Cerca de 220 venezuelanos estão vivendo em abrigos em Teresina, e esse número inflado pela crise no país pode aumentar. Os refugiados chegam em busca de melhores condições de vida, como saúde e emprego. Porém, de forma deplorável, muitos deles estão pedindo esmolas e utilizando crianças de forma indevida nos sinais de trânsito em diversos pontos da cidade, o que tem preocupado as autoridades.
Com vestidos estampados, coloridos e largos e, em sua maioria, com crianças no colo, muitas venezuelanas ficam nos sinais e praças da capital pedindo dinheiro para comprar comida. Sofia Mendonça, 21 anos, espera receber qualquer ajuda quando o sinal fechar e os carros e motos se aproximarem. “Não temos comida, não temos médicos, não temos dinheiro, nem nada”, diz Sofia, de forma tímida.
Ela é de Tucupita, região ao Norte da Venezuela, onde a maioria são índios nativos da tribo Warao, que trabalhavam com agricultura e pesca. São mulheres e homens com pouco ou sem nenhum estudo.
Como medida protetiva às crianças, representantes da Gerência de Direitos Humanos e Conselhos Tutelares de Teresina, 1ª Vara da Infância e da Juventude, Promotoria da Infância e da Juventude e Polícia Militar se reuniram na Secretaria Municipal de Cidadania, Assistência Social e Políticas Integradas (Semcaspi) para traçar um plano de ação que visa coibir a utilização de crianças de forma indevida para a mendicância e conscientização no combate à prática.
Nesta semana, uma equipe formada por conselheiros tutelares, tradutores e agentes de proteção social da Prefeitura de Teresina fará parte da comitiva que irá vistoriar os sinais de trânsito e coibir as ações dos venezuelanos para tal prática de mendicância nesses locais de trânsito da capital, bem como as atitudes que infringem as leis municipais. O secretário da Semcaspi, Samuel Silveira, destacou à reportagem do JMN quais as ações serão desenvolvidas na cidade.
"Essa ideia foi articulada em reunião para coibir esse trabalho. Já nesta semana formaremos as equipes e estamos em busca de tradutores para acompanhar esse pessoal nos sinais e depois serão direcionados por profissionais para fazer a verificação e encaminhamento das crianças venezuelanas aos abrigos que eles já estão acolhidos. Esse é um esforço de conscientização para que a população não fortaleça o trabalho da mendicância", afirmou o secretário.
Samuel reforça que a secretaria e entidades têm oferecido assistência, como alimentação, atendimento psicossocial e moradia e que, dar esmolas, está prejudicando o trabalho realizado por essas instituições. "A legislação brasileira não permite que crianças brasileiras estejam expostas a situação de rua, como no caso nos sinais, e a realidade também cabe aos estrangeiros. Estamos cumprindo com o nosso papel de ajudar essa população. Não estamos proibindo a vinda deles diante da crise social que passam, mas é dever da prefeitura cuidar das crianças".
Fora da escola
Apesar da intensa mobilização da população local e de entidades civis como Cáritas e o MP3, ainda falta teto adequado e escola para as crianças venezuelanas. Garantir estudo às crianças venezuelanas em Teresina é outro desafio, principalmente porque falta espaço, vagas nas escolas e a barreira do idioma. Em toda a cidade, estima-se que mais de 70 crianças não tenham onde estudar.
A realidade das crianças venezuelanas é bem diferente das teresinenses, isso porque é prioridade para a prefeitura cuidar e investir na educação infantil, dado que já é comprovado: Teresina passou a ser a capital com o melhor Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do Brasil. Diferente da maioria dos municípios do país, a capital comemora a universalização do ensino para crianças a partir de 4 anos de idade desde 2016 e é desta forma que o economista Marcus Pestana fez referência á Capital como exemplo de que outra educação é possível. Distante das ruas, é nas escolas que essas crianças refugiadas devem estar. Cabe à população não dar esmolas e sim cidadania.
Onda migratória
Com o aumento da instabilidade na Venezuela, cresce, desde novembro do ano passado, o número de deslocados venezuelanos, que já somam cerca de 4 milhões - a segunda maior crise no mundo, atrás apenas da Síria (5,6 milhões de deslocados). Atualmente, o Brasil acolhe quase 168 mil venezuelanos e até o final de 2019 estima-se que este número deve passar dos 175 mil, de acordo com um relatório divulgado este mês pela Agência da ONU para os Refugiados - Acnur.