessor de coordenação da Secretaria Municipal de Planejamento (Semplan)..
A PE31, da região do Torquato Neto, está em fase final de licitação. “Conseguimos elaborar o projeto e licitamos a primeira etapa. Captamos o dinheiro para executar as obras. Conseguimos R$ 70 milhões, que é apenas a primeira parte. Daí você imagina como são caras as obras de drenagem. Mas essa primeira etapa já sanaria boa parte do problema. Essa é a mais urgente hoje, porque lá é sério. A prefeitura teve que pegar essa bronca porque a Caixa não fez sistema de drenagem”, aponta José Alberto.
Também temos a sub-bacia P10, que estamos em fase final das tratativas com o Governo Federal. Estamos conseguindo um aporte financeiro para resolver a região do São Pedro, que pega a Avenida Barão de Gurguéia. O valor da obra é de R$ 83 milhões, do Programa Avançar Cidades. A parte de engenharia foi aprovada, mas estamos com um empecilho que é a questão do limite do recurso do FGTS. Já estouramos esse limite com muitos projetos do Estado e outras cidades. Estamos tentando viabilizar o aumento do limite para enquadrarmos ela. É uma região complicada que merece atenção”, acrescenta.
Zona Sudeste terá galerias pelo Avançar Cidades
A região Sudeste é uma das mais castigadas pelas enchentes, tendo inclusive um histórico de vítimas fatais. Embora elas também tenham sido aprovadas pelo Governo Federal para financiamento, elas também estão impedidas pela questão do limite dos recursos do FGTS. A PD06 custará R$ 46 milhões, enquanto que a PD02 está orçada em R$ 25 milhões.
“São galerias próximas. A PD06 é onde teve uma ocorrência com morte. São obras muito caras que exigem muitos recursos. Além destas que cadastramos, também estamos buscando recursos para elaborar cinco projetos executivos para mais cinco bacias. A ideia é ter tudo pronto para quando conseguirmos novas oportunidades de recurso. Nossa equipe de captação de recursos trabalha incessantemente para correr neste sentido. Os recursos estão escassos e você não consegue nada sem projeto. Temos financiamentos com o Governo Federal e bancos estrangeiros”, explica o assessor de coordenação da Semplan. (L.A.)
Galerias resolverão 80% dos problemas na Avenida Presidente Kennedy
O projeto das Galerias da Zona Leste, nome dado à estrutura construída ao lado de um shopping na região do bairro São João, é o que está mais próximo de ser uma realidade para a população de Teresina. “A galeria da zona Leste foi retomada e teve um andamento muito bom antes do período chuvoso. Aceleramos bem, mas com a chuva é complicado trabalhar. Temos um problema muito forte com relação ao nível do lençol freático, porque ele é bem superficial. Isso dificulta a escavação”, explica José Alberto.
O assessor de coordenação explica que as obras de escavação estão paradas por conta das chuvas. “Obra de drenagem usa métodos destrutivos. É preciso escavar, abrir a pista e em chuva é meio impossível, principalmente obras de grande porte. No entanto, a obra não está parada. Eles encerraram a parte do canal e estão fazendo as captações. A galeria da zona Leste tem executada em torno de um quilômetro. Ela vem de perto do Shopping pelas Ruas Falcão Costa, Alzira Pedrosa e entra na João XXIII. Ela já chegou neste ponto”, relata.
A galera deve ficar pronta até o final do ano. “O próximo passo é providenciar a travessia da Avenida, para ir para a Rua Eustáquio Portela, que é onde tem um grande risco, perto de um supermercado. De lá, ela vai passar pela Avenida Homero Castelo Branco, Presidente Kennedy, Praça do Prefeito e depois para a Arêa Leão. Isso vai resolver 80%”, conclui José Alberto, assessor de coordenação da Semplan. (L.A.)
Teresina “acordou” para águas pluviais
A capital corre atrás de um prejuízo centenário do não investimento em estruturas de vazão hídrica de águas pluviais. A cidade parece ter “acordado” para a situação em 2015, a partir de uma lei que especificou prerrogativas para a construção civil na capital.
É o que explica Victor Pavanelli Lira, mestre em hidráulica e recurso hídricos. “Cada cidade tem um sistema para dar uma solução específica. Eles levam em consideração a topografia para a gestão de águas pluviais. Teresina não tem investido muito em infraestrutura de drenagem urbana ao longo do tempo. O que favorece é que existe uma lei de 2015, Nº 4724, que exige que todos os empreendimentos acima de 500 m² tenham dispositivos de amortecimento de impacto que possam a conter vazão hidrológica”.
