Por José Osmando
O Brasil segue dando demonstrações de que racismo e xenofobia são uma vergonhosa presença na mente de muitos brasileiros, expondo-se com bastante frequência através de manifestações explícitas de discriminação, sobretudo contra negros, pobres e nordestinos. Embora muitos insistam em dizer o contrário- certamente com a intenção de manter viva essa desgraça-, estamos cansados de presenciar que essa herança maldita da colonização brasileira está ainda, muito fortemente, presente entre nós, para nossa tristeza e vergonha.
A ideia de democracia racial, que nos remeteria a uma sociedade sem discriminação, ou sem barreiras legais e culturais para a igualdade entre grupos étnicos, não passa de falácia. Não vai além de utopia, posto que a plena igualdade e a ausência completa de qualquer tipo de preconceito não ocorrem e nunca ocorreram verdadeiramente.
CASO VINÍCOLAS
Agora mesmo nos deparamos com fato lamentável, que nos causa repulsa e indignação. Um vereador ( de nome Sandro Fantinel), da importante cidade de Caxias do Sul, berço da cultura vinícola brasileira, usou a tribuna da Câmara, numa fala gravada para exibição nas redes sociais, em que despejou um amontado de racismo e xenofobia contra trabalhadores braçais baianos que foram flagrados em regime análogo à escravidão em plantações de três das maiores empresas de produção de vinhos do Brasil.
TOCANDO TAMBOR
Ao afirmar que a cultura que os baianos têm “é viver na praia tocando tambor”, o parlamentar recomendou que os empresários não contratem mais “essa gente lá de cima”, e sugeriu que contratem argentinos, que “são limpos, trabalhadores, corretos, cumprem o horário, mantém a casa limpa”. Os baianos, portanto, são “sujos”, assim merecendo trabalho escravo.
DARCY RIBEIRO
O notável antropólogo e escritor Darcy Ribeiro, afirmou em seu livro “O Povo Brasileiro, que “a mais terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a cicatriz de torturador impressa na alma e pronta a explodir na brutalidade racista e classista. Ela é que incandesce, ainda hoje, em tanta autoridade brasileira predisposta a torturar, seviciar e machucar os pobres que lhes caem às mãos.”
PERVERSIDADE
Para Darcy, “o Brasil, último país a acabar com a escravidão, tem uma perversidade intrínseca na sua herança, que torna a nossa classe dominante enferma de desigualdade, de descaso.”
O Brasil, que abrigou, entre 1501 e 1870, 4,8 milhões de escravos negros trazidos da África, manteve a escravidão até metade do século XIX. Milhares morreram de escorbuto, varíola, sarampo, sífilis, disenteria ou mesmo trucidados pela brutalidade dos traficantes ou dos seus donos, senhores das terras brasileiros. Tudo isso resulta em que nosso país possua a maior população negra fora da África. E embora majoritária na composição da sociedade brasileira, está sub-representada em todos os âmbitos da vida social. Isso acontece, porque embora exista uma alegada igualdade jurídica assegurada pela Constituição, existem diversos mecanismos informais de discriminação que impedem acesso a oportunidades, qualificação e poder de decisão, conforme o sociólogo Florestan Fernandes.
FALTA LEGISLAÇÃO CLARA
Daí, grassa a impunidade aos crimes de ódio e ao recrudescimento da xenofobia e do racismo. De acordo com a juíza federal e pesquisadora Cláudia Dadico, falta ao Brasil uma legislação clara contra os crimes de ódio, e só a aplicação de punições exemplares, associada a políticas sociais eficientes na proteção dessa população, seria capaz de mudar essa triste realidade.
REDES SOCIAIS
Na inexistência disso, o quadro se agrava porque a internet e suas redes sociais dão cada vez mais amplitude aos discursos de ódio, como esse pregado pelo vereador de Caxias do Sul. Os idiotas, xenófobos, racistas, preconceituosos avançam nas suas práticas criminosas e quase sempre se amparam na impunidade.