O engenheiro conta que é preciso valorizar áreas verdes e caminhar contra a impermeabilização desenfreada do solo. Sob o aspecto legal, Teresina avançou com a legislação supracitada. “Se a área verde gera um escoamento baixo, a área de construída tem que ter um escoamento baixo também. Isso só vai acontecer se você segurar a água e soltar os poucos, principalmente se a área de solo é impermeável. Essa lei ajudou a cidade a não piorar. Poucas cidades brasileiras têm esse tipo de dispositivo legal. São Paulo, por exemplo, tem essa lei, mas a cidade já está toda desenvolvida. Não tem tanto impacto como aqui, que é uma cidade que ainda tem terrenos para construir, a cidade ainda está em expansão. A prefeitura é rigorosa nesse aspecto”, reconhece.
No entanto, os problemas de drenagem ainda precisam de solução. “Existem problemas da macrodrenagem da cidade. Os principais são pontuais. Ao longo da descida do terreno, a água acumula porque não há passagem. Temos problemas fortes na BR-316, na saída da cidade, onde foram expandidos os bueiros. Fizeram um projeto não muito bem dimensionado, fui até procurado para isso, pelo DER, mas não me chamaram novamente”, revela Victor Lira. (L.A.)
Problemas sérios e de alto risco
Embora a questão do escoamento d’água já tenha gerado vítimas fatais, pouco foi feito em regiões como a zona Sudeste. “Temos mais problemas sérios, como o caso clássico da Avenida Joaquim Nelson, que é um atestado de incompetência. As pessoas precisam entender que a terra não é plana e que chove. As pessoas olham os empreendimentos pela planta, como se não chovesse e fosse tudo plano. Existem alinhamentos das águas que precisam ser respeitados. Lá foi um caso claro de estrangulamento de caminho da água. Você vê claramente que a água transborda ali e gera vários impactos”, aponta o engenheiro Victor Lira.
O sistema de drenagem da capital é praticamente inexistente. “Em Teresina, não existe sistema de drenagem. É tudo muito superficial. Quando é próximo ao Rio Poti, eles colocam tubulações bem curtas e subdimensionadas. Não existe uma rede de escoamento. Na Avenida Nossa Senhora, no miolo da zona Leste, área nobre praticamente ao lado do rio, e você tem problemas ali que uma rede subterrânea resolveria facilmente“, acrescenta o mestre em hidráulica e recurso hídricos
Tecnicamente, as estruturas de drenagem deve prever um erro de captação de águas, mas nada como o observado em vários pontos da capital. “Para critérios de projeto, você dimensiona uma rede de drenagem por um tempo de retorno de dois a cinco anos. Isso significa que você dimensiona essa estrutura para uma chance de falha de até 20%. A lâmina d’água na via deve ser próxima do meio fio, além de ultrapassar a calçada. Isso não pode acontecer com tanta frequência. As microestruturas de microdrenagem, a grosso modo, é como se fosse para molhar a calçada a cada cinco anos. Mas toda chuva em Teresina estragada calçada, pavimento e os carros. Isso porque não tem estrutura para conduzir as águas de forma adequada”, analisa Victor Lira. (L.A.)
Sustentabilidade é o caminho contra as enchentes
É preciso caminhar na contramão do concreto e deixar o verde florescer. “Em alguns locais não ocorre inundação porque o terreno é mais favorável. Existe um encaminhamento natural das águas, o que torna a rede subterrânea desnecessária. Isso é a necessidade da cidade preservar as áreas verdes. Se Teresina fosse construída do zero, a primeira coisa a ser feita era restaurar os rios e poupar áreas verdes. Ocupar as margens dos rios, junto com a pressão imobiliária, leva muitas cidades a canalizarem o rios. Muitas vezes, há rios que ficam subterrâneos. Mas é preciso caminhar na contramão e restaurar os rios. A Prefeitura de Teresina já deu um basta nessa pressão toda e eles não permitem esse avanço para o atendimento da lei. Mas já existem pela cidade caminhos d’água que foram estrangulados e causam as enchentes”, recomenda o engenheiro.
O problema de drenagem está associado a uma urbanização tão forte. O engenheiro explica a situação do litoral. “Parnaíba tem um agravante. Apesar do terreno arenoso, quando você impermeabiliza você impede da água correr. Como ela não tem velocidade, ela ganha uma profundidade maior, que geram prejuízos maiores. Para um mesmo volume d’água, quanto mais inclinado o terreno, menor é a lâmina d’água. Agora se você está em uma parte plana, a água não corre e tende a gerar inundações. Projetos no litoral têm esse desafio de drenagem, pois o potencial de alagamento é maior. Mas não é preciso seguir esse modelo antigo de colocar tudo em tubulações”, pontua Lira.
A ideia é que novos projetos sigam uma linha mais “sustentável” de construção. “Em loteamentos é possível conter a água com faixas de grama, superficialmente. Essa é a tendência lá fora, onde até mesmo o clima fica mais agradável. Além de sair mais barato. Isso é bom para o empreendedor, porque embora gaste um pouco mais de um terreno, ele economiza na ausência de tubulações. O custo de implantação é bem menor” , finaliza Victor Lira. (L.A.)